
Introdução
O Sefer HaChinuch (livro da educação) é um livro clássico do judaísmo que explica os 613 preceitos da Torá, detalhando sua aplicação, fundamentos e implicações. Ele foi escrito por um autor desconhecido, embora a tradição atribua a autoria ao Rabino Aharon Halevi, na Espanha do século XIII.
A divisão do Sefer HaChinukh é organizada de acordo com as parashot (seções) da Torá, proporcionando uma leitura sequencial e integrada. Essa abordagem permite que os leitores acompanhem a evolução dos ensinamentos da Torá de forma cronológica.
O estudo do Sefer HaChinuch tem como propósito fundamental aprofundar a compreensão dos mandamentos da Torá e esclarecer sua aplicabilidade para diferentes grupos (sacerdotes, povo de Israel, estrangeiros, etc). Para ler a explicação das leis, basta clicar no botão de expansão.
Objetivo
Neste artigo, meu principal objetivo é apresentar uma versão traduzida para o português e resumir as explicações das leis contidas no Sefer HaChinuch. Para aqueles que desejam um entendimento mais profundo sobre uma lei específica, recomendo consultar a versão original ou buscar a orientação de um rabino de confiança.
Além disso, será elaborada uma versão simplificada do Sefer HaChinuch especificamente voltada para os Bnei Noach. Este material não será incluído neste artigo para não se tornar muito extenso, mas assim que estiver pronto, tornarei o link disponível aqui.
Índice
Para encontrar mais facilmente um determinado mandamento, clique em uma das porções:- Bereshit
- Lech Lecha
- Vayishlach
- Bo
- Beshalach
- Yitro
- Mishpatim
- Terumah
- Tetzavê
- Ki Tisa
- Vayakhel
- Vayikra
- Tzav
- Shmini
- Tazria
- Metzora
- Achrei Mot
- Kedoshim
- Emor
- Behar
- Bechukotai
- Nasso
- Beha'alotchá
- Sh'lach
- Korach
- Chukat
- Pinchas
- Matot
- Masei
- Devarim
- Vaetchanan
- Eikev
- Re'eh
- Shoftim
- Ki Teitzei
- Ki Tavo
- Vayeilech
Gênesis
Bereshit
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1. O mandamento da procriação:
“E Deus os abençoou e lhes disse para procriar” (Gênesis 1:28)
O mandamento da procriação ordena que o homem se multiplique, pois Deus deseja que o mundo seja habitado (Isaías 45:18). Esse preceito é essencial, pois permite a observância dos demais mandamentos, que foram dados aos humanos e não aos anjos (Berakhot 25b). Suas leis incluem a idade apropriada para cumpri-lo, o número de filhos exigido e as isenções relacionadas, conforme explicado no Talmud (Yevamot 6, Berachot) e no Shulchan Arukh. Ele se aplica em todos os tempos e lugares (Kiddushin 36b) e é uma obrigação exclusiva dos homens. Quem o ignora viola um mandamento positivo e recebe grande punição, pois demonstra desprezo pela vontade divina de povoar o mundo (Kiddushin 29b).
Lech Lecha
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2. O mandamento de circuncidar:
“Este é o Meu pacto que vocês deverão guardar, entre vocês e Eu, e com seus descendentes após vocês: circuncidarem todos os homens.” (Gênesis 17:10)
O mandamento da circuncisão ordena que todos os homens sejam circuncidados como sinal do pacto com Deus. Esse preceito é reforçado em Levítico 12:3 e repetido em vários trechos da Torá para enfatizar sua importância. A circuncisão envolve a remoção do prepúcio e o rompimento da pele abaixo dele, completando a forma física do homem.
A razão desse mandamento é estabelecer um sinal permanente no corpo do povo escolhido, separando-os fisicamente das outras nações, assim como já são espiritualmente distintos. Além disso, simboliza que, assim como o homem deve completar sua forma física, também é responsável por aprimorar sua alma por meio de boas ações.
As leis detalham quem deve garantir a circuncisão dos filhos e escravos, as circunstâncias que permitem adiá-la e as bênçãos recitadas durante o ritual, conforme explicado no Talmud (Shabat 19, Yevamot 4) e no Shulchan Arukh (Yoreh Deah 260-266). O mandamento é válido em todos os tempos e lugares, sendo uma obrigação exclusiva do pai ou do tribunal quando ele não está presente. Um homem que atinge 13 anos e não se circuncida voluntariamente comete uma grave transgressão e, se morrer incircunciso, está sujeito ao castigo de excisão (Karet). Entretanto, o pai que não circuncida seu filho não recebe essa punição, mas ainda viola um mandamento positivo (Shabat 133a).
Vayishlach
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3. Não comer o nervo ciático:
“Portanto, os Filhos de Israel não comerão o nervo ciático.” (Genesis 32:33)
Essa proibição não é apenas uma tradição baseada na história de Jacó, mas sim uma ordem divina. O significado desse mandamento é lembrar Israel de que, apesar das dificuldades impostas pelas nações, especialmente pelos descendentes de Esaú, os judeus permanecerão firmes e sua redenção virá. Assim como o anjo de Esaú lutou contra Jacó e apenas feriu sua coxa sem derrotá-lo, Israel sofrerá, mas será salvo. O sol que curou Jacó simboliza o Messias, que trará redenção.
As leis detalham qual parte é proibida, como removê-la e quais animais são afetados, conforme explicado no Talmud (Chullin 7) e no Tur (Yoreh Deah 65). Essa proibição se aplica em todos os tempos e lugares a homens e mulheres. Quem a transgride, mesmo consumindo uma pequena porção, recebe chibatadas (Chullin 96a). Com isso, concluem-se os mandamentos do livro de Gênesis.
Êxodo
Bo
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4. O mandamento de santificar o novo mês:
“Que este mês seja para vós o princípio dos meses; seja ele para vós o primeiro dos meses do ano.” (Êxodo 12:2)
Ordena que os meses e os anos intercalados sejam determinados por um tribunal de sábios ordenados em Israel, estabelecendo as festividades com base nessa santificação, conforme Êxodo 12:2. Isso significa que o novo mês deve ser definido pela renovação da lua, seja por observação direta ou por cálculos astronômicos aceitos.
Esse mandamento garante que as festividades ocorram nas épocas certas, como Pessach na primavera e Sucot na colheita (Deuteronômio 16:1, Êxodo 34:22). Como o calendário lunar é cerca de 10 dias mais curto que o solar, a intercalação mantém a sincronia entre ambos. Essa responsabilidade cabe aos maiores sábios da geração, pois exige grande conhecimento.
As leis incluem a aceitação de testemunhas sobre a lua nova, a possibilidade de transgredir o Shabat para esse testemunho e a escolha do mês de Adar para a intercalação, conforme explicado no Talmud (Rosh Hashanah, Sanhedrin, Berachot). Atualmente, como não há juízes ordenados, seguimos o cálculo estabelecido pelo Rabino Hillel, garantindo que os feriados continuem em seus tempos apropriados.
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5. O mandamento de abater o sacrifício de Pessach:
“E será observado por vós até o dia 14 deste mês; e toda a assembleia da congregação de Israel o degolará à tarde” (Êxodo 12:6)
O mandamento do sacrifício de Pessach ordena que, no dia 14 de Nissan, à tarde, um cordeiro ou cabrito macho de um ano, sem defeito, seja abatido no Templo. Esse sacrifício, chamado de Pessach, deve ser realizado por grupos de israelitas, que adquirem o animal e o sacrificam no pátio do Templo. À noite, eles o consomem juntos, após a refeição principal, pois deve ser comido estando saciado (Pesachim 70a).
A razão desse mandamento é lembrar eternamente os milagres do Êxodo do Egito. Suas leis incluem o horário do sacrifício (Pesachim 58a), sua realização em três grupos (Pesachim 64a), a permissão para realizá-lo no Shabat (Pesachim 65b), a designação dos participantes, a recitação do Hallel e o toque das trombetas, conforme descrito no Talmud (Pesachim) e no Mishneh Torah.
Esse mandamento era praticado por homens e mulheres na época do Templo. Quem o descumpria intencionalmente era punido com excisão (Karet), enquanto quem o fazia por engano não precisava oferecer um sacrifício. Esse é um dos três pecados cuja transgressão intencional leva à excisão, mas cuja negligência involuntária não exige expiação, junto com a blasfêmia e a recusa à circuncisão.
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6. O mandamento de comer a carne do sacrifício de Pessach:
“E nesta noite comerão a carne grelhada no fogo, e comerão pães não fermentados [Matsá] com ervas amargas.” (Êxodo 12:8)
O mandamento de comer a carne do sacrifício de Pessach ordena que ela seja consumida na noite do dia 15 de Nissan, conforme descrito em Êxodo 12:8. Esse preceito reforça a lembrança dos grandes milagres que Deus realizou ao libertar os israelitas da escravidão no Egito.
As leis desse mandamento incluem a quantidade mínima que cada pessoa deve comer (Pesachim 69a), a conduta adequada antes da refeição, a proibição de sair do grupo designado (Pesachim 66b), e a obrigação de permanecer acordado (Pesachim 120a), conforme explicado no Talmud e no Mishneh Torah.
Esse preceito se aplica a homens e mulheres. Quem o negligencia viola um mandamento positivo. Segundo a lei judaica, se alguém se recusar a cumpri-lo, o tribunal (Beit Din) pode obrigá-lo a fazê-lo, caso tenha autoridade para isso (Ketuvot 86a, Chullin 132b).
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7. Não comer o sacrifício de Pessach cru ou cozido em água:
“Não comais dela mal passada no fogo nem cozida na água, mas, sim, será grelhado ao fogo o cordeiro inteiro, com sua cabeça, com seus pés e com suas entranhas.” (Êxodo 12:9)
O mandamento proíbe comer o sacrifício de Pessach cru ou cozido em água, exigindo que seja assado no fogo, conforme Êxodo 12:9. Isso inclui carne parcialmente assada, ainda não própria para consumo, e qualquer preparo com líquidos, como água ou suco de frutas. A razão para essa exigência é lembrar o Êxodo e simbolizar a liberdade, pois a nobreza consome carne assada, enquanto os pobres costumam cozinhá-la para aumentar a quantidade. Além disso, assar reflete a pressa da saída do Egito, sem tempo para cozinhar lentamente.
As leis detalham situações como carne assada em panela ou misturada a líquidos (Pesachim). Esse preceito se aplicava a homens e mulheres na época do Templo. Quem o violava era punido com chicotadas. Segundo Rambam, comer cru ou cozido conta como uma única transgressão, enquanto Ramban considera duas proibições separadas, aplicando punições distintas para cada uma. Ele também explica que, sempre que a Torá especifica proibições dentro de uma regra geral, cada uma pode ser considerada um mandamento independente, como ocorre com outros casos na legislação judaica.
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8. Não deixar sobrar carne do sacrifício de Pessach:
“E não fareis sobrar nada dele até a manhã; e o que sobrar dele queimareis no fogo, pela manhã.” (Êxodo 12:10)
O mandamento proíbe deixar sobras da carne do sacrifício de Pessach até a manhã seguinte, no dia 15 de Nissan, conforme Êxodo 12:10. Essa regra reforça a lembrança dos milagres do Êxodo e reflete o comportamento da realeza, que não guarda restos de suas refeições. Caso haja sobras, elas devem ser queimadas, simbolizando que Israel, ao ser libertado, alcançou um status de grandeza e liberdade.
As leis desse mandamento estão no tratado Pesachim e no Mishneh Torah. Ele se aplicava a homens e mulheres na época do Templo. Quem o violava, deixando sobras, infringia uma proibição, mas não recebia chicotadas, pois a Torá oferece uma solução: queimar o restante, conforme Êxodo 12:10. Na lei judaica, sempre que um mandamento negativo pode ser corrigido por um positivo, não se aplica punição física.
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9. O mandamento de eliminar o chamets:
“Sete dias comereis pães não fermentados, mas no primeiro dia cessareis de ter fermento em vossas casas; pois todo aquele que comer coisa fermentada [Hamêts] – desde o primeiro até o sétimodia –, aquela alma será banida de Israel.” (Êxodo 12:15)
O mandamento de remover o chametz (pães fermentados) exige que toda a casa seja limpa desse tipo de alimento no dia 14 de Nissan, antes de Pessach, conforme Êxodo 12:15. Isso reforça a lembrança dos milagres do Êxodo, assim como o sacrifício de Pessach.
As leis desse mandamento detalham quando e como eliminar o chametz (Pesachim 21a), quais locais precisam ser verificados (Pesachim 5a), o que fazer se a data cair no Shabat (Pesachim 49a) e a recitação da anulação verbal (Pesachim 6b). Essas regras estão no Tur, Orach Chaim 431-440.
Esse mandamento se aplica a homens e mulheres em todos os tempos e lugares. Quem não remove o chametz viola um mandamento positivo e, se o mantiver em casa durante Pessach, também infringe uma proibição (Êxodo 12:19). No entanto, não recebe chicotadas, pois a violação ocorre por omissão, e a lei judaica só aplica punição física a transgressões que envolvem uma ação.
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10. O mandamento de comer matsá:
“No primeiro mês, na tarde do dia 14 comereis pães não fermentados, até o dia 21 do mês, à tarde.” (Êxodo 12:18)
O mandamento de comer matsá ordena seu consumo na noite de 15 de Nissan, feita a partir de grãos específicos (Pesachim 35a), conforme Êxodo 12:18. Essa obrigação se aplica tanto na presença quanto na ausência do sacrifício de Pessach.
As leis incluem a proteção da matsá contra fermentação (Pesachim 40a), o processo de amassar (Pesachim 42a), o tipo de água permitida e o tempo mínimo para seu consumo, conforme descrito no Tur, Orach Chaim 453-466.
Esse mandamento é válido em todos os tempos e lugares para homens e mulheres. Quem o negligencia viola um mandamento positivo, e o tribunal pode obrigá-lo a cumpri-lo.
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11. Que não se encontre chamets em nossa posse durante o
Pessach:
“Por sete dias, coisa fermentada não será encontrada em vossas casas, porque todo aquele que comer coisa fermentada, aquela alma será banida da congregação de Israel, tanto o peregrino como o natural da terra.” (Êxodo 12:19)
O mandamento proíbe possuir chametz (pão fermentado ou qualquer alimento levedado) durante os sete dias de Pessach, conforme Êxodo 12:19. Os sábios explicam (Pesachim 5b) que essa proibição se aplica a qualquer propriedade da pessoa, não apenas à sua casa, e inclui qualquer alimento fermentado (Beitzah 7b).
A razão desse mandamento é lembrar os milagres do Êxodo do Egito, quando, devido à pressa da saída, o povo assou a massa antes que fermentasse (Êxodo 12:39).
As leis incluem casos em que o chametz é deixado com outra pessoa, se um gentio deposita chametz com um judeu, se há chametz em uma mistura e se pão estragado ainda é proibido (Pesachim 45b), conforme descrito no Tur, Orach Chaim 440-442.
Esse mandamento se aplica a homens e mulheres em todos os tempos e lugares. Quem o descumpre voluntariamente viola duas proibições: “que não seja visto” e “que não seja encontrado”. Se adquiriu, armazenou ou permitiu que sua massa fermentasse, recebe chicotadas. Porém, se o chametz permaneceu de antes de Pessach sem ação intencional, não há punição, pois a lei não aplica chicotadas a transgressões por omissão (Mishneh Torah, Leis do Chametz 1:3).
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12. Não comer nada que contenha chamets:
“Nenhuma coisa fermentada comereis; em todas as vossas habitações comereis pães não fermentados.” (Êxodo 12:20)
O mandamento proíbe comer alimentos que contenham chametz, mesmo que ele não seja o ingrediente principal, como o kutach babilônico (um tipo de mingau de pão), conforme Êxodo 12:20. Os sábios (Pesachim 43a) explicam que essa proibição se aplica a qualquer produto fermentado.
Segundo Rambam, se houver um kazayit (tamanho de uma azeitona) de chametz ingerido no tempo de um peras (meio pão), a transgressão é punida com chicotadas, mas não com excisão, pois o chametz está misturado a outros ingredientes. Se a quantidade for menor, não há chicotadas formais, apenas punição rabínica (Mishneh Torah, Leis do Chametz 1:6). Já Ramban considera que a proibição faz parte da lei geral contra chametz, e se a quantidade ingerida for um kazayit no tempo de um peras, há excisão.
A Torá enfatiza essa proibição para reforçar sua importância. As leis detalham quais alimentos são proibidos e seus nomes (Pesachim; Tur, Orach Chaim 446). O mandamento se aplica a homens e mulheres em todos os tempos e lugares. Quem o desrespeita recebe chicotadas, desde que consuma a quantidade mínima estabelecida. Se ingerir menos, a transgressão ainda é proibida, mas sem punição física.
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13. Não dar do sacrifício de Pessach a um judeu apóstata:
“E o Eterno disse a Moisés e a Aarão: "Esta é a lei do sacrifício de Pêssah: Nenhum estrangeiro comerá dele.” (Êxodo 12:43)
O mandamento proíbe que o sacrifício de Pessach seja dado a um judeu apóstata, que se afastou da fé e pratica idolatria, conforme Êxodo 12:43. A tradição (Mekhilta) explica que esse "estrangeiro" se refere a um judeu cujas ações se tornaram estranhas a Deus, como traduz Onkelos.
A razão desse mandamento é semelhante à do próprio sacrifício de Pessach (Sefer HaChinukh 5): lembrar os milagres do Êxodo do Egito. Como esse sacrifício simboliza a entrada de Israel na aliança da Torá e da fé, não é apropriado que um apóstata, que rejeitou essa aliança, participe dele. O Talmud muitas vezes afirma que essa exclusão "é lógica", dispensando maiores explicações (Mishneh Torah, Leis do Sacrifício de Pessach 9).
Esse preceito se aplicava a homens e mulheres na época do Templo. Quem descumpre e alimenta um judeu apóstata com o sacrifício viola um mandamento negativo, mas não recebe chicotadas, pois não há um ato físico envolvido (Mishneh Torah 9:7).
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14. Não dar do sacrifício de Pessach a um estrangeiro ou
residente:
“Mas o residente e o assalariado estrangeiros (mesmo circuncidados) não comerão dele.” (Êxodo 12:45)
O mandamento proíbe que a carne do sacrifício de Pessach seja dada a um estrangeiro ou residente, conforme Êxodo 12:45. O "residente" é um não-judeu que rejeita a idolatria, mas ainda consome animais não abatidos ritualmente. Já o "assalariado" é um convertido que fez a circuncisão, mas ainda não mergulhou no mikveh (Yevamot 71a).
A razão desse mandamento é a mesma dos demais relacionados ao sacrifício de Pessach: lembrar o Êxodo do Egito. Como esse sacrifício representa a liberdade e a aliança com Deus, somente aqueles que concluíram sua aceitação total da fé judaica devem comê-lo. Esse princípio também explica a proibição ao incircunciso de participar (Yevamot 71a).
Esse preceito se aplicava a homens e mulheres na época do Templo. Quem desrespeita e dá a esses grupos a carne do sacrifício viola um mandamento negativo, mas não recebe chicotadas, pois a transgressão não envolve uma ação física.
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15. Não retirar a carne do sacrifício de Pessach para fora:
“Numa casa será comido; não levarão a carne para fora da casa [...].” (Êxodo 12:46)
O mandamento proíbe levar a carne do sacrifício de Pessach para fora do local onde foi reunida a assembleia, conforme Êxodo 12:46. Os sábios explicam que a "casa" refere-se ao local da refeição coletiva (Pesachim 85b).
A razão desse mandamento é lembrar os milagres do Êxodo. Como povo livre e soberano, Israel deveria comer o sacrifício no local da assembleia, sem levá-lo para fora, como fazem os reis, que comem em seus salões sem repartir a refeição com quem está do lado de fora. Já os pobres, quando têm um banquete, costumam distribuir porções, pois é algo incomum para eles.
As leis desse mandamento incluem o que ocorre se a carne for levada para fora (Pesachim 85a), os limites do local da refeição (Mishneh Torah, Leis do Sacrifício de Pessach 9:3) e a validade da refeição caso uma divisória seja rompida entre dois grupos (Pesachim 60b).
Esse mandamento se aplicava a homens e mulheres no tempo do Templo. Quem transgride e leva a carne para fora viola um mandamento negativo e recebe chicotadas, mas apenas se a carne for totalmente retirada e depositada fora, conforme a lei do transporte no Shabat (Pesachim 60b).
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16. Não quebrar um osso do sacrifício de Pessach:
“[...] nem quebrarão o osso.” (Êxodo 12:46)
O mandamento proíbe quebrar qualquer osso do sacrifício de Pessach, conforme Êxodo 12:46. A razão desse preceito é lembrar os milagres do Êxodo. Como fomos libertos e nos tornamos um povo escolhido, devemos agir com dignidade. Reis e nobres não quebram ossos para extrair medula, apenas os famintos e pobres fazem isso. Assim, esse mandamento simboliza a grandeza adquirida por Israel.
Além disso, a Torá nos dá muitas mitsvot para moldar nosso caráter. Nossas ações influenciam nosso coração e pensamentos: quem pratica o bem se inclina ao bem, e quem se envolve no mal, mesmo sendo justo, pode acabar corrompido (Makkot 23b). Por isso, a prática constante das mitsvot nos mantém espiritualmente elevados.
As leis desse mandamento incluem se a proibição se mantém após o tempo de comer o sacrifício, o status de ossos com carne presa e a regra para cartilagens (Pesachim). Esse mandamento se aplicava a homens e mulheres no tempo do Templo. Quem quebrava um osso do sacrifício puro recebia chicotadas, pois violava um preceito negativo.
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17. Que um homem incircunciso não coma do sacrifício de Pessach:
“E se algum prosélito habitar contigo e quiser fazer o Pêssah ao Eterno, todo macho deverá ser circuncidado, e então se chegará para celebrálo, e será como o natural da terra; e nenhum incircunciso comerá dele.” (Êxodo 12:48)
O mandamento proíbe que um homem incircunciso coma do sacrifício de Pessach, conforme Êxodo 12:48. Isso inclui tanto quem não se circuncidou por escolha própria, quanto quem não pode se circuncidar por risco de vida, como no caso de irmãos que faleceram devido ao procedimento. No entanto, ele pode comer matsá e maror, pois a restrição se aplica apenas ao sacrifício. O mesmo vale para residentes estrangeiros e trabalhadores assalariados.
A razão desse preceito é a mesma da proibição para estrangeiros e trabalhadores: o sacrifício simboliza a aliança entre Deus e Israel, e apenas aqueles plenamente incluídos nela devem participar.
As leis incluem se um pai que ainda não circuncidou seus filhos ou escravos pode participar do sacrifício (Pesachim).
Esse mandamento se aplicava na época do Templo. Se um incircunciso comesse ao menos um kazayit (tamanho de uma azeitona) da carne do sacrifício, recebia chicotadas, pois violava um preceito negativo.
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18. O mandamento de santificar o primogênito na Terra de Israel:
“Consagra para Mim todo primogênito – todo aquele que abrir a matriz de sua mãe – entre os filhos de Israel, no homem e no animal; porque é Meu.” (Êxodo 13:2)
O mandamento exige santificar os primogênitos de humanos e animais puros (boi, ovelha e cabra), conforme Êxodo 13:2. Entre os animais impuros, apenas o jumento se inclui nessa obrigação (Bekhorot 10a).
Os donos devem declarar o primeiro macho como sagrado e entregá-lo aos cohanim (sacerdotes), que sacrificam seu sangue e gordura no altar e comem sua carne em Jerusalém. O animal deve ser cuidado por 30 dias (pequenos) ou 50 dias (bois) antes de ser entregue (Bekhorot 10a). Fora de Israel, onde não há Templo, há divergências: alguns mandam deixá-lo morrer naturalmente, outros defendem matá-lo diretamente (Mishneh Torah, Leis dos Primogênitos 1:10). Se o animal desenvolver defeito, pode ser consumido como carne comum (Deuteronômio 15:22).
A razão do preceito é reconhecer que tudo pertence a Deus e lembrar o milagre no Egito, quando os primogênitos egípcios morreram e os de Israel foram poupados. As leis detalham onde e até quando comê-lo, defeitos que invalidam o sacrifício, participação de sócios gentios e se cesarianas ou sexo indefinido afetam a obrigação (Bekhorot; Tur, Yoreh Deah 306-320).
Esse mandamento se aplica em Israel e, rabinicamente, fora dela (Temurah 21b). O primogênito humano e o do jumento exigem resgate, mas não se aplicam a cohanim e levitas, como explicado nas leis de redenção.
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19. Não comer chamets no Pessach:
“E Moisés disse ao povo: Recordai este dia em que saístes do Egito, da casa dos escravos; porque com mão forte vos tirou o Eterno daqui, e não comereis coisa fermentada.” (Êxodo 13:3)
O mandamento proíbe comer chamets (alimentos fermentados à base de grãos) durante Pessach, conforme Êxodo 13:3. As leis desse preceito incluem quais grãos são proibidos (cinco tipos específicos), se misturas com suco de frutas causam fermentação, o status de grãos embebidos em água e o que ocorre se um alimento cozido contém chametz, quente ou frio (Pesachim 35; Tur, Orach Chaim 446-468).
Esse mandamento se aplica a homens e mulheres, em todos os lugares e épocas. Quem come intencionalmente um kazayit (tamanho de uma azeitona) de chametz em Pessach recebe excisão (karet). Se for por engano, deve trazer um sacrifício expiatório fixo.
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20. Que chamets não se encontre em nossa posse no Pessach:
“Pães não fermentados serão comidos por sete dias e não será vista por ti qualquer coisa fermentada, e não será visto por ti fermento em todo o teu território.” (Êxodo 13:7)
O mandamento proíbe que chametz (alimentos fermentados) seja visto em nossas casas durante os sete dias de Pessach, conforme Êxodo 13:7.
Os sábios explicam que chametz e fermento são considerados a mesma coisa para essa proibição (Beitzah 7b). As leis desse mandamento estão detalhadas em Pesachim e incluem regras sobre a remoção do chametz antes de Pessach (Tur, Orach Chaim 434).
Esse preceito se aplica a homens e mulheres, em todos os lugares e épocas. Quem compra chametz durante Pessach e o mantém em sua propriedade recebe chicotadas. Porém, se não removeu o chametz antes de Pessach, não recebe punição, pois a transgressão ocorre por omissão e não por uma ação.
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21. O mandamento de relatar o êxodo do Egito:
“E anunciarás a teu filho naquele dia, dizendo: Por isto o Eterno me fez sair do Egito.” (Êxodo 13:8)
O mandamento exige que recontamos a história do Êxodo na noite de 15 de Nissan (primeira noite de Pessach), louvando a Deus pelos milagres, conforme Êxodo 13:8. Mesmo sem filhos, a pessoa deve relatar os eventos em voz alta, pois a fala desperta o coração (Pesachim 116a).
Esse mandamento é central na fé judaica, pois confirma que Deus governa o mundo e pode alterar a natureza, como fez no Egito. Por isso, muitas mitsvot mencionam a saída do Egito, reforçando essa crença (Mekhilta).
As leis detalham o Seder de Pessach, incluindo a ordem da refeição, os quatro copos de vinho, a matsá e o maror, e suas bênçãos (Pesachim; Tur, Orach Chaim 469-482). O Seder segue essa estrutura:
- Kiddush e primeiro copo de vinho.
- Lavar as mãos e comer um vegetal (karpas) sem bênção final.
- Haggadah (história do Êxodo), segundo copo de vinho.
- Lavar as mãos, comer matsá, maror com charoset e matsá com maror juntos.
- Refeição festiva, depois um pedaço de matsá em lembrança do sacrifício.
- Não comer mais nada, exceto beber água ou os copos obrigatórios.
- Terceiro copo, Birkat Hamazon (bênção após a refeição).
- Quarto copo, Hallel (louvores a Deus).
As quatro taças e a matsá devem ser comidas reclinando-se, em sinal de liberdade (Pesachim 36a, 115b). Esse mandamento se aplica a homens e mulheres, em todos os tempos e lugares. Quem não cumpre essa obrigação viola um mandamento positivo.
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22. O mandamento da redenção de um jumento primogênito:
“E todo primogênito de jumento remirás por carneiro [...].” (Êxodo 13:13)
O mandamento exige redimir o primeiro macho de um jumento ao nascer, conforme Êxodo 13:13. O dono do jumento deve dar um cordeiro ao sacerdote como redenção, pois o animal é considerado santo para Deus. Caso não tenha um cordeiro, pode pagar em dinheiro equivalente ao valor do animal. Os sábios definiram que o valor pode variar entre meio sela e um sela inteiro (Bekhorot 11a). O prazo para essa redenção é até 30 dias após o nascimento.
A razão desse preceito é que os judeus se lembrem do milagre do Êxodo, quando Deus matou os primogênitos egípcios, mas poupou os de Israel. As leis desse mandamento incluem se o jumento pertence parcialmente a um gentio, se ele deu à luz um híbrido (como um burro-mula) e se o próprio jumento pode ser dado ao sacerdote (Bekhorot; Tur, Yoreh Deah 221).
Esse mandamento se aplica a homens e mulheres judeus, em todos os tempos e lugares, mas não aos sacerdotes (cohanim) ou levitas. Quem não o cumpre viola um mandamento positivo.
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23. O mandamento de quebrar a nuca de um jumento primogênito:
“[...] e se não o remires, quebrarás sua nuca; mas todo primogênito de homem em teus filhos remirás.” (Êxodo 13:13)
O mandamento exige matar o primogênito de um jumento caso ele não seja resgatado, conforme Êxodo 13:13. Se o dono optar por não redimir o animal, ele deve matá-lo com um golpe de lâmina larga (kofits) e não pode usufruir de sua carcaça, que deve ser enterrada.
Esse preceito reforça o valor da redenção, pois os sábios ensinaram que redimir o animal é preferível a matá-lo (Bekhorot 13a).
As leis desse mandamento incluem a proibição de aproveitar o jumento caso ele morra antes da redenção e a exigência de usá-lo apenas para fins permitidos (Bekhorot; Tur, Yoreh Deah 221).
Esse mandamento segue as mesmas regras da redenção do jumento e deve ser cumprido conforme a tradição.
Beshalach
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24. Que não devamos sair dos limites no Shabat:
“Vede que o Eterno vos deu o Shabat, portanto ele vos dá pão para dois dias na sexta-feira. Ficai cada um em seu lugar; que ninguém saia de seu lugar no sétimodia.” (Êxodo 16:29)
O mandamento proíbe sair dos limites estabelecidos no Shabat, conforme Êxodo 16:29. Segundo a explicação, o "lugar" se refere a uma área de até três parsa (cerca de 12 km) fora da cidade (Mishneh Torah, Leis do Shabat 27:1-2). No entanto, os sábios instituíram um limite menor, de dois mil cúbitos (aproximadamente 960 metros) além dos limites urbanos.
A razão desse mandamento é reforçar o conceito de que o mundo foi criado e não existiu eternamente, como está escrito no Êxodo 20:11: "Pois em seis dias o Senhor fez os céus e a terra... e descansou no sétimo dia." Para lembrar isso, é adequado que a pessoa permaneça dentro de um espaço definido e desfrute do descanso do Shabat sem caminhadas extensas. As leis desse mandamento incluem:
- Como se aplica a quem passa o Shabat no deserto ou em uma caverna (Eruvin 61b).
- O que fazer caso alguém ultrapasse os limites de propósito, por engano ou com permissão do tribunal (Eruvin 52b).
- Se é permitido cercar-se com barreiras no Shabat para estender os limites (Eruvin 42a).
- Como medir os limites em cidades de diferentes formatos (Eruvin 55a).
- Qual o instrumento adequado para medir as distâncias (Eruvin 53b).
Esse mandamento se aplica a homens e mulheres, em qualquer época e lugar. Quem transgredi-lo e sair mais de um cúbito além do limite máximo de três parsa recebe chicotadas. Quem ultrapassar os dois mil cúbitos estabelecidos pelos sábios recebe punição rabínica por rebeldia.
Ramban discordou de Rambam e afirmou que a proibição de ultrapassar os limites do Shabat não é uma lei da Torá, mas sim uma regra rabínica (Sefer HaMitzvot, Mandamento Negativo 321). Ele interpreta "não saia" (yetseh) como "não transporte" (yotsi), conforme uma opinião do Talmud (Eruvin 17b).
Yitro
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25. O mandamento da crença em Deus:
“Eu sou o Eterno, teu Deus, que te tirei da terra do Egito, da casa dos escravos.” (Êxodo 20:2)
O mandamento exige acreditar que há um único Deus, que criou tudo e sustenta a existência, conforme Êxodo 20:2. Isso significa reconhecer que Deus nos libertou do Egito com vontade e providência, e não por acaso, cumprindo Sua promessa aos patriarcas.
Esse princípio é a base da fé judaica, e quem o nega não tem parte no povo de Israel. A crença deve ser tão forte que a pessoa nunca deve renunciá-la, mesmo sob ameaça de morte. Expressar verbalmente essa fé fortalece a convicção do coração.
Quem atinge altos níveis de sabedoria perceberá que essa verdade é absoluta e inquestionável. Esse é o cumprimento mais elevado desse mandamento. As leis desse mandamento incluem:
- Reconhecer que todo poder, força e glória pertencem a Deus.
- Entender que Sua grandeza está além da compreensão humana.
- Negar qualquer limitação a Ele, pois Ele não tem corpo nem imperfeições.
Quem compreende tais conceitos cumpre esse mandamento com clareza (Mishneh Torah, Leis dos Fundamentos da Torá 1). Esse mandamento se aplica a homens e mulheres, em todos os tempos e lugares. Quem o nega não tem parte em Israel. Além disso, não está vinculado a um tempo específico, pois deve ser mantido todos os dias da vida.
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26. Que não acreditemos em outro deus além de Deus:
“Não terás outros deuses diante de Mim.” (Êxodo 20:3)
O mandamento proíbe acreditar em qualquer divindade além de Deus, conforme Êxodo 20:3. Isso significa não reconhecer outro ser como divino. Ramban explica que a Torá menciona “outros deuses” apenas em relação à crença, pois fabricar uma divindade não faz sentido.
Esse mandamento é um princípio fundamental, pois aceitar a idolatria equivale a negar toda a Torá (Sifrei Bamidbar 111:1). A transgressão ocorre ao adorar um ídolo da maneira usual ou por meio dos quatro atos específicos de culto: sacrificar, incensar, derramar líquidos e prostrar-se. As leis desse mandamento incluem:
- Considerar idolatria qualquer aceitação de um ser como divindade, mesmo acreditando que Deus o governa.
- Definir as formas usuais e incomuns de culto a um ídolo.
- Determinar o que ocorre se alguém cultuar um ídolo por amor ou medo.
- Proibir a leitura de textos idolátricos que possam influenciar a crença.
- Definir a proibição de veneração, como abraçar, beijar, vestir ou calçar ídolos.
- Regras sobre a anulação da idolatria e os objetos que a servem.
- Proibição de vender certos produtos aos idólatras para evitar desrespeito.
Esse mandamento se aplica a homens e mulheres, em todos os tempos e lugares. Quem o transgride e presta culto idólatra da forma prescrita ou por meio dos quatro atos de adoração é apedrejado, se houver testemunhas e advertência. Caso cometa o erro sem intenção, deve oferecer um sacrifício expiatório.
Esse mandamento também se aplica a todas as nações (Sanhedrin 56a), mas com diferenças: um israelita só pode ser condenado com testemunhas e advertência, enquanto os gentios podem ser condenados pela confissão própria. Além disso, a punição dos gentios para esse pecado é sempre a pena capital, enquanto para Israel a penalidade varia.
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27. Não fazer estátua:
“Não farás para ti imagem de escultura, figura alguma do que há em cima nos céus, abaixo na terra e nas águas debaixo da terra.” (Êxodo 20:3)
O mandamento proíbe fabricar estátuas para adoração, mesmo que o criador não as adore. A proibição inclui tanto fazer a imagem pessoalmente quanto mandar alguém fazê-la, conforme Êxodo 20:4.
Rambam considera a fabricação de ídolos proibida independentemente da intenção. Já Ramban afirma que a proibição só existe quando há intenção de adoração, e que o castigo por fazer ídolos sem adoração é apenas açoites, sem pena de morte. Ele também entende que a proibição de criar e manter ídolos vem de Levítico 19:4: "Não vos volteis para os ídolos, nem façais deuses fundidos para vós." Esse mandamento visa afastar o povo da idolatria. As leis desse mandamento incluem:
- Quais tipos de imagens são proibidos e quais são permitidos.
- A diferença entre figuras em relevo e gravadas.
- A regra sobre anéis com selo esculpido.
Esse mandamento se aplica a homens e mulheres em todos os tempos e lugares. Quem o transgride e faz ídolos para adoração recebe açoites.
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28. Não se prostrar à idolatria:
“Não te prostrarás diante deles [...]” (Êxodo 20:5)
O mandamento proíbe se curvar diante da idolatria, que é qualquer coisa adorada além de Deus, conforme Êxodo 20:5: “Não te prostrarás diante delas, nem as servirás.” Essa proibição inclui qualquer ato de reverência, mesmo sem intenção de adoração, pois Êxodo 34:14 afirma: “Pois não te curvarás a outro deus.” Além disso, há quatro formas de serviço proibidas para qualquer idolatria: curvar-se, sacrificar, oferecer incenso e derramar libações.
Esse mandamento visa afastar a idolatria. As leis desse mandamento incluem o que é considerado se curvar, como inclinar-se totalmente ou apenas tocar o rosto no chão, e evitar posturas suspeitas, como abaixar-se diante de um ídolo para pegar moedas caídas (Avodah Zarah 16a).
Esse mandamento se aplica a homens e mulheres em todos os tempos e lugares. Quem o transgride e adora ídolos por qualquer dessas formas, se voluntariamente, é punido com exílio ou apedrejamento. Se for inadvertidamente, deve trazer um sacrifício pelo pecado.
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29. Não adorar idolatria da maneira que é costume adorá-la:
“[...] nem os servirás, pois Eu sou o Eterno, teu Deus, Deus zeloso, que cobro a iniquidade dos pais nos filhos, sobre terceiras e sobre quartas gerações aos que Me aborrecem.” (Êxodo 20:5)
Este mandamento proíbe adorar qualquer idolatria da maneira como seus seguidores a veneram, mesmo que a forma de culto seja degradante. Exemplos incluem defecar para Peor, jogar pedras em Markulis ou oferecer sêmen a Kamosh, conforme Êxodo 20:5. Isso significa que qualquer forma específica de culto destinada a um ídolo é proibida.
A raiz desse mandamento é clara. Entre suas leis, há discussões sobre o que acontece se alguém o adorar com intenção de desrespeito (Sanhedrin 64a). Seus detalhes são encontrados no tratado Avodah Zarah.
Esse mandamento se aplica a homens e mulheres em todos os tempos e lugares. Quem o transgredir voluntariamente e na presença de testemunhas é condenado à morte por apedrejamento, conforme explicado no capítulo sete de Sanhedrin. Ramban, diferentemente de Rambam, inclui essa proibição dentro do mandamento “Não terás outros deuses,” reduzindo assim a contagem de mandamentos de Rambam.
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30. Não jurar em vão:
“Não jurarás em vão em nome do Eterno, teu Deus; porque o Eterno não livrará ao que jurar em vão pelo Seu Nome.” (Êxodo 20:7)
Este mandamento proíbe jurar em vão, conforme Êxodo 20:7. Existem quatro formas de juramento em vão:
- Jurar algo falso e óbvio – como dizer que uma coluna de mármore é de ouro.
- Jurar algo verdadeiro e óbvio – como dizer que uma pedra é uma pedra.
- Jurar contra um mandamento divino – pois não pode anular o que Deus já ordenou.
- Jurar algo impossível – como prometer não dormir por três dias.
Existe também o juramento falso em nome de Deus: “Não jurarás falsamente pelo Meu nome” (Levítico 19:12).
Os votos (neder) funcionam de forma diferente: eles proíbem algo permitido, tornando-o semelhante a um sacrifício. Para que um voto seja válido, ele precisa ser expresso corretamente, ligando algo permitido a algo já proibido pela Torá.
A Torá permite que uma pessoa anule um juramento ou voto caso tenha sido feito por engano. Porém, isso só pode ser feito perante um sábio que avalie se houve mudança de circunstâncias ou arrependimento genuíno.
Esse mandamento se aplica a homens e mulheres em todos os tempos e lugares. Quem o transgride e jura em vão é punido com chicotadas, mesmo sem ter realizado nenhuma ação física. Já um juramento falso exige um sacrifício de expiação caso tenha sido feito por engano.
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31. O mandamento de santificar o Shabat com palavras:
“Lembra-te do dia do Shabat [sábado] para santificá-lo.” (Êxodo 20:8)
O mandamento de santificação do Shabat com palavras exige que se declare sua santidade ao entrar e sair, conforme Êxodo 20:8. Esse reconhecimento deve ser feito sobre um copo de vinho, chamado Kiddush na entrada e Havdalá na saída do Shabat.
O objetivo desse mandamento é fortalecer a fé na criação do mundo e destacar a importância do Shabat. O vinho foi escolhido porque desperta alegria e atenção, mas se alguém prefere pão, pode recitar o Kiddush sobre ele. Já na saída do Shabat, a Havdalá deve ser feita sobre vinho, pois, após a grande refeição do dia, beber é mais apropriado do que comer.
O vinho deve ter pelo menos um revi’it (aproximadamente 86 ml) e a taça deve estar limpa. O Kiddush deve ser recitado antes da refeição, no mesmo local onde se come. Além do vinho, na Havdalá recitam-se bênçãos sobre a vela e as especiarias, que devem ser adequadas para esse propósito.
As leis desse mandamento incluem a fórmula exata do Kiddush e da Havdalá, quais bebidas podem ser usadas, o que fazer se já se começou a refeição antes do Kiddush, e os detalhes da bênção sobre o fogo e as especiarias. Tudo isso é explicado nos tratados Pesachim e Berachot.
Esse mandamento se aplica a homens e mulheres, apesar de ser dependente do tempo. As mulheres são obrigadas a recitá-lo porque os sábios vincularam o mandamento de lembrar ao de guardar o Shabat. Quem deixa de recitá-lo viola um mandamento positivo, mas se o faz apenas com palavras, sem vinho ou pão, cumpre o mandamento da Torá de forma mínima.
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32. Não trabalhar no Shabat:
“Mas o sétimo dia é o Shabat do Eterno, teu Deus, no qual tu, teu filho, tua filha, teu servo, tua serva, teu animal e teu prosélito que estiver em teus portões, não farão nenhuma obra.” (Êxodo 20:10)
O mandamento de não realizar trabalho no Shabat proíbe tanto o trabalho pessoal quanto permitir que filhos, escravos e animais trabalhem, conforme Êxodo 20:10. No entanto, há diferenças: quem trabalha deliberadamente é passível de pena de morte pelo tribunal, enquanto permitir que outros trabalhem, incluindo animais, é uma proibição sem punição corporal.
Rambam entende que essa proibição se aplica a quem conduz um animal carregado (mechamer), enquanto Ramban argumenta que apenas caminhar atrás de um animal carregado, sem envolvimento direto, não é punível com pena corporal. Ambos concordam que permitir que animais trabalhem é uma proibição, mas sem pena de morte ou açoites.
A razão do mandamento é garantir que as pessoas estejam livres para honrar o Shabat, reforçando a crença na criação do mundo em seis dias e no descanso divino no sétimo. Esse descanso semanal lembra tanto a criação quanto a libertação do Egito, onde os israelitas não tinham controle sobre seu tempo. Essa ideia aparece em Deuteronômio 5:15, onde o Shabat também é associado à libertação da escravidão.
As leis desse mandamento incluem a lista das 39 categorias de trabalho proibidas e suas ramificações, bem como restrições adicionais estabelecidas pelos sábios para proteger o mandamento. Também há regras para situações em que a preservação da vida permite a transgressão do Shabat, como indicado em Yoma 85. Um doente pode pedir que o Shabat seja violado para salvar sua vida, e essa ação é louvável.
Esse mandamento se aplica em todos os lugares e tempos a homens e mulheres. Quem transgride deliberadamente e na presença de testemunhas, após advertência formal, pode ser condenado à morte por apedrejamento. Se a infração foi involuntária, deve-se trazer uma oferta pelo pecado.
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33. O mandamento de honrar pai e mãe:
“Honrarás a teu pai e a tua mãe, para que se prolonguem os teus dias sobre a terra que o Eterno, teu Deus, te dá.” (Êxodo 20:12)
O mandamento de honrar pai e mãe é baseado em Êxodo 20:12. A explicação (Kiddushin 31b) define honra como alimentar, dar de beber, vestir, conduzir e acompanhar os pais.
A raiz desse mandamento é o reconhecimento da bondade recebida. A ingratidão é uma característica desprezível diante de Deus e das pessoas. Como os pais são a causa da existência do filho e se dedicaram a ele quando pequeno, é justo retribuir esse esforço com respeito e cuidado. Essa compreensão leva à gratidão a Deus, que concede vida, sustento e intelecto, diferenciando o ser humano dos animais irracionais. Esse reconhecimento incentiva a dedicação no serviço a Deus.
As leis desse mandamento incluem: de quem devem vir os recursos para honrar os pais (do próprio pai, se ele tiver bens; caso contrário, o filho deve até pedir esmolas para sustentá-lo – Talmud Yerushalmi Kiddushin 1:7); qual honra tem prioridade, a do pai ou da mãe; se o pai dispensa a honra, se isso é válido; como o filho deve repreender um pai que transgride a Torá; que ele não deve obedecer ao pai se for ordenado a violar a Torá; a obrigação de honrar os pais em vida e após a morte, e como se dá essa honra postumamente. Todos esses detalhes estão no Tratado Kiddushin e em outros trechos do Talmud (Tur, Yoreh Deah 240).
Esse mandamento se aplica a todos os lugares e tempos para os homens. Para as mulheres, a obrigação depende da permissão do marido (Kiddushin 31a). Quem o transgride ignora também seu Pai Celestial e recebe severo castigo. Se o tribunal tem autoridade, pode obrigar o cumprimento desse dever, como ocorre com outros mandamentos positivos.
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34. Não matar o inocente:
“Não matarás [...]” (Êxodo 20:13)
O mandamento de não matar está em Êxodo 20:13. A raiz desse mandamento é evidente: Deus criou o mundo e ordenou que fosse povoado. Assim, Ele nos proibiu de destruí-lo, impedindo-nos de tirar a vida dos que contribuem para sua civilização. No entanto, os perversos — como hereges e difamadores — não são considerados como construtores do mundo, mas sim como sua ruína. Sobre eles está escrito (Provérbios 11:10): “Com a destruição dos perversos, há júbilo.” Um sábio do Talmud comparou sua remoção à retirada de espinhos da vinha, pois isso permite que os frutos cresçam melhor (Bava Metzia 83b).
As leis desse mandamento incluem que matar tanto um saudável quanto um doente terminal é crime passível de punição (Sanhedrin 88a), as regras para julgamento de um assassino e outros detalhes explicados no Tratado Sanhedrin, capítulo 9, e no Tratado Makkot, capítulo 2 (Tur, Choshen Mishpat 425).
Esse mandamento se aplica em todo lugar e tempo a homens e mulheres. Quem mata intencionalmente, com testemunhas e aviso prévio, recebe pena de morte por espada (Sanhedrin 71b). O caso de homicídio culposo será tratado posteriormente (Sefer HaChinukh 409).
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35. Não descobrir a nudez da mulher de outro homem:
“[...] Não adulterarás [...]” (Êxodo 20:13)
O mandamento de não cometer adultério está em Êxodo 20:13. A explicação desse mandamento indica que adultério refere-se especificamente à relação com a esposa de outro homem (Rashi sobre Êxodo 20:13). Esse mandamento é repetido em Levítico 18:20: “E com a mulher do teu próximo, não te deitarás.”
A razão para essa proibição é manter a ordem que Deus estabeleceu no mundo. Ele quis que cada ser se reproduzisse dentro de sua espécie e que a descendência dos homens fosse reconhecida, sem misturas ou incertezas. O adultério prejudica essa ordem, gerando vários problemas: filhos sem paternidade reconhecida, violação da proibição de relações entre parentes próximos, roubo do vínculo matrimonial e risco de conflitos e até mortes devido ao ciúme natural que ele desperta.
As leis desse mandamento incluem evitar a situação de isolamento com pessoas casadas, a punição tanto do adúltero quanto da adúltera e outros detalhes explicados no Tratado Sanhedrin e em outras partes do Talmud (Mishneh Torah, Leis das Relações Proibidas 6). Está estabelecido (Sanhedrin 51a) que:
- Se um homem tem relação com uma mulher casada, ambos são punidos com estrangulamento.
- Se ela for uma noiva ainda virgem, ambos são apedrejados.
- Se for filha de um sacerdote, ela é queimada e ele estrangulado.
Esse mandamento se aplica a todas as pessoas do mundo, judeus ou não. A diferença é que, para os gentios, o casamento ocorre pelo simples ato da relação sexual, enquanto para os judeus, há um processo formal de santificação (kiddushin) antes do casamento (Sanhedrin 57b).
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36. Não roubar uma alma de Israel:
“[...] Não furtarás [...]” (Êxodo 20:13)
O mandamento de não roubar uma alma de Israel refere-se à proibição de sequestro, como está escrito em Êxodo 20:13. A explicação dos sábios (Sanhedrin 86a) indica que esse versículo se refere especificamente ao roubo de pessoas. A razão para essa proibição é evidente.
As leis desse mandamento incluem que a proibição se aplica a qualquer pessoa, independentemente de idade ou gênero (Mishneh Torah, Leis de Roubo 9:6). Também se aplica a um pai que sequestra seu filho ou um mestre que rouba seu aluno. Esses detalhes são discutidos no Tratado Sanhedrin, Capítulo 11.
Esse mandamento se aplica em todos os tempos e lugares. Quem o transgride e sequestra uma pessoa de Israel só é condenado à pena de estrangulamento se vender a vítima, conforme está escrito em Êxodo 21:16: “Quem roubar um homem e vendê-lo [...] certamente morrerá” (Sanhedrin 85b).
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37. Não testemunhar falsamente:
“[...] Não darás falso testemunho contra teu próximo.” (Êxodo 20:13)
O mandamento de não testemunhar falsamente proíbe dar um falso testemunho, conforme está escrito em Êxodo 20:13. Esse mandamento é reiterado em outro versículo que trata do “testemunho vão.”
A razão para essa proibição é evidente, pois a falsidade é algo desprezível e condenável para qualquer pessoa sensata. Além disso, a verdade é a base da justiça e da ordem no mundo, e o testemunho verdadeiro é essencial para a resolução de disputas. Assim, o falso testemunho pode levar ao colapso da justiça e da sociedade.
As leis desse mandamento incluem quem pode ou não testemunhar (Mishneh Torah, Leis do Testemunho 9:1); quais condições desqualificam uma pessoa como testemunha; como ocorre a aceitação do testemunho; quais pessoas, por sua grande importância, não testemunham para ninguém; o processo de exame e interrogatório das testemunhas; as diferenças entre testemunho em casos financeiros e criminais; as distinções entre investigação e confirmação de testemunhos; a diferença entre testemunho oral e escrito; e outros detalhes discutidos no Tratado Sanhedrin e em outros lugares no Talmude (Tur, Choshen Mishpat 38).
Esse mandamento se aplica em todos os tempos e lugares, mas apenas aos homens, pois as mulheres não estão incluídas na obrigação de testemunhar, já que o testemunho exige atenção e rigor na análise. Aquele que transgredir essa proibição e testemunhar falsamente contra alguém recebe a punição que ele tentou impor à vítima, conforme Deuteronômio 19:19. Além disso, pode ser punido com açoites (Makkot 2a). Esses detalhes são explicados no Tratado Sanhedrin.
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38. Não cobiçar:
“[...] Não cobiçarás a casa de teu próximo; não cobiçarás a mulher de teu próximo, nem seu servo, sua serva, seu boi, seu asno e tudo o que for de teu próximo.” (Êxodo 20:14)
O mandamento de não cobiçar proíbe planejar maneiras de tomar para si o que pertence a outra pessoa, conforme está escrito em Êxodo 20:14. Nossos Sábios explicaram (Mekhilta DeRabbi Yishmael 20:14:3) que esse mandamento só se completa quando a pessoa age para obter o que cobiçou. Mesmo que pague pelo objeto, ainda assim transgride a proibição se o adquiriu de forma coercitiva.
A razão desse mandamento é que pensamentos ruins levam a muitas transgressões. Quem fixa em seu coração o desejo de tomar algo pode acabar usando força para consegui-lo. Se for impedido, pode até recorrer à violência extrema, como ocorreu com Navot, que foi morto porque o rei Acabe cobiçou sua vinha (I Reis 21).
As leis desse mandamento e a necessidade de se afastar dessa má inclinação estão espalhadas na Guemará e no Midrash (Tur, Choshen Mishpat 359). Ele se aplica em todos os tempos e lugares a homens e mulheres. Entretanto, quem transgride e age para obter o que cobiçou não recebe açoites, pois pode devolver o que tomou. Ainda assim, transgride um mandamento divino e está sujeito ao juízo de Deus.
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39. Não fazer a forma de um homem, nem mesmo para decoração:
“Não fareis diante de Mim deuses de prata nem deuses de ouro para vós.” (Êxodo 20:20)
O mandamento proíbe criar a forma de um ser humano a partir de qualquer material, seja metal, madeira, pedra ou outro, mesmo que seja apenas para decoração. Isso se baseia no versículo de Êxodo 20:20. Os Sábios explicaram (Rosh Hashaná 24b) que a palavra “Iti” pode ser lida como “Oti” (“como Eu”), ou seja, não se deve fazer uma réplica da forma sobre a qual está escrito em Gênesis 1:26: “Façamos o homem à nossa imagem.” Essa referência à “imagem” está ligada à inteligência que Deus concedeu ao homem, pois toda a sabedoria provém d’Ele. No entanto, não há nenhuma outra semelhança entre Deus e qualquer criatura.
A proibição refere-se a qualquer forma destinada à adoração, enquanto esta proibição é específica para a forma humana, que não deve ser feita sob nenhuma circunstância, nem mesmo para fins decorativos. O objetivo é afastar qualquer possibilidade de idolatria.
As leis desse mandamento incluem, por exemplo, se há permissão para criar a forma humana sem alguns membros e outras regras discutidas no terceiro capítulo de Avodá Zará. No Talmud Sanhedrin 7b, os Sábios ampliam essa proibição para outros casos, mas o foco principal permanece na criação da forma humana. A Mekhilta também confirma essa interpretação (Shulchan Aruch, Yoreh Deah 141:7).
Esse mandamento se aplica a homens e mulheres em todos os tempos e lugares. Quem o transgride, criando a forma de um ser humano mesmo para decoração, desobedece à ordem do Rei do Universo, mas não recebe punição com açoites.
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40. Não construir com pedras lavradas:
“E quando Me fizeres um altar de pedras, não o edificarás de pedras lavradas, porque a tua espada levantarias sobre ele e assim o profanarias.” (Êxodo 20:22)
Não se deve construir um altar com pedras talhadas, ou seja, que tenham sido cortadas com ferramentas de ferro, conforme está escrito (Êxodo 20:22): “não construirás com pedras lavradas (gazit).” Se o altar for feito com essas pedras, ele é invalidado.
O motivo desse mandamento é reforçar a ideia de que o altar traz perdão, bênção e paz, e, portanto, não deve ser feito com algo associado à destruição e derramamento de sangue, como o ferro. Nossos atos influenciam nossos pensamentos, e símbolos adequados ajudam a reforçar a intenção correta.
As leis desse mandamento incluem de onde deveriam ser trazidas as pedras para o altar, sendo extraídas de solo virgem ou do Grande Mar; o que acontece se uma pedra for tocada por metal após a construção; e a prática de caiar o altar duas vezes por ano sem usar ferramentas de ferro. Esses detalhes estão explicados no Tratado Middot e no Mishneh Torá (Leis do Templo Escolhido 1).
Esse mandamento se aplica na época do Templo, tanto para homens quanto para mulheres. Quem desobedecer e construir o altar ou sua rampa com pedras tocadas por ferro recebe chicotadas.
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41. Não subir degraus no altar:
“E não subas por degraus sobre o Meu altar, para que não seja descoberta tua nudez sobre ele.” (Êxodo 20:23)
Não se deve subir ao altar por degraus, para que não se dê passos largos ao subir, conforme está escrito (Êxodo 20:23). Em vez disso, ao subir, deve-se caminhar devagar e com reverência, colocando o calcanhar diante dos dedos dos pés, como ensinado na Mekhilta DeRabbi Yishmael.
O propósito desse mandamento é reforçar o temor e a importância do altar. As pedras, por si só, não sentem nem veem nada, mas a forma de agir diante delas influencia o coração humano a desenvolver respeito pelo lugar sagrado.
As leis desse mandamento incluem a construção de uma rampa apropriada para evitar a transgressão, seu formato e detalhes, explicados no terceiro capítulo de Middot e no Mishneh Torá (Leis do Templo Escolhido 2:13).
Esse mandamento se aplica na época do Templo, tanto para homens quanto para mulheres. Quem desobedecer e der passos largos, expondo sua nudez sobre o altar, recebe chicotadas. “Os humildes habitarão na Terra.”
Mishpatim
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42. O mandamento da lei do escravo hebreu:
“Quando comprares um escravo hebreu, ele servirá por seis anos e no sétimosairá livre, de graça.” (Êxodo 21:2)
O mandamento da lei do escravo hebreu exige que se julgue o escravo hebreu conforme as regras descritas na Torá, como está escrito (Êxodo 21:2). Isso significa que devemos tratá-lo conforme as leis estabelecidas: libertá-lo no sétimo ano, ou antes, caso ocorra o Jubileu, ou se ele pagar sua liberdade, ou ainda se seu senhor falecer sem deixar um filho homem. O mesmo vale para o escravo que opta por permanecer e ter sua orelha perfurada, seguindo as regras específicas sobre ele. Tudo isso é detalhado no Talmud, em Kiddushin 14b.
A raiz desse mandamento está na vontade de Deus de tornar Seu povo santo e dotado de qualidades nobres. Entre essas qualidades, a bondade e a misericórdia são essenciais. Por isso, Ele ordenou que tratemos com compaixão aqueles que estão sob nosso domínio, como ensinado na Torá e na tradição rabínica.
As leis incluem as diferenças entre um escravo que se vende voluntariamente e aquele vendido pelo tribunal, os motivos pelos quais pode ser vendido e as condições para sua libertação, todas explicadas em Kiddushin (veja Tur, Yoreh Deah 263).
Esse mandamento se aplica apenas aos homens, pois uma mulher não pode adquirir um escravo hebreu (Bava Metzia 71a). Além disso, só se pratica quando Israel habita sua terra, pois a lei do escravo hebreu depende da vigência do ano do Jubileu (Arakhin 29a, 32b). Quem transgride e não cumpre as leis do escravo hebreu anula um mandamento positivo e demonstra crueldade. Isso quase o exclui do povo de Israel, pois os judeus são conhecidos por serem misericordiosos, filhos de misericordiosos (Shabat 97a; Yevamot 79a).
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43. O mandamento de designar a escrava hebreia:
“Se for má aos olhos de seu senhor para consagrá-la para si [...]” (Êxodo 21:8)
O mandamento da designação da serva hebreia ordena que o israelita que a adquiriu deve casar-se com ela ou dá-la como esposa a seu filho, como está escrito (Êxodo 21:8). Nossos sábios explicaram (Bekhorot 19a) que a designação para o casamento tem prioridade sobre a redenção.
A raiz desse mandamento é a misericórdia divina para com a jovem vendida e seu pai, que precisou vendê-la. Deus ordenou que seu comprador a tomasse como esposa, elevando sua posição. Se ele não a quiser, deve casá-la com seu filho, pois isso também trará felicidade a ela. Caso nenhuma dessas opções ocorra, ele deve facilitar sua libertação, sem prolongar seu tempo de servidão, mesmo que seu trabalho lhe seja proveitoso. Tudo isso reflete a bondade de Deus e Suas qualidades elevadas.
As leis desse mandamento incluem: até que idade uma filha pode ser vendida; que o mestre não pode revendê-la; que o pai pode vendê-la várias vezes; as condições para sua venda e libertação; e outros detalhes explicados em Kiddushin.
Esse mandamento só se aplica quando o Jubileu está em vigor (Gittin 65a). Quem não a designa nem para si nem para seu filho e não facilita sua redenção negligencia o mandamento, mas não é forçado a cumpri-lo, pois a Torá (Êxodo 21:11) deixa a decisão a critério do mestre. Contudo, se ele a toma como esposa ou a casa com seu filho, age corretamente e será abençoado, merecendo filhos bons e justos.
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44. O mandamento da redenção da escrava hebreia:
“[...] ou remila [...]” (Êxodo 21:8)
O mandamento da redenção da serva hebreia ordena que seu mestre facilite sua libertação, como está escrito (Êxodo 21:8). Isso significa que ele deve ajudá-la a retornar à casa de seu pai. Nossos sábios explicaram (Kiddushin 14b) que ele deve reduzir o valor restante e permitir que ela saia. Se ele a comprou por sessenta dinheiros para seis anos e ela trabalhou três anos, acumulando trinta dinheiros, ele deve aceitá-los e libertá-la, sem exigir que complete os anos de serviço ou cobre juros pelo valor investido, pois isso seria maldade.
Os israelitas, descendentes de reis e de pessoas misericordiosas, devem agir com bondade mesmo com aqueles que os servem, ainda que por um único dia. As razões já explicadas no mandamento da designação (Sefer HaChinukh 43) também se aplicam aqui, e os detalhes dessa lei estão no tratado Kiddushin.
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45. Que quem adquire uma escrava hebreia do pai não a venda:
“[...] não poderá vendê-la (nem o pai) a outro homem após tê-lo servido e não havê-la desposado.” (Êxodo 21:8)
Aquele que adquire uma serva hebreia de seu pai não pode vendê-la para outra pessoa em nenhum momento, conforme está escrito (Êxodo 21:8). O significado da frase, traduzido por Onkelos, é “para outro homem.” A Torá usou essa expressão para enfatizar a gravidade do ato, pois vender essa jovem para outro homem seria comparável a vendê-la para um povo estrangeiro.
A razão desse mandamento é que Deus deseja que sejamos misericordiosos, uma qualidade que Ele valoriza. As leis desse mandamento já foram explicadas na obrigação da designação (Sefer HaChinukh 43). Os detalhes também estão no Mishneh Torá, Leis dos Escravos 4.
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46. Não diminuir seu sustento, vestuário e tempo:
“E se para seu filho a consagrar, tratá-la-á como se tratam as filhas.” (Êxodo 21:9)
Quem adquire uma serva hebreia e a designa como esposa não pode diminuir seu alimento, vestimenta ou tempo conjugal. A explicação dessas obrigações (Ketuvot 47b) define "flesh" como comida, "cobertura" como vestimenta e "tempo" como os direitos conjugais. Esse mandamento também se aplica a todas as mulheres israelitas, pois se a Torá protege a serva, com mais razão protege uma mulher livre. Como ensina a Mekhilta (21:9:2), a lei da serva hebreia serve de base para as obrigações com todas as esposas.
As leis desse mandamento incluem regras sobre estipulações matrimoniais que tentam anular esses direitos (Ketuvot 56a), o princípio de que a mulher sobe ao nível econômico do marido, mas não desce (Ketuvot 61a), e a frequência do dever conjugal conforme a profissão do homem (Ketuvot 62b), como marinheiros (duas vezes ao ano), comerciantes (uma vez ao mês) e estudiosos da Torá (uma vez por semana, preferencialmente na noite de Shabat).
Esse mandamento se aplica a todas as mulheres livres, em qualquer lugar e época, sendo uma obrigação dos maridos. Quem reduz propositalmente um desses direitos à esposa viola esse mandamento (Sefer HaMitzvot, Negative Commandments 262), transgredindo uma ordem do Rei, mas não recebe chicotadas, pois não há um ato físico envolvido.
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47. O mandamento do tribunal executar com estrangulamento aquele que é
passível de pena capital:
“Aquele que ferir a um homem e o matar certamente será morto.” (Êxodo 21:12)
O tribunal (Beit Din) deve executar por estrangulamento aqueles condenados à morte por certos crimes da Torá, conforme dito (Êxodo 21:12). E foi explicado (Sanhedrin 52b) que sempre que a Torá não especifica o método de execução, trata-se de estrangulamento.
A razão desse mandamento é clara: “pela justiça, o rei sustenta a terra.” Sem temor do julgamento, as pessoas se matariam entre si. Por isso, Deus ordenou punir o assassino com a morte. A Torá escolheu o estrangulamento por ser uma morte rápida, já que o assassino geralmente age para matar rapidamente, e a pena segue a regra “como ele fez, assim será feito a ele.” Já nos pecados sexuais, que envolvem prazer, as punições são mais severas, como apedrejamento ou queima.
A execução (Mishnah Sanhedrin 7:3) ocorre colocando o condenado em esterco até os joelhos, amarrando um pano forte ao pescoço e puxando-o até que sua alma saia. Outros detalhes estão no sétimo capítulo de Sanhedrin 52.
Esse mandamento só se aplica em Israel, pois penas capitais só são julgadas lá. Quem pode aplicar a justiça e não o faz, anula esse mandamento e sua punição é severa, pois “sem temor do julgamento, o homem devoraria seu próximo vivo.” Ramban não conta esse mandamento separadamente, argumentando que todas as execuções derivam do versículo “e eliminarás o mal do meio de ti” (Deuteronômio 17:7).
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48. Não ferir pai e mãe:
“E aquele que ferir a seu pai ou a sua mãe, certamente será morto.” (Êxodo 21:12)
Um filho não deve ferir seu pai ou mãe, mesmo que eles o agridam, desde que não tentem matá-lo, como está escrito (Êxodo 21:15): “Quem ferir seu pai ou sua mãe, será morto.” Embora o versículo mencione apenas a punição, o aviso vem de outro mandamento (Deuteronômio 25:3), que proíbe ferir qualquer pessoa além da pena permitida. Se é proibido ferir um culpado além da punição estabelecida, quanto mais um inocente, e o pai está incluído nisso. Assim, aprendemos a advertência a partir desse versículo.
A punição com pena de morte se aplica apenas se o filho causar um ferimento que libere sangue (Sanhedrin 85b). Se ferir qualquer outra pessoa, mesmo causando sangramento, sua pena é apenas financeira. A razão desse mandamento é punir aqueles que ousam levantar a mão contra quem os trouxe ao mundo e os beneficiou tanto. “Com justiça, o rei sustenta a terra.”
As leis incluem: se ele os ferir após a morte, não é culpado; se os atingir no ouvido e os tornar surdos, é culpado, pois certamente causou sangramento interno; se ferir para fins médicos, não é culpado, mas deve evitar fazê-lo se houver outra opção; se for filho adotivo ou convertido cuja concepção não foi judaica, não é culpado; um convertido é proibido de ferir seu pai gentio pela lei rabínica; se o pai for publicamente perverso, o filho não recebe a pena de morte, mas ainda é proibido feri-lo até que se arrependa; um filho não pode aplicar punição judicial em seu pai, exceto se for um incitador à idolatria.
Esse mandamento se aplica em todos os tempos e lugares a homens, mulheres e aqueles de sexo incerto. Se alguém transgredir e ferir os pais de forma a causar sangramento, com testemunhas e advertência, é executado por estrangulamento. Se não causar ferimento, a pena segue como para qualquer outro caso de agressão: se houver indenização monetária, ele paga e não recebe chicotadas; se não houver indenização, recebe chicotadas. Como regra, uma pessoa não recebe pena de morte e indeniza ao mesmo tempo, nem é chicoteada e obrigada a pagar (Ketuvot 36b).
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49. O mandamento das leis de punições:
“E quando homens brigarem e um homem ferir a seu próximo com uma pedra ou com o punho, e este não morrer, e ficar de cama.” (Êxodo 21:18)
Fomos ordenados a julgar e penalizar quem ferir seu semelhante, conforme descrito em "Se homens brigarem" (Êxodo 21:18). Esse julgamento é chamado de leis de penalidades. O princípio geral está em "como ele fez, assim lhe será feito" (Levítico 24:19), significando que a compensação será financeira, conforme a gravidade da agressão. Mesmo se não houver ferimento físico, mas apenas humilhação, o agressor deve pagar à vítima um valor correspondente ao dano causado.
As leis de penalidades incluem casos de agressão entre pessoas, entre animais, de pessoas contra animais e vice-versa. Esses julgamentos devem ser feitos por um tribunal com autoridade na Terra de Israel. A razão desse mandamento é evidente: sem justiça, a sociedade não pode se manter. Sem regras, seria impossível viver em comunidade.
As leis dessa obrigação incluem indenizações por cinco tipos de danos e os critérios para cálculo; a avaliação da humilhação sofrida, considerando tanto o agressor quanto a vítima; regras para casos em que alguém, dormindo, causa dano involuntário; e a punição por agressões verbais. São tratados casos como agredir um convertido ou um escravo, diferenciar um estudioso da Torá de outros indivíduos e distinguir agressões leves, como um tapa, de ofensas mais graves, como cuspir em alguém. A coleta dessas penalidades depende da frequência e do impacto financeiro do dano. Se não há prejuízo financeiro ou se o caso é incomum, os tribunais não impõem pagamento, mas podem aplicar a excomunhão até que o agressor compense a vítima.
Esse mandamento de julgar e penalizar os agressores é aplicado apenas aos homens, pois a justiça foi confiada a eles, não às mulheres, que não exercem funções judiciais. No entanto, tanto homens quanto mulheres são obrigados a pagar por danos que causem e têm direito a compensação se forem vítimas. Além disso, a divisão das indenizações recebidas por uma mulher casada é detalhada em outras partes da lei judaica.
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50. O mandamento do tribunal executar com a espada aquele que é
passível de pena capital:
“E quando um homem ferir a seu escravo ou à sua escrava (cananeus) com a vara, e estes morrerem debaixo da sua mão, certamente serão vingados.” (Êxodo 21:20)
O tribunal é ordenado a executar com a espada aqueles que transgridem certos mandamentos da Torá. Esse método de execução, chamado de "morte por espada", é considerado uma das penalidades menos severas, embora o estrangulamento seja ainda mais brando (Sanhedrin 49b). Entre os condenados a essa pena está aquele que golpeia seu escravo — até mesmo um escravo cananeu — e o mata, conforme indicado em Êxodo 21:20. A explicação rabínica afirma que o agressor deve ser morto pela espada.
O propósito desse mandamento é eliminar a crueldade extrema do povo de Israel. Se alguém se deixa dominar pela raiva a ponto de espancar um escravo indefeso até a morte, merece ser morto, mesmo que o escravo seja sua propriedade e seu falecimento represente uma perda financeira. A Torá exige essa punição para que o povo seja justo e compassivo. Como diz o Salmo 19:10: “Os julgamentos do Senhor são verdadeiros e justos.”
As leis desse mandamento incluem regras sobre casos em que a vítima sobrevive por um ou dois dias antes de falecer e outros detalhes explicados no tratado de Bava Kamma. Quem tem autoridade para aplicar essa justiça e falha em fazê-lo viola um mandamento positivo e carrega uma grande culpa, pois permite que crimes semelhantes ocorram.
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51. O mandamento do tribunal julgar os danos causados por um
animal:
“Quando um boi (ou outro animal) chifrar um homem ou uma mulher e causar morte, o boi será apedrejado, e a sua carne não será comida, e o dono do boi estará livre.” (Êxodo 21:28)
O tribunal deve julgar casos em que um animal causa danos, seja ferindo uma pessoa, como indicado em Êxodo 21:28 ("Se ele chifrar"), ou danificando propriedades, como em Êxodo 21:35 ("Se ele machucar"). A palavra "machucar" se refere a empurrar, mas a responsabilidade inclui qualquer dano causado pelo corpo, patas, mordida ou chifres. O termo "chifrar" se aplica especificamente a ferimentos feitos com os chifres. O dano causado por qualquer animal, seja doméstico, selvagem ou ave, também é coberto, mas a Torá menciona o boi por ser o caso mais comum.
O fundamento desse mandamento é a necessidade de justiça e ordem social, um princípio lógico que se aplica a todas as leis judiciais. As regras incluem a diferença entre um animal considerado perigoso (muad) e um não perigoso (tam), como um animal se torna muad e como pode voltar a ser tam, quais animais são sempre considerados perigosos, a influência do local onde ocorreu o dano e as distinções entre categorias principais e secundárias de danos. Também abordam a responsabilidade do dono em vigiar o animal para evitar prejuízos.
Essas leis são julgadas apenas por um tribunal de juízes ordenados em Israel, mas o responsável ainda deve pagar segundo as leis celestiais. Se a vítima pegar o valor do dano, o tribunal não o obriga a devolver. Todos esses detalhes são explicados nos seis primeiros capítulos do tratado de Bava Kamma.
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52. Não comer carne de um boi apedrejado:
“Quando um boi (ou outro animal) chifrar um homem ou uma mulher e causar morte, o boi será apedrejado, e a sua carne não será comida, e o dono do boi estará livre.” (Êxodo 21:28)
É proibido comer a carne de um boi que foi condenado à morte por apedrejamento, mesmo que tenha sido abatido corretamente. Uma vez que a sentença foi executada, sua carne se torna proibida, conforme explicado na Mekhilta DeRabbi Yishmael (21:28:2), com base no versículo de Êxodo 21:28. Isso se aplica não apenas a bois, mas a qualquer animal doméstico, selvagem ou ave; a Torá menciona o boi por ser o caso mais comum.
O motivo desse mandamento é reforçar a ideia de que qualquer ser que tenha causado um dano fatal deve ser considerado indesejado e afastado, pois isso é algo repulsivo para Deus e para as pessoas. Mesmo que o dano tenha sido acidental, como no caso de um animal sem inteligência, a gravidade aumenta ainda mais se for intencional. Esse ensinamento nos incentiva a sermos cuidadosos para evitar que qualquer desastre aconteça por nossa causa.
As leis desse mandamento incluem que tanto um boi perigoso (muad) quanto um dócil (tam) devem ser apedrejados se matarem uma pessoa — seja homem, mulher, criança ou escravo. O julgamento do animal deve ser realizado na presença de seus donos, caso tenha um proprietário. No entanto, há situações em que um boi mata, mas não é condenado à morte (Sanhedrin 44a). Todos os detalhes estão explicados no tratado de Bava Kamma.
A proibição de comer sua carne se aplica a homens e mulheres, mas a execução da sentença só ocorre em Israel, em um tribunal de 23 juízes ordenados. Quem desobedecer e comer pelo menos um pedaço do tamanho de uma azeitona (kazayit) da carne desse animal recebe chicotadas (Makkot).
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53. O mandamento do tribunal julgar os danos de um buraco:
“E quando um homem abrir um poço, ou quando cavar um poço e não o cobrir, e um boi ou um asno cair ali.” (Êxodo 21:33)
O tribunal deve julgar os danos causados por um buraco deixado em local perigoso, conforme está escrito em Êxodo 21:33. Isso não se aplica apenas a buracos, mas também a valas e cavernas (Bava Kamma 50b). O versículo menciona "buraco" para ensinar que deve ter profundidade suficiente para causar dano — pelo menos vinte dedos de profundidade.
As razões desse mandamento já foram explicadas. Suas leis incluem, por exemplo: se um buraco causar dano a um boi, o dono do buraco é responsável, mas não se for uma pessoa ou objetos; se alguém cavar um buraco em sua propriedade e depois a abandonar sem abandonar o buraco, ele ainda é responsável. No entanto, se abandonar também o buraco, fica isento, pois o buraco foi feito em sua propriedade. Já quem cava no espaço público é sempre responsável, pois não tinha permissão para cavar ali. Se o buraco estiver na propriedade privada, mas muito próximo do espaço público, a pessoa não é responsável, pois é necessário escavar para construir fundações. Além disso, quem apenas abrir um buraco, sem cavá-lo, ainda será responsável se ele causar danos (Bava Kamma 49b). Também há diferenças na responsabilidade dependendo da resistência da cobertura do buraco e sobre a obrigação de parceiros em relação à tampa (Bava Kamma 51a). Se dois cavaram o mesmo buraco, há regras para definir qual deles é responsável (Bava Kamma 51a). Além disso, a pessoa deve tomar cuidado para evitar que sua água, espinhos ou vidros causem danos aos outros (Bava Kamma 31a). Esses detalhes são tratados nos capítulos 3 e 5 de Bava Kamma e em Bava Batra (Choshen Mishpat 410).
Esse mandamento se aplica aos homens, pois são responsáveis por administrar a justiça, mas não às mulheres, que não julgam. No entanto, elas estão incluídas nas leis de indenização, tanto quando causam danos quanto quando sofrem prejuízos.
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54. O mandamento do tribunal julgar um ladrão com reembolso ou pena de
morte:
“Quando um homem roubar um boi ou um cordeiro, e o degolar ou vender, pagará cinco bois pelo boi e quatro cordeiros pelo cordeiro.” (Êxodo 21:37)
O tribunal deve julgar os casos de roubo, conforme está escrito em Êxodo 21:37. Roubo ocorre quando alguém toma o bem de outro sem que o dono veja ou saiba, seja de sua casa ou bolso, e casos semelhantes. A necessidade desse julgamento é evidente, pois a justiça é essencial para a sociedade.
As leis incluem: pagamento do dobro, quatro ou cinco vezes o valor roubado; a pena de morte para quem invade furtivamente; a venda do ladrão para restituir o roubo; regras sobre bens roubados que se valorizaram naturalmente ou por investimentos do ladrão; casos onde um ladrão rouba de outro ladrão, e se ele deve pagar o dobro; roubo de bens consagrados, de não judeus, escravos, documentos ou terras; punição para roubo cometido no Shabat, quando a transgressão do Shabat e o roubo ocorrem juntos; quais bens do ladrão podem ser confiscados para pagamento; a regra de que um ladrão só pode ser vendido para cobrir o valor exato do roubo, e não acima disso; leis sobre guardiões que furtam ou sofrem roubos; proibição de comprar bens roubados do ladrão e os direitos do dono nesses casos.
Esses detalhes estão no sétimo capítulo de Bava Kamma, no oitavo de Sanhedrin, no terceiro de Bava Metzia e em algumas partes de Ketuvot, Kiddushin e Shevuot (Choshen Mishpat 348).
Esse mandamento se aplica aos homens, pois cabe a eles administrar a justiça. Onde houver juízes ordenados em Israel, eles podem determinar multas de quatro ou cinco vezes o valor roubado. Sem esses juízes, o tribunal apenas exige a devolução do bem ou seu valor. A venda do ladrão como pagamento só ocorre quando o ano do Jubileu está em vigor, mesmo com juízes ordenados.
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55. O mandamento do tribunal julgar sobre danos por destruição:
“Quando um homem fizer pastar num campo ou numa vinha, e soltar seu animal e este pastar no campo de outro, pagará do melhor de seu campo e do melhor de sua vinha.” (Êxodo 22:4)
O tribunal deve julgar os danos causados pelo dente e pelo pé de um animal, ou seja, quando um animal de alguém danifica a propriedade de outro ao comer ou pisotear, obrigando seu dono a pagar com o melhor de seus bens, conforme está escrito em Êxodo 22:4. Isso inclui casos em que o animal come plantações ou destrói algo ao passar. A necessidade desse julgamento é evidente, pois a justiça é essencial para a sociedade.
As leis incluem: em quais locais há responsabilidade pelos danos causados pelo dente e pelo pé e onde não há; diferenças entre um animal comer algo que normalmente come, algo incomum ou algo consumido apenas em situações específicas, como uma vaca que come cevada ou um cachorro que lambe óleo. Se o animal se beneficiou, o dono paga pelo benefício obtido. Esses detalhes estão em Gittin e Bava Kamma. Além disso, foi ensinado que a indenização total por dente e pé é aplicada quando o animal já é considerado perigoso (muad).
Esse mandamento se aplica aos homens, pois cabe a eles administrar a justiça, mas mulheres também são responsáveis por pagar ou receber indenizações. Se um tribunal não julgar corretamente esses casos, estará negligenciando um mandamento positivo.
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56. O mandamento do tribunal julgar danos causados por fogo:
“Quando houver um fogo, e esse pegar nos espinhos e queimar o que foi colhido, a plantação ou o campo, aquele que acendeu o fogo deverá pagar.” (Êxodo 22:5)
O tribunal deve julgar e obrigar ao pagamento aquele que causar danos com fogo, como incendiar a plantação ou qualquer bem de outra pessoa, conforme está escrito em Êxodo 22:5. A expressão “houver” indica que a pessoa é responsável mesmo que o fogo se espalhe sozinho. Se alguém acender uma fogueira em sua propriedade e as chamas se propagarem e causarem danos, ele será responsável por não ter vigiado o fogo. Isso ocorre porque o fogo, ainda que não seja um ser vivo, se espalha naturalmente. A importância desse julgamento é evidente, pois a justiça mantém a ordem.
As leis incluem: a distância mínima para acender um fogo perto da propriedade de outros, conforme a altura da chama; a responsabilidade quando o fogo é aceso por um surdo-mudo, uma criança, alguém incapaz ou uma pessoa sã; casos em que várias pessoas contribuem para o incêndio, como uma trazendo fogo, outra lenha e outra atiçando; se o vento aumentou o fogo; danos a objetos escondidos no campo ou em uma casa; e a responsabilidade por um camelo carregado de linho que pega fogo por causa da vela de uma loja ou da luz de Chanucá. Esses detalhes estão explicados nos capítulos 2 e 6 de Bava Kamma.
Esse mandamento se aplica aos homens, pois são responsáveis por administrar a justiça. Se um tribunal negligenciar esse julgamento e não obrigar o pagamento dos danos conforme a lei, estará violando um mandamento positivo.
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57. O mandamento do tribunal julgar o caso de um guardião não
remunerado:
“Quando um homem der ao seu companheiro dinheiro ou objetos para guardar e forem furtados da sua casa, se o ladrão for encontrado, pagará o dobro.” (Êxodo 22:6)
O tribunal deve julgar casos envolvendo um guardião não remunerado, conforme está escrito em Êxodo 22:6. A explicação (Bava Metzia 94b) indica que essa passagem se refere a um guardião que não recebe pagamento pelo serviço e, por isso, não é responsável em caso de roubo. O fundamento desse mandamento é evidente, pois a justiça mantém a ordem.
As leis incluem: o que acontece se o guardião alegar que o item foi roubado, jurar sobre isso e depois testemunhas provarem que ainda está com ele; o caso de alguém que alegou perda do objeto; a situação de um guardião que afirma que o item lhe foi confiado e depois faz uma nova alegação de roubo; o caso de um guardião que faz a alegação de roubo de um bem pertencente a um menor; e outras questões que são tratadas nos capítulos 9 de Bava Kamma, 3 de Bava Metzia e 8 de Shevuot.
Esse mandamento é válido em qualquer lugar e época. Se um tribunal não julgar esses casos conforme a lei, violará um mandamento positivo.
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58. O mandamento do tribunal julgar o caso de um reclamante e um
réu:
“Sobre toda coisa de delito – sobre boi, asno, cordeiro, roupas ou qualquer coisa perdida em que houver qualquer contestação – a causa de ambos virá aos juízes; e aquele a quem os juízes condenarem pagará o dobro a seu companheiro.” (Êxodo 22:8)
O tribunal deve julgar disputas entre reclamantes e réus, ou seja, qualquer pessoa que faça uma reclamação contra outra, seja sobre empréstimos, depósitos, furtos, extorsão ou exploração, conforme está escrito em Êxodo 22:8. A explicação dessa frase mostra que um réu só jura pela Torá se admitir parte da dívida. Se negar completamente ou afirmar que já pagou, está isento de juramento pela Torá.
A base desse mandamento é clara: a justiça mantém a ordem no mundo.
As leis incluem diversas situações, como quem admite parte de uma dívida e deve jurar; diferenças entre confissões e negações; regras sobre guardiões e reivindicações sobre empréstimos; leis de juramentos obrigatórios e suspeitas de falsidade; regras sobre posse e provas; a validade de documentos sem data ou local; regras sobre garantias, protestos e posse de propriedades; entre muitas outras questões jurídicas detalhadas no Talmud, em Bava Kamma, Bava Metzia, Bava Batra e Shevuot.
Esse mandamento é obrigatório para os homens, pois cabe a eles administrar a justiça. As mulheres, embora não julguem, estão sujeitas às leis de pagamento e disputas financeiras, com pequenas diferenças no caso de mulheres casadas. Esse julgamento deve ocorrer em todos os tempos e lugares. Um tribunal que falha em cumprir essa obrigação, quando tem o poder de fazê-lo, viola um mandamento positivo e causa desordem no mundo, pois a civilização só se sustenta com justiça, como afirmaram os sábios: “O mundo se sustenta sobre três pilares” — um deles é a justiça.
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59. O mandamento do tribunal julgar o caso de um assalariado e de um
locatário:
“Quando um homem der a seu companheiro um asno, boi, carneiro ou qualquer animal para guardar, e este morrer, ficar aleijado ou cativo, e não houver testemunhas.” (Êxodo 22:9)
O tribunal deve julgar disputas entre trabalhadores contratados e locatários. Um trabalhador contratado é alguém que recebe pagamento para guardar um item depositado, e um locatário é quem aluga um animal, objeto ou propriedade para uso. Caso surja uma disputa entre eles e o dono do item ou do aluguel, é uma obrigação julgar entre as partes, conforme está escrito em Êxodo 22:9. A base dessa lei é clara.
Seus detalhes incluem, por exemplo: um trabalhador contratado deve jurar se um dano ocorreu por força maior, mas deve pagar em caso de furto ou perda, pois recebeu para guardar o item; as leis sobre aluguel de trabalhadores, animais e imóveis; a responsabilidade de um artesão que danifica algo; regras sobre aluguel repassado a terceiros; e disputas sobre responsabilidade em casos de negligência e força maior. Todas essas leis estão explicadas no Talmud, em Bava Metzia e Bava Kamma.
Esse mandamento se aplica a homens, em todos os tempos e lugares, pois cabe a eles julgar. Quem falha em cumprir essa obrigação, quando apto, viola um mandamento positivo. Embora a justiça entre reclamantes e réus já esteja incluída em outra lei, a Torá reforça a necessidade específica de julgar guardiões e locatários, pois essas situações são frequentes nas comunidades.
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60. O mandamento de julgar o caso do mutuário:
“E quando um homem pedir emprestado (um animal) de seu companheiro, e este (animal) ficar aleijado ou morrer, se seu dono não estiver com ele, pagará.” (Êxodo 22:13)
O tribunal deve julgar disputas envolvendo empréstimos de objetos ou animais, quando um homem toma algo emprestado de seu próximo sem pagar por isso, apenas como um favor. Se surgir uma disputa, a lei deve ser aplicada conforme está escrito em Êxodo 22:13.
A Torá torna o tomador responsável mesmo por danos causados por força maior, pois ele se beneficiou do empréstimo sem pagar. No entanto, se o dono do objeto ou animal estava presente no momento do empréstimo, o tomador fica isento de responsabilidade, pois a presença do proprietário implica que ele mesmo cuidaria de seu bem. Mesmo que o dono vá embora depois, a isenção permanece, pois a Torá estabelece uma regra geral: a presença no momento do empréstimo define a responsabilidade.
As leis incluem: o tomador é isento se o objeto se desgastar ou quebrar durante o uso normal, mas é responsável se o utilizar de maneira inadequada; se o objeto for levado a um local público, o tomador deve provar que o dano ocorreu pelo uso correto; a indenização é calculada como em casos de danos; o tomador deve arcar com a alimentação do animal desde o momento da posse; regras sobre empréstimos herdados, empréstimos indefinidos e objetos emprestados entre professores e alunos; e restrições quanto a emprestar o que foi tomado emprestado.
Essa lei se aplica aos homens, pois cabe a eles administrar a justiça. Se um tribunal não julgar esses casos, quando apto a fazê-lo, viola um mandamento positivo.
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61. O mandamento do tribunal julgar o caso de um sedutor:
“E quando enganar um homem a uma virgem que não for desposada, e deitar-se com ela – a dotará e a tomará como sua mulher.” (Êxodo 22:15)
O tribunal deve julgar o caso de um sedutor, ou seja, um homem que convence uma virgem a se entregar a ele, seja com falsas promessas ou palavras verdadeiras, conforme a lei estabelecida em Êxodo 22:15.
O fundamento desse mandamento é conhecido. A penalidade de cinquenta moedas de prata corresponde apenas ao prazer do ato, mas o sedutor também pode ser obrigado a pagar compensações adicionais pelo dano e constrangimento, conforme a importância da mulher. Todas as leis de Deus são justas.
As regras incluem: casos ocorridos na cidade são presumidos como sedução, salvo prova de estupro; já no campo, presume-se estupro. O casamento entre o sedutor e a vítima depende da vontade do pai, da filha e do sedutor, e se houver casamento, não há multa. Outras leis incluem: o caso de um sumo sacerdote que seduz ou estupra; o período válido para a penalidade, que vai dos três anos até a maioridade da jovem; que a multa é paga ao pai, e se ele não estiver vivo, não há penalidade para a filha; e as dez mulheres que não têm direito à multa.
Essa lei se aplica onde há juízes ordenados, pois apenas eles podem julgar casos de penalidade. Quem não aplica essa lei viola um mandamento positivo.
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62. Não deixar uma feiticeira viva:
“Feiticeira (ou feiticeiro) não deixarás viver.” (Êxodo 22:17)
Não permitir que uma feiticeira viva: Devemos executar quem pratica feitiçaria, conforme está escrito em Êxodo 22:17. Isso se aplica a qualquer praticante de magia, mas a Torá menciona as mulheres por serem mais envolvidas com essa prática (Sanhedrin 67a).
A magia é algo prejudicial e causa grandes problemas. Deus quer que o mundo funcione de forma natural, como estabelecido na criação, sem interferências artificiais. A magia busca alterar essa ordem, contrariando a vontade divina. Ela mistura forças e espécies de maneira proibida, perturbando o equilíbrio determinado pela criação. Algumas misturas permitidas são aceitas porque trazem benefícios concretos, mas as proibidas causam danos. A magia também pode envolver demônios, chamados de "anjos da destruição", pois seu propósito é sempre prejudicar.
As leis sobre a pena para feiticeiros são explicadas mais detalhadamente no mandamento específico contra a feitiçaria. O julgamento desses casos cabe aos homens, pois lhes foi dada a responsabilidade de administrar a justiça, e deve ocorrer apenas em tribunais de 23 juízes ordenados na Terra de Israel. Se um tribunal tem poder para aplicar a justiça e não o faz, viola esse mandamento. No entanto, não há punição com açoites, pois não há um ato físico envolvido, assim como em outros casos onde apenas palavras são a transgressão (Makkot 16a).
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63. Não oprimir o convertido com palavras:
“E ao peregrino não fraudareis nem oprimireis, porque fostes peregrino na terra do Egito.” (Êxodo 22:20)
Não oprimir o convertido com palavras: Fomos proibidos de oprimir um convertido, mesmo apenas com palavras. Isso se aplica a alguém de outra nação que se converteu ao judaísmo. É proibido humilhá-lo, como está escrito em Êxodo 22:20. Embora essa proibição se aplique a todos os judeus, a Torá a reforça especificamente para o convertido, repetindo a advertência (Levítico 19:33), pois ele é mais vulnerável e não tem familiares para defendê-lo. Além disso, há o risco de ele voltar à sua antiga fé caso seja maltratado. Os sábios (Sifra, Kedoshim 8:2) ensinaram que não se deve dizer a um convertido: “Ontem você era idólatra e agora busca refúgio sob a Presença Divina.”
O objetivo desse mandamento é refinar o caráter humano, impedindo-nos de explorar aqueles que são mais frágeis dentro da sociedade. Agindo com respeito e bondade, desenvolvemos um caráter elevado e nos tornamos dignos das bênçãos de Deus, que deseja o bem para Suas criaturas.
As leis desse mandamento incluem a proibição reforçada em 21 (ou 24, conforme outra versão) passagens da Torá (Bava Metzia 39b) e a comparação do amor ao convertido com o amor a Deus, pois está escrito sobre Deus (Deuteronômio 6:5): “E amarás o Senhor teu Deus”, e sobre o convertido (Deuteronômio 10:19): “E amarás o convertido.” Há muitos ensinamentos sobre isso na Torá Oral e no Talmud (Tur, Choshen Mishpat 307).
Esse mandamento se aplica a homens e mulheres em todos os tempos e lugares. Quem transgride e humilha um convertido viola uma proibição da Torá, mas não recebe açoites, pois a transgressão não envolve um ato físico.
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64. Não oprimir o convertido em questões financeiras:
“E ao peregrino não fraudareis nem oprimireis, porque fostes peregrino na terra do Egito.” (Êxodo 22:20)
Não oprimir o convertido em questões financeiras: Fomos proibidos de explorar financeiramente um convertido, ou seja, se tivermos negócios com ele, não devemos prejudicá-lo, como está escrito em Êxodo 22:20. A Mekhilta DeRabbi Yishmael (22:2) explica que essa proibição refere-se a dinheiro. Esse mandamento é uma advertência adicional à proibição geral de exploração financeira, que se aplica a todos os judeus. No caso do convertido, a Torá reforça a proibição tanto em palavras quanto em dinheiro, pelos motivos já explicados.
Todas as suas regras estão ligadas ao mandamento anterior sobre não oprimir o convertido (Sefer HaChinukh 63). Mais detalhes sobre fraude financeira serão abordados na proibição geral de opressão monetária contra qualquer judeu (Sefer HaChinukh 337), com a ajuda de Deus. (Tur, Choshen Mishpat 307.)
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65. Não abusar do órfão e da viúva:
“A nenhuma viúva ou órfão afligireis.” (Êxodo 22:21)
Fomos proibidos de sobrecarregar órfãos e viúvas, seja por ações ou palavras, como está escrito em Êxodo 22:21. Todo trato com eles deve ser feito com calma, bondade e compaixão. O motivo desse mandamento é que eles não têm um protetor natural, como o marido da viúva ou o pai dos órfãos. Assim, a Torá nos instrui a desenvolver traços de bondade e justiça, tratando-os com mais consideração do que faríamos se tivessem um defensor. Devemos ser cuidadosos em tudo o que se refere a eles, protegendo seus interesses.
Leis do mandamento: Mesmo a viúva do rei e seus órfãos estão incluídos nessa proibição. Devemos tratá-los com palavras gentis, não explorá-los nem envergonhá-los, e zelar por seus bens mais do que pelos nossos próprios. Um credor que queira cobrar deles, mesmo com um documento válido, só pode fazê-lo sob juramento, diferentemente de outros devedores. Se estiverem envolvidos em disputas, o tribunal deve interceder em favor deles, alegando qualquer argumento que seu pai poderia ter usado. Caso tenham bens, o tribunal deve garantir que um homem confiável administre esses recursos para benefício deles, evitando riscos.
Eles também têm vantagens em transações comerciais, semelhantes às propriedades consagradas. Por exemplo, se venderem frutas e o comprador já tiver pegado parte delas, mas sem pagar totalmente, e o valor das frutas aumentar, eles podem desfazer a venda. Se o preço cair, o comprador não pode anular o negócio, pois não pode ter mais direitos do que eles. Se comprarem e retirarem as frutas antes de pagar, e o valor subir, o vendedor não pode anular a venda; se o preço cair, os órfãos podem desistir da compra, mas, para seu bem-estar, os rabinos impediram essa prática, garantindo que ainda conseguissem crédito no futuro.
Caso o tutor dos órfãos negocie por eles, nem ele nem eles recebem qualquer penalidade por se retratar. Além disso, embora seja proibido oprimi-los, é permitido pressioná-los moderadamente para seu benefício, como um professor exigindo empenho no estudo. No entanto, até mesmo para o bem deles, deve-se ser mais brando do que com outras pessoas.
A Torá assegura que Deus ouvirá suas súplicas, como está escrito (Êxodo 22:22): “Se eles clamarem a Mim, Eu os ouvirei.” Eles são considerados órfãos para esse mandamento até que sejam capazes de gerir seus próprios negócios como adultos.
Aplicação: Esse mandamento é válido em todos os lugares e tempos, para homens e mulheres. Quem transgredi-lo, causando sofrimento, explorando, subjugando ou prejudicando financeiramente órfãos e viúvas, viola uma proibição. Embora não haja punição de chicotadas, pois o opressor pode alegar que agiu legalmente ou para o bem deles, Deus, que conhece os corações, fará justiça. A própria Torá declara a punição: “Eu os matarei à espada” (Êxodo 22:23), ou seja, medida por medida — o opressor perderá seu cônjuge e seus filhos ficarão desamparados. Se for uma mulher, seu marido poderá se casar com outra que maltratará seus filhos. Os sábios interpretaram que viúvas e órfãos clamam a Deus diretamente, e Ele responde por ser misericordioso.
Ramban conta essa proibição como duas separadas, uma para órfãos e outra para viúvas, devido à ênfase dada pela Torá.
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66. O mandamento de emprestar ao pobre:
“Dinheiro emprestarás a Meu povo, ao pobre que está contigo, e não serás duro com ele como credor e não porás juros sobre ele.” (Êxodo 22:24)
Devemos emprestar ao pobre conforme nossas possibilidades, suprindo suas necessidades para aliviar sua aflição. O empréstimo é ainda mais importante do que a caridade, pois quem já pede esmola sofre vergonha pública, enquanto aquele que ainda não chegou a esse ponto pode evitar essa humilhação se receber um empréstimo e conseguir se recuperar financeiramente. Se Deus o ajudar a prosperar, ele pagará suas dívidas e poderá se sustentar. Por isso, a Torá nos ordena a ajudar o necessitado com um empréstimo antes que ele precise pedir esmola, como está escrito em Êxodo 22:24).
Motivo do mandamento: Deus deseja que nos acostumemos à bondade e misericórdia, qualidades nobres que tornam as pessoas dignas de bênçãos. O bem e a prosperidade recaem sobre aqueles que cultivam o bem, e Deus, ao fazer o bem, cumpre Sua vontade de beneficiar o mundo. Além disso, se quisesse, Ele poderia suprir diretamente as necessidades dos pobres, mas nos fez Seus mensageiros para nos dar mérito. Outro motivo é que a pobreza pode ser um castigo divino, e Deus quis que os necessitados fossem sustentados por outras pessoas para que sentissem sua aflição de duas formas: pela vergonha de depender de outros e pela escassez de recursos. Um sábio respondeu a um herege que perguntou: "Se Deus ama os pobres, por que não os sustenta diretamente?" — a resposta está no Talmud (Bava Batra 10a).
Leis do mandamento: Incluem quais pobres têm prioridade ao receber empréstimos e os avisos severos contra quem se recusa a ajudar. Os sábios ensinaram (Bava Batra 10a) que aquele que pode emprestar, mas não o faz, é rejeitado, desprezível e comparável a um idólatra. Por outro lado, quem ajuda os necessitados é belo, amado, abençoado e recompensado com inúmeras bênçãos. Os detalhes desse mandamento estão espalhados em Ketuvot, Bava Batra e outros trechos do Talmud. (Tur, Choshen Mishpat 97).
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67. Que não exijamos a dívida de um pobre que não tem com o que
pagar:
“Dinheiro emprestarás a Meu povo, ao pobre que está contigo, e não serás duro com ele como credor e não porás juros sobre ele.” (Êxodo 22:24)
Somos proibidos de cobrar uma dívida quando sabemos que o devedor não pode pagá-la, como está escrito em Êxodo 22:24. Essa proibição também inclui não emprestar com juros a outro judeu.
A raiz desse mandamento é cultivar a bondade e a compaixão em nós. Quando essas qualidades estiverem enraizadas, seremos dignos de receber o bem, e Deus cumprirá Sua vontade por meio de nós, pois Ele deseja trazer o bem ao mundo, tanto neste quanto no próximo.
As leis desse mandamento incluem o que disseram os sábios (Bava Metzia 45b): “De onde sabemos que é proibido passar na frente da casa de quem nos deve cem moedas e não pode pagar? Pois está escrito: ‘Não seja para ele como um credor’.” Também foi dito na Mekhilta DeRabbi Yishmael 22:24:4 que isso significa não aparecer diante dele o tempo todo. Há mais ensinamentos sobre esse assunto no tratado de Bava Metzia e em várias partes do Talmud. (Veja Tur, Choshen Mishpat 97.)
Esse mandamento se aplica a homens e mulheres em todos os lugares e tempos. Quem o transgride e cobra a dívida sabendo que o devedor não tem meios para pagar, apenas para fazê-lo sofrer, viola este mandamento negativo e é como se tivesse desobedecido ao próprio Rei.
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68. Que não intercedamos entre o devedor e o credor com juros:
“Dinheiro emprestarás a Meu povo, ao pobre que está contigo, e não serás duro com ele como credor e não porás juros sobre ele.” (Êxodo 22:24)
Que não participemos de um empréstimo com juros entre o credor e o devedor: Somos proibidos de nos envolver em um empréstimo com juros — ou seja, não podemos ser fiadores, testemunhas ou escrever um contrato que mencione juros — como está escrito em Êxodo 22:24. O Talmud (Bava Metzia 75b) explica que esse mandamento se aplica a todos os envolvidos na transação, incluindo fiador, testemunhas e escriba. Além disso, o credor também transgride este mandamento, além de outros específicos para ele. Abbaye disse que o credor viola seis mandamentos, o devedor, dois, e os envolvidos, um.
A raiz desse mandamento é que Deus deseja o bem-estar de Seu povo e ordenou remover obstáculos que possam levar alguém a perder sua riqueza sem perceber, até que sua casa fique vazia. Assim funciona o sistema de juros, como é bem conhecido, por isso é chamado de "mordida" (neshekh). Quando fiadores, escribas e testemunhas evitam esse tipo de transação, outras pessoas também evitarão.
As leis detalhadas estão em Bava Metzia (Tur, Yoreh Deah 160). Esse mandamento se aplica a homens e mulheres em todos os lugares e tempos. Quem o transgride, tornando-se escriba, fiador ou testemunha de um empréstimo com juros, viola este mandamento negativo. No entanto, não se aplicam açoites, pois, assim como o credor pode restituir o dinheiro sem juros, os outros envolvidos não devem ser punidos mais severamente.
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69. Não amaldiçoar o juiz:
“Não maldigas aos juízes, nem maldigas ao chefe de teu povo.” (Êxodo 22:27)
Somos proibidos de amaldiçoar os juízes, como está escrito em Êxodo 22:27. “Não maldigas aos juízes (elohim).” O termo "elohim" aqui refere-se aos juízes, como em (Êxodo 22:8): “e os elohim o condenarão.” Esse versículo também inclui a proibição de blasfemar contra Deus. A Mekhilta e o Sifrei explicam que a advertência contra blasfêmia vem deste versículo. Já a punição para blasfêmia está em (Levítico 24:16): “Aquele que blasfemar o Nome do Senhor certamente morrerá.”
A razão deste mandamento é proteger os juízes de ameaças e maldições, para que possam julgar com verdade. Além disso, sem essa proibição, o povo poderia odiar os juízes e acabar se rebelando contra eles, o que causaria o colapso da justiça, pois “a terra se sustenta pelo juízo.”
As leis desse mandamento incluem que a punição se aplica apenas se a maldição contiver um dos Nomes sagrados de Deus ou um de Seus títulos, como Misericordioso ou Zeloso. Se a maldição não contiver esses elementos, não há punição legal, mas ainda assim é proibida. Além disso, essa proibição vale em qualquer idioma, e para haver punição, deve haver testemunhas e advertência prévia, como em outros mandamentos negativos. Os detalhes estão no tratado de Sanhedrin. (Mishneh Torah, As Sanções e Penalidades do Tribunal 6.)
Esse mandamento se aplica em todos os tempos e lugares, tanto para homens quanto para mulheres. Quem transgredi-lo e amaldiçoar um juiz com um Nome ou título de Deus recebe duas punições: uma porque o juiz é um membro de Israel, e outra por ser juiz.
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70. A proibição negativa de "abençoar" o Nome:
“Não maldigas aos juízes, nem maldigas ao chefe de teu povo.” (Êxodo 22:27)
O mandamento negativo de "abençoar" o Nome (blasfêmia): A raiz desse mandamento é que a blasfêmia esvazia o ser humano de qualquer bem, tornando-o semelhante a um animal, pois a fala é o que diferencia o homem dos animais. Ao usá-la para o mal, ele se rebaixa completamente. Por isso, a Torá nos adverte, pois Deus deseja o nosso bem, e qualquer palavra que negue esse bem se opõe à Sua vontade.
Algumas leis desse mandamento incluem: a culpa só existe se ele pronunciar o Nome específico de Deus (Y-H-V-H) ou, segundo alguns, (A-D-N-Y) (Mishneh Torah, Leis da Idolatria 2:7); os juízes perguntavam aos testemunhas por meio de um apelido e só no final o verdadeiro Nome era dito, ao que se rasgavam as vestes sem conserto (Sanhedrin 56a); se alguém blasfema e logo se arrepende, ainda assim é apedrejado (Nedarim 87a); se amaldiçoa Deus com o nome de uma idolatria, deve ser atacado por zelotes, mas se não for, não recebe pena de morte, pois até em sua fúria sabe que suas palavras são tolas, mas é punido por sua perversidade e afronta (Sanhedrin 60a); quem ouve um israelita blasfemar deve rasgar suas vestes, mas não se for um gentio, a menos que seja um apóstata, como no caso de Ravshakeh (Sanhedrin 60a); os juízes e testemunhas impõem as mãos sobre a cabeça do blasfemador, declarando que ele é responsável pelo próprio destino, algo exclusivo para esse caso (Levítico 24:14).
Esse mandamento se aplica em todos os tempos e lugares. Quem transgredi-lo e blasfemar, da forma descrita, é apedrejado na Terra de Israel por juízes ordenados. Fora da Terra, onde não há juízes ordenados, ele é afastado e colocado em excomunhão. (Tur, Choshen Mishpat 27)
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71. Não amaldiçoar um chefe (nassi):
“Não maldigas aos juízes, nem maldigas ao chefe de teu povo.” (Êxodo 22:27)
É proibido amaldiçoar um nassi, como está escrito em Êxodo 22:27. O termo nassi refere-se ao rei (Mishneh Torah, Sanhedrin 26:1), mas também inclui o chefe do Grande Sanhedrin, pois o versículo se refere a qualquer autoridade máxima sobre Israel, seja no governo ou na liderança da Torá.
A razão para esse mandamento é que a sociedade precisa de um líder para manter a ordem e a organização. Como as pessoas têm opiniões diferentes, sem uma autoridade comum, haveria caos e inação. Mesmo que um líder nem sempre acerte, seu comando é melhor do que a desordem total. Como sua posição traz benefícios, seja na liderança religiosa ou na proteção social, é apropriado respeitá-lo e não amaldiçoá-lo, mesmo em particular. O hábito de falar mal pode levar a desrespeito público, gerando divisão e discórdia. Leis desse mandamento:
- A culpa só ocorre se a maldição incluir um nome ou título de Deus (Shevuot 35b).
- Quem amaldiçoa recebe três séries de chicotadas: por amaldiçoar um juiz ("Elohim não amaldiçoarás"), por amaldiçoar um líder ("E um chefe entre o seu povo, não amaldiçoarás") e por amaldiçoar qualquer judeu ("Não amaldiçoarás um surdo", Levítico 19:14).
- Se o filho do nassi amaldiçoá-lo, recebe quatro punições: as três mencionadas mais uma por amaldiçoar seu pai.
Esse mandamento se aplica a homens e mulheres em qualquer lugar onde haja um rei ou um chefe do Sanhedrin. Quem transgredir e amaldiçoar um líder com um nome ou título divino é punido com três séries de chicotadas. (Choshen Mishpat 27)
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72. Não negligenciar as leis dos produtos agrícolas:
“Tua obrigação das primícias e tua contribuição (ao sacerdote) darás no seu tempo certo; e o primogênito de teus filhos darás a Mim.” (Êxodo 22:28)
Não devemos alterar a ordem das leis de separação das porções da produção agrícola, pois a Torá nos ordena a extraí-las na sequência correta. Após a debulha e limpeza do trigo, ele ainda é tevel, ou seja, um produto que não teve suas porções sagradas separadas. O primeiro passo é retirar a terumá (dízimo sacerdotal), que deve ser entregue aos sacerdotes. Pela Torá, um único grão seria suficiente para cumprir essa obrigação, mas os sábios estipularam cerca de 2% da colheita. Em seguida, do que sobra, deve-se separar o maaser rishon (primeiro dízimo), que corresponde a 10% e deve ser entregue aos levitas. Depois disso, do restante, separa-se mais 10%, o maaser sheni (segundo dízimo), que deve ser consumido pelo próprio dono em Jerusalém.
A Torá proíbe inverter essa ordem, como está escrito em Êxodo 22:28. O que significa que não se deve adiantar o que deve ser feito depois nem atrasar o que deve ser feito primeiro. A razão para esse mandamento é evitar erros e confusões nos cálculos dos dízimos, fundamentais para a prática religiosa. Como essas separações são um pilar da fé, Deus ordenou que fossem rigorosamente seguidas para impedir equívocos. Se alguém inverte a ordem, o que foi feito continua válido e não precisa ser refeito, conforme estabelecido na Mishná Terumot. Além disso, os primeiros frutos (bikurim) devem ser retirados antes de qualquer outra porção, reforçando a necessidade de respeitar a sequência determinada.
Esse mandamento se aplica a homens e mulheres na Terra de Israel, enquanto o povo judeu estiver habitando nela. De acordo com Maimônides, essa obrigação só tem validade pela Torá quando a terra está sob posse dos judeus. Quem desrespeita essa ordem viola um mandamento divino, mas não recebe punição com chicotadas, pois a Mishná esclarece que essa transgressão não é passível desse tipo de penalidade.
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73. Não comer um animal dilacerado:
“Homens de santidade sereis para Mim, e carne dilacerada no campo (ou em qualquer lugar), não comereis; ao cão a jogareis.” (Êxodo 22:30)
Não devemos comer a carne de um animal que foi mortalmente ferido por outro, como diz a Torá em Êxodo 22:30. Isso se refere a um animal atacado por um predador e que está condenado a morrer em breve, dentro de um ano segundo os sábios. O texto menciona “no campo” por ser o local onde isso geralmente acontece, mas a proibição se aplica a qualquer situação em que um animal seja mortalmente ferido. Esse mandamento também inclui carne retirada de um animal ainda vivo. Além disso, ensina que qualquer carne que saiu de seu limite apropriado, como carnes consagradas que saíram do Templo ou carne de um sacrifício pascal que saiu de seu grupo designado, torna-se proibida como se fosse de um animal despedaçado.
A razão desse mandamento é proteger a saúde do corpo, que é o instrumento da alma. A Torá nos afasta de qualquer coisa que possa prejudicá-lo, garantindo que nossa inteligência e espiritualidade não sejam comprometidas. Mesmo que a ciência médica atual não compreenda os danos de certos alimentos proibidos, Deus, como o verdadeiro Médico, sabe melhor do que nós. É sabido que a carne de um animal mortalmente ferido é prejudicial, pois sua condição já indica um estado de doença. Mesmo que o animal seja abatido imediatamente após ser ferido, já existe um processo de deterioração iniciado no momento da lesão.
Os sábios identificaram oito categorias principais de animais feridos mortalmente, que incluem perfuração, laceração e fraturas graves. Essas categorias têm diversas subdivisões, totalizando 72 tipos de defeitos que tornam um animal não kosher. Apenas uma dessas condições requer verificação específica: aderências nos pulmões, pois indicam possíveis perfurações. Se encontradas em locais críticos, considera-se que o animal não sobreviveria, tornando-se proibido para consumo.
A inspeção dos pulmões segue regras precisas, considerando a localização e o tipo das aderências. Algumas podem ser descartadas com base em critérios tradicionais, enquanto outras exigem um exame mais rigoroso. Existe divergência entre os rabinos sobre certos casos, e a prática segue diferentes tradições rabínicas.
Esse mandamento se aplica a homens e mulheres, em todos os lugares e tempos. Quem o transgredir e comer um pedaço de carne de animal ferido ou qualquer carne que tenha saído de seu limite apropriado está sujeito a punição com açoites. Embora essa proibição cubra múltiplas situações, os grandes sábios, como Maimônides e Nachmânides, explicam que ela não se enquadra na categoria de mandamentos que evitam punição por serem genéricos.
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74. Não ouvir a alegação de um litigante sem a presença do seu
oponente:
“Não dês ouvido à maledicência [...].” (Êxodo 23:1)
O juiz não deve ouvir a alegação de um litigante sem a presença de seu adversário, conforme está escrito em Êxodo 23:1. A razão é que as pessoas podem exagerar ou distorcer suas palavras quando seu oponente não está presente. Esse mandamento proíbe o juiz de aceitar tais declarações para que não seja influenciado por informações unilaterais. A Mekhilta DeRabbi Yishmael explica que essa proibição se estende ao próprio litigante, impedindo-o de apresentar sua alegação sem a presença do adversário, mesmo que o juiz queira ouvir. Essa regra está relacionada ao mandamento (Êxodo 23:7): “Afasta-te da falsidade.” Os sábios também incluíram nesse mandamento a proibição de falar e aceitar discursos maldosos, além de dar falso testemunho (Makkot 23a).
A falsidade é desprezível e prejudicial, pois Deus é verdadeiro e suas bênçãos recaem sobre aqueles que seguem a verdade, a misericórdia e a bondade. Aqueles que adotam o caminho contrário, tornando-se mestres da falsidade, afastam-se da bênção e atraem maldição, conflitos e sofrimento. Por isso, a Torá nos instrui a nos distanciarmos da falsidade, sendo essa a única proibição onde a linguagem da Escritura enfatiza a necessidade de afastamento completo. Isso inclui até mesmo evitar situações que possam parecer enganosas, como ensinado pelos sábios: “Afasta-te do que é feio e do que se assemelha a isso” (Chullin 44b).
Os juízes devem evitar julgamentos manipulados e não podem justificar-se dizendo que a culpa recai apenas sobre as testemunhas falsas. A busca pela verdade no julgamento foi altamente elogiada pelos sábios. Esse mandamento se aplica em todos os tempos e lugares, obrigando os homens, que são responsáveis por julgar, a seguirem essa conduta. As mulheres, apesar de não exercerem o papel de juízas, também estão proibidas de apresentar alegações sem a presença do adversário e devem se afastar de qualquer falsidade, assim como os homens. Quem transgride esse mandamento desrespeita a vontade divina, mas não recebe punição com açoites, pois não há um ato físico envolvido.
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75. Não permitir que um pecador testemunhe:
“[...] Não acompanhes o mau para servir de falso testemunho.” (Êxodo 23:1)
Não devemos aceitar o testemunho de um pecador nem agir com base em seu depoimento, conforme está escrito em Êxodo 23:1. A explicação deste verso (Sanhedrin 27a) nos ensina que não se deve considerar como testemunha uma pessoa mal-intencionada ou violenta, excluindo assim trapaceiros e ladrões, como indicado em (Deuteronômio 19:16): “Se uma testemunha violenta se levantar contra um homem.”
O motivo desse mandamento é claro: alguém que não se preocupa consigo mesmo nem com suas más ações não se preocupará com a verdade e não deve ser acreditado.
As leis desse mandamento incluem a desqualificação de dez categorias de pessoas para testemunho, conforme os sábios explicaram (Mishneh Torá, Leis de Testemunho 9:1): mulheres, escravos, menores, surdos-mudos, pessoas mentalmente incapacitadas, cegos, malfeitores, pessoas extremamente desonrosas, parentes e aqueles que têm interesse direto no caso. Além disso, hermafroditas são considerados como mulheres para esse fim, meio-escravos são como escravos e epilépticos podem ser considerados incapazes, dependendo de sua condição. Também são desqualificados aqueles com pensamento instável e impulsivo.
A Torá considera malfeitores desqualificados para testemunhar automaticamente, enquanto a desqualificação rabínica exige um pronunciamento formal. Entre os desqualificados rabinicamente estão jogadores de dados que não exercem outra profissão, apostadores que fazem corridas de pombos e pastores que criam gado de maneira prejudicial aos outros (Sanhedrin 24b). Para recuperar a idoneidade, o arrependimento deve ser demonstrado por ações, como sugerido por Rav Idi (Sanhedrin 25a), que menciona devolver um objeto perdido ou abrir mão de um animal "trefá" de valor considerável.
Esse mandamento se aplica em todos os tempos e lugares, mas apenas aos homens, pois apenas eles exercem julgamentos e aceitam testemunhos. Quem o descumpre, aceitando o depoimento de um malfeitor e tomando decisões com base nisso, infringe um mandamento negativo. No entanto, não há punição com açoites, pois não há um ato físico envolvido. Além disso, em questões financeiras, mesmo que uma ação tenha sido tomada, não há punição com açoites, pois o erro pode ser corrigido.
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76. Não se inclinar para a maioria em penas capitais devido a um só
voto:
“Não siga a maioria para condenar alguém, e não te desvies da decisão do grande, mas inclinate à maioria quando é justa a condenação.” (Êxodo 23:2)
Um juiz não deve seguir a maioria em julgamentos de pena de morte quando a diferença for de apenas um voto. Se houver divergência entre os juízes sobre a culpa de um acusado, e os que o condenam forem apenas um a mais do que os que o absolvem, não se deve seguir essa maioria, como está escrito em Êxodo 23:2. Isso significa que não se deve condenar à morte com uma maioria mínima de apenas um voto. No entanto, se a maioria for de dois votos, a decisão pode ser seguida, mesmo para condenação. A Mekhilta (23:2) esclarece: "Inclinamos para o bem com um voto, mas para o mal somente com dois."
A razão desse mandamento é que devemos imitar as qualidades de Deus, que é misericordioso e age além da justiça estrita. Por isso, na aplicação da pena de morte, a inocência deve pesar mais do que a condenação, pois a perda de uma vida não tem reparação. As regras desse julgamento estão no quarto capítulo de Sanhedrin. Quem transgredir esse mandamento e condenar alguém à morte com uma maioria de apenas um voto viola a ordem do Rei e carrega uma culpa grave por causar a perda de uma vida de forma injusta.
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77. Que aquele que defendeu a inocência no início dos casos capitais
não defenda a culpa:
“Não siga a maioria para condenar alguém, e não te desvies da decisão do grande, mas inclinate à maioria quando é justa a condenação.” (Êxodo 23:2)
Um juiz não deve seguir a opinião da maioria ou de um juiz mais experiente apenas por confiar neles, sem que o assunto esteja claro para ele. Se a questão depender de uma interpretação da Torá, ele deve compreendê-la por si mesmo e não confiar apenas na decisão dos outros. Isso é baseado no versículo de Êxodo 23:2. Em outras palavras,isso significa que o juiz não deve decidir apenas por se inclinar à opinião de outro, sem realmente entender a questão. A Mekhilta explica que o juiz deve expressar sua própria opinião e não dizer apenas “Sigo a opinião do Rabino X.”
Esse mandamento também inclui que um juiz que defendeu a inocência de um réu não pode depois mudar sua opinião para culpá-lo. Da mesma forma, nos julgamentos de pena de morte, o processo deve começar considerando a inocência antes da culpa. A Torá ordena que, nesses casos, os juízes mais jovens se pronunciem primeiro, para que não sejam influenciados pelos mais experientes. Isso é aprendido da frase “não responda sobre uma disputa para inclinar”, que pode ser interpretada como “não responda antes do grande juiz”.
A razão para esse mandamento é garantir que as decisões não sejam influenciadas por submissão ou pressão, mas sim pela análise sincera e independente de cada juiz. Além disso, nos casos de pena de morte, a Torá exige maior cautela, pois não há possibilidade de reparação em caso de erro. No entanto, em casos financeiros, onde é possível corrigir um erro, as regras são menos rigorosas.
As leis relacionadas incluem que, se todos os juízes concordarem em condenar o réu à morte, ele deve ser absolvido, pois se presume que não houve suficiente argumentação em favor da inocência. Se houver empate, novos juízes são adicionados até se chegar a uma maioria clara. Além disso, um juiz pode mudar de opinião para absolver um réu, mas não para condená-lo. Um estudante pode falar em defesa do acusado, mas não para condená-lo. Se o próprio réu apresentar uma defesa plausível, deve ser ouvido. Esses detalhes estão no sétimo capítulo de Sanhedrin.
Esse mandamento se aplica apenas aos homens, pois as mulheres não servem como juízas, conforme indicado em várias fontes. O caso de Débora (Juízes 4:4) não contradiz isso, pois ela atuava mais como conselheira ou porque foi aceita como autoridade pelos líderes de Israel. Esse julgamento só se aplica na Terra de Israel, onde os tribunais têm jurisdição sobre casos de pena de morte. Quem transgride essa regra — seja confiando na opinião dos outros sem reflexão própria, iniciando um julgamento com argumentos de culpa ou mudando sua decisão de inocente para culpado — viola um mandamento negativo, embora não receba punição com chicotadas, pois não há um ato físico envolvido.
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78. O mandamento de se inclinar à maioria:
“Não siga a maioria para condenar alguém, e não te desvies da decisão do grande, mas inclinate à maioria quando é justa a condenação.” (Êxodo 23:2)
O mandamento de seguir a maioria se aplica quando há divergência entre os sábios em relação a qualquer lei da Torá, seja uma questão geral ou um caso específico entre indivíduos. Se os juízes discordam sobre um julgamento, deve-se seguir a decisão da maioria, conforme está escrito em Êxodo 23:2. Os sábios ensinaram que seguir a maioria é um princípio da Torá (Chulin 11a). Isso se aplica quando os grupos que discordam têm conhecimento semelhante da Torá, pois uma pequena minoria de sábios não pode prevalecer contra um grande grupo de ignorantes. No entanto, quando há equilíbrio de sabedoria, a maioria tem maior probabilidade de estar correta. No caso do Sanedrin, sempre se segue a maioria, independentemente de qual grupo é mais sábio, pois seu número é definido pela Torá, e todos seus membros são grandes estudiosos.
A razão para esse mandamento é fortalecer a unidade da Torá. Se cada pessoa seguisse apenas sua própria interpretação do que considera verdadeiro, haveria múltiplas versões da Torá, levando ao caos. Por isso, Deus ordenou que se aceite a decisão dos sábios, garantindo uma única Torá para todos. Mesmo que os sábios ocasionalmente errem, a responsabilidade é deles, não do povo. Isso é ensinado no Talmude (Horayot 2a): se um tribunal erra em um julgamento e alguém segue sua decisão, o tribunal é responsável, não o indivíduo, exceto em casos específicos.
As leis desse mandamento incluem diferenças entre casos monetários e de pena de morte. Em casos capitais, a maioria deve ser mais expressiva, pois não se pode condenar alguém à morte com apenas dois votos contra um. Além disso, os juízes nesses casos devem ser ordenados e comprovadamente sábios, para evitar erros irreparáveis. Outro ponto é que, em julgamentos de pena de morte, quem defendeu a inocência não pode depois argumentar pela culpa, enquanto em casos monetários essa mudança é permitida. Além disso, o julgamento deve começar considerando a inocência, e qualquer pessoa presente pode argumentar a favor do réu, seja um juiz ou um aluno.
Esse mandamento se aplica em todos os lugares e tempos, tanto para homens quanto para mulheres. Quem transgride e não segue a maioria viola um mandamento positivo e comete um erro grave, pois essa regra é a base sobre a qual toda a Torá se sustenta.
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79. Não ter compaixão de um pobre em seu julgamento:
“E ao pobre não favorecerás (por ser pobre) em sua disputa.” (Êxodo 23:3)
O mandamento de não ter piedade do pobre no julgamento exige que o juiz julgue com verdade, sem favorecer o necessitado por compaixão. O juiz deve tratar igualmente ricos e pobres, obrigando cada um a cumprir sua responsabilidade, conforme está escrito em Êxodo 23:3. Esse princípio se repete em Levítico 19:15: “Não levantarás o rosto do pobre.” No Sifra (Kedoshim 4:2), os sábios explicam: “Não diga: ‘Ele é pobre, e como somos obrigados a sustentá-lo, vou absolvê-lo no julgamento para que possa se manter com dignidade.’ Por isso, a Torá ordena: ‘Não levantarás o rosto do pobre.’”
A razão desse mandamento é evidente, pois a lógica exige justiça equilibrada. A equidade no julgamento é essencial para manter a ordem e a honestidade.
Essa lei se aplica em todos os lugares e tempos para os homens, pois são responsáveis por julgar. Quem descumpre e favorece o pobre no julgamento viola um mandamento divino. No entanto, não há punição com chicotadas, pois não há uma ação física envolvida.
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80. O mandamento de remover um fardo:
“Quando vires o asno daquele que tu odeias, prostrado debaixo de sua carga, não te recusarás a ajudá-lo; auxiliáloás (a descarregar o peso).” (Êxodo 23:5)
O mandamento de remover um fardo exige ajudar a descarregar um animal sobrecarregado no caminho, conforme está escrito em Êxodo 23:5. O inimigo mencionado refere-se a outro judeu. Embora seja proibido odiar um irmão judeu (Levítico 19:17), os sábios explicam (Pesachim 113b) que, se alguém viu outro pecar em particular, o advertiu e este não se corrigiu, então é permitido odiá-lo. A menção de “jumento” na Torá não é literal, mas um exemplo comum de animal de carga. O versículo ordena que se ajude a descarregar, como no uso da palavra em Neemias 3:8, onde significa fortalecer.
A razão desse mandamento é desenvolver a compaixão, uma qualidade louvável. A obrigação não se limita a aliviar o sofrimento físico, mas também a ajudar alguém aflito por perdas materiais.
Entre as leis dessa obrigação estão: se o animal pertence a um gentio e a carga a um judeu, ou vice-versa; e a preferência por ajudar um inimigo em vez de um amigo para controlar o instinto negativo, mesmo quando se trata de descarregar o amigo e carregar o inimigo (Bava Metzia 32b). Esse inimigo, no entanto, não é aquele odiado por pecado, mas alguém com quem há inimizade. A obrigação se aplica quando a pessoa está a até sete partes e meia de um mil (aproximadamente 266 metros), mas não além dessa distância, embora quem agir além do dever seja abençoado. Um idoso não é obrigado a ajudar se for inadequado à sua dignidade, mas isso depende do que faria pelos seus próprios bens (Bava Metzia 30b). Também se estipula que descarregar deve ser gratuito, enquanto carregar pode ser pago, e que deve-se acompanhar o dono do animal por até uma parsá (cerca de 4 km), podendo receber por esse tempo (Bava Metzia 33a). Tudo isso está no segundo capítulo de Bava Metzia (Tur, Choshen Mishpat 84).
Esse mandamento se aplica em todos os tempos e lugares, tanto para homens quanto para mulheres. Quem o ignora transgride um preceito positivo e demonstra crueldade, uma característica reprovável. Quem não tem misericórdia não recebe misericórdia dos Céus, pois seu próprio corpo não é adequado para isso (Shabat 151b).
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81. Não distorcer o julgamento de um malfeitor:
“Não perverterás o julgamento de teu indigente em sua causa.” (Êxodo 23:6)
Não se deve inclinar o julgamento contra um réu apenas porque ele é um pecador, como está escrito em Êxodo 23:6. Aqui, “indigente” refere-se a alguém carente de méritos, e não de dinheiro. O juiz não deve pensar: “Como ele é um pecador, darei um veredicto contra ele”, pois o julgamento dos ímpios cabe a Deus, e não ao homem. Assim é explicado na Mekhilta: “Se um pecador e um justo estiverem diante de você em julgamento, você pode pensar, etc.”
A imparcialidade no julgamento é um princípio lógico e fundamental. Esse mandamento se aplica em todos os tempos e lugares apenas aos homens, pois as mulheres não exercem a função de juízes. Quem o transgride e inclina a decisão contra um pecador viola um mandamento divino.
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82. Não concluir um julgamento com base em estimativas:
“Não perverterás o julgamento de teu indigente em sua causa.” (Êxodo 23:7)
Não se deve condenar uma pessoa à morte com base apenas em indícios ou suposições, mas sim por testemunho direto e claro de testemunhas que viram o ato com seus próprios olhos. Como está escrito em Êxodo 23:7. A Mekhilta explica que, se as testemunhas viram um homem perseguir outro com uma faca e depois encontraram a vítima agonizando e o agressor com a faca ensanguentada, mas não viram o golpe em si, ele não pode ser condenado à morte. Isso evita que pessoas sejam executadas injustamente por inferências erradas. Além disso, duas testemunhas que relatem pecados diferentes, como um dizendo que o acusado profanou o Shabat e outro que ele adorou ídolos, não podem combinar seus testemunhos. Como também ensinado na Mekhilta: “Se um testemunha que ele adorou o sol e outro que adorou a lua, eles não se combinam.”
A razão para essa lei é óbvia: evitar condenações errôneas. Seus detalhes incluem que as testemunhas devem ter visto o ato juntas e devem ter se visto durante o ocorrido; se cada uma viu de um lugar diferente sem se enxergarem, seus testemunhos não se combinam, a menos que aquele que deu o aviso tenha visto ambos. Esses detalhes estão no tratado de Sanhedrin.
Essa lei se aplica na Terra de Israel e é responsabilidade dos homens, pois são os encarregados da justiça. Quem julga com base em testemunho impreciso viola esse mandamento e sua punição é severa, pois pode causar mortes injustas. Ramban explica que esse versículo contém dois mandamentos distintos: um, de que o tribunal deve sempre reabrir o caso se surgir um argumento em favor do réu, e outro, de que não se deve reabrir um caso para condenar alguém que já foi absolvido. Isso reflete o desejo divino de dar ao réu todas as chances de arrependimento e de contribuir para a civilização do mundo.
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83. Não aceitar suborno:
“E não tomes suborno, pois o suborno cega os olhos de pessoas sábias e torce as palavras dos justos.” (Êxodo 23:8)
O juiz não deve aceitar suborno de nenhuma forma, mesmo que seja para julgar corretamente, como está escrito em Êxodo 23:8. Esse mandamento é repetido em outro lugar da Torá (Deuteronômio 16:19). No Sifrei Devarim, é dito: “‘Não tomarás suborno’ — nem mesmo para absolver o inocente e condenar o culpado corretamente.”
A razão desse mandamento é evitar que a prática do suborno se espalhe, levando eventualmente a julgamentos injustos. Isso é algo lógico e evidente.
Entre as leis dessa proibição, os Sábios ensinaram que tanto quem dá quanto quem recebe suborno transgride um mandamento — o que dá, por “não colocar uma pedra de tropeço diante do cego” (Levítico 19:14), e o que recebe, por estar incluído na maldição mencionada em Deuteronômio 27:25. O juiz que recebeu suborno deve devolvê-lo. Também é proibido que o juiz eleve seu status intencionalmente para receber mais pagamentos por parte dos escribas. Além disso, é proibido aceitar suborno mesmo de forma indireta, como favores ou palavras de elogio, devendo ignorá-los completamente. Em princípio, o juiz não pode obter qualquer benefício dos litigantes, exceto se ele for um artesão e precisar compensar o tempo perdido de seu trabalho. Nesse caso, pode cobrar um valor proporcional e igual de ambas as partes.
Essa lei se aplica em todos os tempos e lugares para os homens, pois são responsáveis por julgar. Quem a transgride e aceita suborno viola um mandamento divino, mas não recebe chicotadas, pois deve restituir o valor recebido.
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84. O mandamento da liberação das terras:
“Mas no sétimo deixarás de cultiválas, de adubá-las e limpá-las, e os necessitados de teu povo comerão; e do resto, o animal do campo comerá; assim farás com tua vinha, teu olival.” (Êxodo 23:11)
O mandamento da liberação da terra no sétimo ano (Shemitá) exige que todos os produtos da terra sejam considerados sem dono e disponíveis para qualquer pessoa. Como está escrito em Êxodo 23:11. O termo “vinha e olival” ensina que essa obrigação se aplica a todos os frutos da terra, e não apenas a esses específicos.
A razão desse mandamento é reforçar a crença na criação do mundo por Deus, assim como no Shabat semanal. O Shemitá lembra que a terra não produz sozinha, mas sim porque Deus permite. Isso também incentiva a generosidade, já que a pessoa aprende a desapegar-se de seus bens e confiar na providência divina.
As leis incluem a proibição de plantar, podar, colher e armazenar de maneira comercial, além de outras restrições rabínicas, como fertilizar ou remover folhas secas. Certos trabalhos leves, como aplainar o solo, são permitidos. A colheita deve ser feita apenas para consumo imediato, sem armazenar para comércio. Além disso, os produtos do sétimo ano só podem ser usados para alimentação, não para fins comerciais ou medicinais.
Essa lei se aplica a homens e mulheres somente na Terra de Israel e quando o povo judeu vive nela. Atualmente, a Shemitá tem status rabínico. Regiões conquistadas pelos judeus que voltaram da Babilônia mantêm a santidade da terra, enquanto as conquistadas apenas na época de Moisés têm restrições mais brandas. Locais como Amom, Moav e Egito não estão incluídos nessa obrigação. Quem viola esse mandamento, fechando seus campos ou armazenando os produtos em casa, transgride uma mitsvá positiva, mas pode colher pequenas quantidades para consumo pessoal, desde que outros também tenham acesso igual aos frutos.
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85. O mandamento de descansar no Shabat:
“Seis dias farás tuas obras, e no sétimo dia folgarás, para que folgue teu boi e teu asno, e repouse o filho de tua serva e o peregrino.” (Êxodo 23:12)
O mandamento de descansar no Shabat exige a interrupção do trabalho no sétimo dia, conforme está escrito em Êxodo 23:12. Todos os detalhes desse mandamento já foram explicados no mandamento negativo correspondente (Sefer HaChinukh 32). A obrigação do Shabat é mencionada na Torá até doze vezes, destacando sua importância.
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86. Não jurar por idolatria:
“E guardareis tudo o que vos disse, e o nome de outros deuses não mencionareis – que não seja ouvido de tua boca!” (Êxodo 23:13)
O mandamento proíbe jurar em nome da idolatria ou fazer com que um gentio jure por ela, conforme está escrito em Êxodo 23:13. Isso inclui tanto jurar quanto fazer alguém jurar. Alguns explicam que a proibição principal se aplica a quem faz negócios com um gentio em seu dia festivo, levando-o a agradecer à sua divindade, o que transgride “não mencionareis”, pois resulta em adoração. Os Sábios acrescentaram um distanciamento extra e disseram que se deve evitar até mesmo dizer: “Espere por mim ao lado da idolatria x” (Sanhedrin 63b).
A raiz do mandamento é afastar qualquer vestígio de idolatria, seja por ação ou por palavras, para que nem mesmo sua lembrança permaneça. Os Sábios destacaram que a Torá adverte contra a idolatria 44 vezes, devido à sua extrema vileza.
Entre as leis do mandamento, consta que é proibido mencionar o nome da idolatria, mesmo sem ser em juramento. No entanto, os nomes de ídolos mencionados na Torá, como Peor (Números 23:28) e Bel e Nebo (Isaías 46:1), podem ser mencionados. Também é proibido induzir outros a jurar por idolatria, mas apenas quem jura diretamente recebe punição com chicotadas. O Rambam afirma que a proibição se aplica mesmo sem ação física, devido à gravidade da idolatria.
Este mandamento se aplica em todos os lugares e tempos, tanto para homens quanto para mulheres. Quem o transgride, jurando pelo nome de algo venerado por hereges, é passível de punição, pois a idolatria é tratada com grande severidade.
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87. Não incitar os Filhos de Israel à idolatria:
“E guardareis tudo o que vos disse, e o nome de outros deuses não mencionareis – que não seja ouvido de tua boca!” (Êxodo 23:13)
O mandamento proíbe induzir os filhos de Israel à idolatria, incentivando-os a adorá-la. Mesmo sem praticar atos idólatras, apenas o ato de chamar outros já o torna um sedutor. Como afirmado em Sanhedrin 63b, “‘Não se ouvirá em tua boca’ — isso é um aviso ao sedutor.” O mesmo está na Mekhilta.
A raiz do mandamento é óbvia. Suas leis estão no décimo capítulo de Sanhedrin. Quem seduz apenas uma pessoa não é chamado de "instigador" (mediach), mas de "sedutor" (mesit). Já quem convence duas ou mais pessoas é um instigador.
Se encontra na Torá grande ênfase na proibição da idolatria, com sua repetição em 44 passagens e a descrição de Deus como "zeloso" contra os idólatras. No entanto, isso não significa que Deus, bendito seja, sofra qualquer perda ou ganho se alguém O adora ou presta culto a anjos, astros ou criaturas.
Deus é imutável e perfeito. O problema recai sobre os próprios transgressores, que ao rejeitarem Deus e se dedicarem à vaidade, se afastam de toda bênção e se tornam vulneráveis a maldições e sofrimentos. É como se Deus, o Mestre do bem, se tornasse seu inimigo e bloqueasse o bem para eles.
A Torá usa expressões humanas como "ciúme" para facilitar o entendimento, pois a inveja entre pessoas é fonte de grande ódio, e a traição no casamento gera ciúmes intensos. Assim, esses termos são usados figurativamente para expressar o afastamento de Deus daqueles que O abandonam para servir outros.
Este mandamento se aplica em todos os lugares e tempos, tanto a homens quanto a mulheres. No entanto, a pena de apedrejamento para quem o transgride só se aplica na Terra de Israel, onde há tribunais apropriados para julgá-lo.
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88. O mandamento de celebrar nas festas:
“Três vezes ao ano celebrarás festas para Mim.” (Êxodo 23:14)
O mandamento de celebrar nas festividades: Fomos ordenados a celebrar nas festividades subindo ao Templo três vezes ao ano — antes de Pessach, Shavuot e Sucot — e oferecendo sacrifícios de paz (shelamim) em honra do festival, conforme está escrito em Êxodo 23:14. Esse mandamento é repetido duas vezes na Torá. Os sábios ensinaram (Chaguigá 6b) que há três mandamentos relacionados às festividades: celebração, comparecimento e alegria.
A razão para esse mandamento é que não é apropriado comparecer diante de Deus de mãos vazias. Embora Ele não precise de nada de nós (Salmos 50:12), nossa percepção é de que estamos perante Ele, e naquele lugar nossas almas se aproximam do bem mais do que em qualquer outro. Assim, os sacrifícios nos preparam para receber o bem e elevam nossas almas.
As leis desse mandamento incluem que os sacrifícios não têm medida fixa — qualquer oferta, seja um animal ou uma ave, é suficiente. A pessoa deve subir a Jerusalém com um sacrifício ou dinheiro para comprá-lo, mas não pode apenas levar dinheiro. Se não oferecer o sacrifício no primeiro dia, pode fazê-lo nos sete dias seguintes, desde que tenha estado presente no primeiro dia (Chaguigá 9a). Os detalhes estão explicados no Tratado Chaguigá (ver Mishnê Torá, Leis das Festas 1).
Esse mandamento se aplica apenas na época do Templo e apenas aos homens, excluindo mulheres, pessoas com deficiências físicas que as impeçam de caminhar até Jerusalém, idosos e escravos. Contudo, mesmo aqueles com profissões consideradas desagradáveis, como curtidores e ferreiros, devem purificar-se e comparecer diante de Deus, pois o que importa é a pureza da alma, não a profissão. Quem transgredir e comparecer ao Templo sem um sacrifício viola um mandamento positivo e também um negativo, conforme o versículo (Êxodo 23:15): “E não aparecerão diante de Mim de mãos vazias.”
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89. Que não abatamos o cordeiro do sacrifício de Pessach no dia 14 de
Nissan enquanto ainda possuímos chamets:
“Não sacrifiques o sangue de Meu sacrifício tendo pão fermentado, e o sebo do Meu sacrifício não deverá ficar até a manhã.” (Êxodo 23:18)
Que não devemos sacrificar o cordeiro do sacrifício de Pessach no dia 14 de Nissan enquanto ainda possuímos chamets: Não devemos sacrificar o cordeiro do sacrifício de Pessach no dia 14 de Nissan enquanto ainda tivermos chamets em nossa posse — até o meio do dia, como explicaram os sábios (Pesachim 5a), “‘Mas’ divide” — conforme está escrito em Êxodo 23:18. Isso significa que não devemos sacrificar o cordeiro de Pessach enquanto o chamets ainda estiver em nossa posse. Essa proibição é repetida na Torá com uma expressão diferente. Além disso, aprendemos que o chamets não deve estar nem com quem sacrifica, nem com quem asperge o sangue, nem com quem queima a gordura, nem com qualquer um do grupo que irá comer o sacrifício (Pesachim 63b).
A razão para esse mandamento é que definir o tempo certo para cada ação garante sua correta execução. Pessach é fundamental para preservar nossa fé, como já mencionado (Sefer HaChinukh 21). Por isso, Deus ordenou que seus rituais fossem feitos com ordem e em tempos específicos, sem misturar os mandamentos de diferentes momentos. Assim, primeiro eliminamos o chamets — que consideramos impuro — antes de iniciar o sacrifício de Pessach, que marca um período sagrado.
Entre as leis desse mandamento, os sábios ensinaram (Pesachim 61a) que o sacrifício de Pessach só pode ser feito após o meio-dia. Se for realizado antes, será inválido. Mesmo depois do meio-dia, idealmente deve ser feito apenas após o sacrifício diário da tarde, a queima do incenso e a preparação das luzes do candelabro. Os detalhes estão no tratado de Pesachim (ver Mishnê Torá, Leis do Sacrifício Pascal 1).
Esse mandamento se aplica no tempo do Templo, tanto para homens quanto para mulheres. Quem transgredir e tiver conscientemente um pedaço de chamets do tamanho de uma azeitona em sua posse no momento do sacrifício — seja sacrificando, aspergindo o sangue, queimando partes do sacrifício ou mesmo apenas fazendo parte do grupo que irá comê-lo — recebe chicotadas. No entanto, o sacrifício ainda será válido.
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90. Não deixar as entranhas do sacrifício de Pessach
pernoitarem:
“Não sacrifiques o sangue de Meu sacrifício tendo pão fermentado, e o sebo do Meu sacrifício não deverá ficar até a manhã.” (Êxodo 23:18)
Não deixar as entranhas do sacrifício de Pessach até a manhã: Não deixar as entranhas do sacrifício de Pessach até a manhã sem que sejam queimadas, pois, se forem deixadas, tornam-se inválidas e são chamadas de notar (o que sobra); como está escrito em Êxodo 23:18. O mesmo vale para outras partes a serem queimadas nos demais sacrifícios. A Mekhilta DeRabbi Yishmael (23:18) ensina: “‘A gordura não será deixada’ — o versículo ensina que as gorduras se tornam inválidas ao serem deixadas.” Essa proibição é repetida em outro lugar (Êxodo 34:25): “E o sacrifício da festividade de Pessach não será deixado até a manhã.”
A razão desse mandamento é que a honra do sacrifício está em oferecê-lo no tempo certo. Atrasá-lo demonstra descaso e falta de zelo pelo serviço, tornando-o inválido.
Entre as leis desse mandamento, os sábios ensinaram (Pesachim 64b) que cada sacrifício tem suas entranhas queimadas separadamente. Além disso, (Menachot 72a) diz que a queima deve ocorrer logo após o abate, mas, se não for feita de imediato, pode ocorrer durante toda a noite até o amanhecer. Isso se aplica quando o dia 14 de Nissan cai no Shabat, pois as gorduras dos sacrifícios de Shabat podem ser queimadas em um Yom Tov (feriado). Porém, se o 14 de Nissan for um dia comum, não queimamos à noite, pois o feriado não anula a proibição de “não será deixado até a manhã.” Mais detalhes estão no tratado de Pesachim (Mishneh Torá, Leis do Sacrifício Pascal 1).
Esse mandamento se aplica no tempo do Templo e é cumprido pelos sacerdotes. Quem o transgredir e não queimar as partes sacrificadas não recebe chicotadas, pois a transgressão não envolve uma ação direta.
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91. O mandamento de trazer os primeiros frutos:
“O princípio das primícias de tua terra trarás à Casa do Eterno, teu Deus. Não cozinharás o cabrito no leite de sua mãe.” (Êxodo 23:19)
O mandamento de trazer os primeiros frutos: Devemos levar os primeiros frutos ao Templo e entregá-los ao sacerdote. Apenas os sete frutos pelos quais a Terra de Israel é elogiada estão incluídos nesse mandamento pela Torá: trigo, cevada, uva, figo, romã, oliva e tâmara, como está escrito em Êxodo 23:19. Os sábios aprenderam que essa obrigação se aplica somente a esses frutos, pois são os únicos mencionados na Torá em relação à Terra de Israel. Aqueles que moravam perto de Jerusalém os levavam frescos, enquanto os que vinham de longe os levavam secos.
A razão desse mandamento é que devemos colocar Deus, abençoado seja, “no auge da nossa alegria”, reconhecendo que toda bênção vem Dele. Por isso, fomos ordenados a trazer os primeiros frutos que amadurecem às pessoas que servem no Templo. Esse ato nos lembra e reforça nossa gratidão a Deus, tornando-nos merecedores de bênçãos e prosperidade.
Leis do mandamento: Os primeiros frutos tornam-se proibidos para um não-sacerdote assim que entram em Jerusalém, como o dízimo sacerdotal. Há frutos que devem ser levados por ordenança rabínica. Os primeiros frutos devem ser entregues aos sacerdotes de plantão, precisam ser levados em um recipiente apropriado, e, se for de madeira, pertence ao sacerdote. Não se deve misturar os frutos na apresentação, mas organizá-los de forma bela, colocando folhas de palmeira entre cada tipo e decorando o cesto. Eles levavam pombos ou rolas como honra aos primeiros frutos e os ofereciam aos sacerdotes. Havia uma celebração especial ao trazê-los, com pessoas saindo para recebê-los, leitura de salmos e muita alegria. Esses detalhes estão no tratado Bikkurim (ver Mishneh Torá, Leis dos Primeiros Frutos e Presentes aos Sacerdotes 4).
Esse mandamento era cumprido na época do Templo por homens, com frutos da Terra de Israel, da Síria e da Transjordânia, mas não com frutos de fora da Terra. Quem não o cumpre viola um mandamento positivo.
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92. Não cozinhar carne no leite:
“O princípio das primícias de tua terra trarás à Casa do Eterno, teu Deus. Não cozinharás o cabrito no leite de sua mãe.” (Êxodo 23:19)
Proibição de cozinhar carne no leite: Não devemos cozinhar carne de animal no leite de animal, como está escrito em Êxodo 23:19. Os sábios explicaram (Chulin 113a) que essa proibição não se aplica apenas a cabritos, mas a toda carne de animal, pois a palavra “cabrito” é usada para se referir genericamente à carne de animais. A Torá escolheu essa expressão porque a carne de um cabrito é macia, assim como outras carnes.
Razão do mandamento: Parece estar relacionada ao mesmo princípio da proibição da feitiçaria (Sefer HaChinukh 62), pois há misturas no mundo que nos foram proibidas por razões espirituais. Isso se confirma pelo fato de que a proibição ocorre já no ato de misturar, mesmo sem consumo. Além disso, fomos advertidos em outro mandamento a não comer e nem tirar proveito dessa mistura. O fato de alguém ser passível de açoites apenas por cozinhar, mesmo sem comer, mostra que a questão central é a mistura em si, não apenas seu consumo. Rambam (Guia dos Perplexos 3:48) mencionou que alguns idólatras usavam essa mistura em seus cultos, por isso a Torá nos afastou dela.
Leis do mandamento: Seus detalhes são explicados no mandamento sobre a proibição de comer e se beneficiar dessa mistura, em Ki Tissá (Sefer HaChinukh 113).
Esse mandamento se aplica em todos os lugares e tempos, tanto para homens quanto para mulheres. Quem o transgride e cozinha carne com leite recebe açoites, mesmo que não coma a mistura.
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93. Não fazer um pacto com as sete nações e qualquer idólatra:
“Nem com eles nem com seus deuses farás alianças.” (Êxodo 23:32)
Proibição de fazer pacto com as sete nações e outros idólatras: Não devemos firmar um pacto de amizade com as nações hereges mencionadas na Torá — os hititas, emoritas e outros povos que habitavam a Terra de Israel antes de nossa chegada — como está escrito em Êxodo 23:32. Isso significa que não devemos estabelecer um acordo de paz com eles deixando que continuem adorando ídolos.
Razão do mandamento: O objetivo é erradicar a idolatria e seus seguidores, pois essas sete nações eram o centro da idolatria e sua principal fundação. Por isso, foram expulsas da terra e nos foi ordenado destruí-las, como está escrito (Deuteronômio 7:2): “E os destruirás totalmente.” Essa é uma mitzvá positiva explicada em Vaetchanan. Nessa seção, será abordado o motivo da existência dessas nações e sua relação com esse mandamento. Além disso, essa proibição se estende a qualquer idólatra, mas há diferença entre as sete nações e outros povos idólatras (Guitin 45a). Outros idólatras não precisam ser mortos se não lutarem contra nós, mas sobre as sete nações, fomos ordenados a matá-las onde quer que estejam, a menos que abandonem a idolatria. Quem pode matá-los sem se colocar em perigo e não o faz, transgride esse mandamento.
No caso de idólatras de outras nações, só os combatemos se lutarem contra nós. Já um judeu que pratica idolatria — como apóstatas e hereges — deve ser eliminado, pois se opõe a Israel. Melhor destruir mil desses do que perder um judeu justo.
Leis do mandamento: Se eles se arrependem e abandonam a idolatria, aceitamos seu retorno. Outros detalhes estão explicados em Sanhedrin (ver Tur, Yoreh Deah 191).
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94. Não permitir que idólatras habitem em nossa Terra:
“Nem com eles nem com seus deuses farás alianças.” (Êxodo 23:32)
Proibição de permitir que idólatras habitem em nossa terra: Não devemos permitir que adoradores de ídolos residam na Terra de Israel, como está escrito em Êxodo 23:33.
Razão do mandamento: O próprio versículo explica: para que não aprendamos seus costumes idólatras.
Leis do mandamento: Se um idólatra abandonar sua idolatria, pode residir na terra como ger toshav (estrangeiro residente), conforme disseram os Sábios (Avodá Zará 64b): “Quem é um ger toshav? Aquele que aceitou não praticar idolatria.” Caso contrário, nem vender terras a ele é permitido, muito menos alugar uma casa para moradia, pois poderia trazer idolatria para dentro dela. Porém, é permitido alugá-la para fins comerciais, desde que não seja para três ou mais pessoas, pois isso criaria uma comunidade permanente, o que não é desejável. Há diferenças de regras entre aluguel de casas, campos e vinhedos, bem como entre Israel e a Síria, todas detalhadas em Sanhedrin e Avodá Zará (Tur, Yoreh Deah 191).
Aplicação: Esse mandamento se aplica a homens e mulheres na Terra de Israel. Quem o transgride vendendo ou alugando terras a idólatras em locais proibidos desobedece à ordem do Rei. No entanto, não recebe punição com açoites, pois pode realizar a venda ou aluguel sem um ato direto.
Terumah
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95. O mandamento de construir a Casa Eleita:
“E (com isso) Me farão um Santuário e morarei entre eles.” (Êxodo 25:8)
Mandamento de Construir o Templo: Devemos construir um santuário para Deus, onde traremos sacrifícios e realizaremos peregrinações, como está escrito (Êxodo 25:8): “E me farão um santuário.” Esse mandamento inclui também os utensílios necessários para o serviço, como a menorá, a mesa e o altar.
Propósito do Mandamento: O objetivo do Templo é elevar nossos corações ao serviço divino, não porque Deus precise de uma morada física. O espaço sagrado existe para nos purificar e nos aproximar da espiritualidade. O lugar escolhido é especial, talvez por estar no centro do mundo ou por razões que só Deus conhece.
Sentido dos Sacrifícios: O ato de sacrificar não é para Deus, mas para nós. A oferta de um animal representa a consciência de que, ao pecarmos, nos rebaixamos ao nível animal. O sacrifício desperta o arrependimento verdadeiro, pois exige esforço e reflexão, ao contrário de uma simples confissão verbal.
Detalhes da Construção: O Templo inclui o Santo, o Santo dos Santos e um átrio ao redor, além de utensílios sagrados. Uma vez construído, apenas ele pode ser usado para sacrifícios, proibindo altares em outros lugares (Salmos 132:14).
Aplicação: Esse mandamento se aplica quando a maioria de Israel estiver na terra. Ele é uma obrigação coletiva, não individual. Quando o Templo for reconstruído, essa mitzvá será cumprida novamente, rapidamente em nossos dias.
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96. Não remover os varais da Arca:
“E as varas ficarão nas argolas da arca; não se tirarão dela.” (Êxodo 25:8)
Proibição de Remover os Varais da Arca: Não se deve remover os varais da Arca da Aliança de seus anéis, como está escrito em Êxodo 25:15. Esse mandamento se aplica sempre que houver uma Arca, mesmo que hoje, devido ao exílio, não possamos cumpri-lo.
Propósito do Mandamento: O objetivo do Templo é elevar nossos corações ao serviço divino, não porque Deus precise de uma morada física. O Razão do Mandamento: A Arca contém a Torá, que é a essência e glória do povo de Israel. Por isso, devemos tratá-la com o máximo respeito e cuidado. Manter os varais sempre fixos garante que, se houver necessidade de transportá-la rapidamente, os varais estarão prontos e seguros, evitando quedas e desonra. Além disso, os utensílios do Templo possuem significados espirituais profundos, e sua forma deve ser preservada para transmitir essas mensagens.
Aplicação: Esse mandamento não se aplica atualmente, mas será retomado quando o Templo for reconstruído.
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97. O mandamento de arrumar o pão da proposição e o incenso:
“E porás sobre a mesa o pão da proposição diante de Mim, continuamente.” (Êxodo 25:30)
O mandamento de arranjar os pães da proposição e o incenso puro exige que os pães estejam sempre presentes no Templo perante Deus, conforme está escrito em Êxodo 25:30. A razão desse mandamento está ligada à importância do pão como sustento humano, pois ao dedicá-lo no Templo buscamos a bênção divina para nossa provisão. Assim como a oferta do Omer em Pessach atrai bênção para as colheitas e a libação de água em Sucot traz boas chuvas, a consagração desse pão fortalece nossa conexão com Deus e amplia a prosperidade. Os sábios ensinavam que os sacerdotes que o comiam se saciavam dobradamente, pois era abençoado.
Esse mandamento não implica que Deus necessite de alimento ou de aromas, pois Ele não é um ser físico. O incenso queimado junto ao pão não é uma "porção para Deus", mas apenas parte do ritual sagrado. O aroma, simbolicamente, representa o cumprimento da vontade divina, como indicado pela expressão “cheiro agradável ao Senhor”, que significa que Sua ordem foi realizada.
As leis do mandamento incluem a colocação dos pães sobre a mesa sagrada junto com dois recipientes de incenso, garantindo que sempre houvesse pão no Templo. A troca era feita todo Shabat, sem interrupção, mantendo o princípio de que os pães deveriam estar “sempre perante Deus”. Os pães retirados eram distribuídos entre os sacerdotes, tanto os que estavam saindo quanto os que estavam entrando no serviço, incluindo o sumo sacerdote. O formato e a disposição dos pães seguiam regras específicas para garantir que permanecessem arejados e em perfeitas condições.
Esse mandamento era cumprido exclusivamente pelos sacerdotes no Templo, sendo um dos rituais que reforçavam a santidade do serviço divino e a lembrança constante da dependência humana da providência de Deus.
Tetzavê
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98. O mandamento de acender as lâmpadas no Templo:
“Na tenda da reunião [Ohel Moêd], fora da divisória que está sobre o Testemunho, a conservará em ordem Aarão e seus filhos, desde a tarde até a manhã, diante do Eterno; estatuto perpétuo por todas as gerações dos filhos de Israel.” (Êxodo 27:21)
O mandamento de arranjar as luzes no Templo exige que se preparem lâmpadas acesas continuamente diante de Deus, como está escrito em Êxodo 27:21. Essa ordem tem como objetivo engrandecer o Templo, aumentando sua glória e imponência aos olhos de quem o vê. A iluminação contínua simboliza honra e respeito, promovendo temor e humildade nos corações dos que ali entram. Esse princípio segue a ideia de que a alma se refina por meio de boas ações e que há profundos ensinamentos ocultos nesses rituais, além do entendimento literal da ordem divina.
As leis desse mandamento incluem a exigência de que o acendimento das lâmpadas seja realizado diariamente, tanto pela manhã quanto à tarde, mesmo que isso coincida com o Shabat, pois a iluminação é considerada um serviço essencial do Templo. Cada lâmpada da Menorá recebia meio log de azeite, quantidade suficiente para mantê-la acesa durante a noite, inclusive nas longas noites do inverno. Caso sobrasse óleo, isso não invalidava o serviço. O processo de preparação envolvia limpar os recipientes, trocar os pavios e reabastecer o azeite. Quando uma lâmpada se apagava, era reacendida a partir do fogo do altar externo, enquanto as demais eram reacendidas inclinando-se um pavio até que pegasse fogo. Para manter a dignidade do ritual, evitava-se reacender as lâmpadas diretamente de outra chama.
Rambam entendia que a obrigação do mandamento incluía o ato de acender as lâmpadas, enquanto outros comentaristas, como Rashi, sustentavam que a preparação consistia na remoção de cinzas, limpeza e ajuste dos pavios, sendo um mandamento distinto da iluminação propriamente dita. Esse serviço era realizado exclusivamente pelos sacerdotes no Templo, e qualquer sacerdote que negligenciasse essa obrigação transgredia um mandamento positivo.
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99. O mandamento de vestir as vestes sacerdotais:
“E estes são os vestidos que farão: peitoral, efod, manto, túnica com cavidades, testeira e cinto; e farão vestidos de santidade para Aarão, teu irmão, e para seus filhos, para servir-Me.” (Êxodo 28:4)
O mandamento de usar as vestes sacerdotais exige que os sacerdotes vistam roupas específicas para honra e glória ao servirem no Templo, conforme está escrito em Êxodo 28:4. Esse mandamento se baseia no princípio de que as ações e intenções de uma pessoa moldam seu caráter. O sacerdote, como agente de expiação, deve estar totalmente focado no serviço divino, e suas vestes especiais o ajudam a lembrar constantemente diante de quem está servindo. Assim como os tefilin ajudam a manter pensamentos corretos, as roupas sacerdotais reforçam a solenidade e a importância do serviço.
Cada detalhe das vestes sacerdotais reflete essa ideia. O manto deve cobrir todo o corpo até os calcanhares, a manga chegar até a palma da mão, o turbante envolver completamente a cabeça para ser visível sempre que o sacerdote erguer os olhos, e o cinto ser longo o suficiente para ser sentido o tempo todo ao redor do corpo. Além do benefício espiritual para o sacerdote, o esplendor das vestes acrescenta dignidade ao Templo e inspira reverência nos espectadores, ajudando a trazer os pecadores ao arrependimento.
Os sacerdotes comuns usavam quatro peças: a túnica (ketonet), calças (mikhnasayim), turbante (migbaat) e cinto (avnet). A túnica era uma espécie de manto largo, as calças cobriam dos lombos até os joelhos, o turbante era um chapéu e o cinto era longo e enrolado várias vezes ao redor do corpo. Todas essas peças eram feitas de linho branco de seis fios, exceto o cinto, que era bordado com lã, tornando-o shaatnez (mistura proibida de tecidos), razão pela qual era proibido usá-lo fora do serviço.
O sumo sacerdote usava oito peças, incluindo as quatro do sacerdote comum, mas com diferenças: em vez do turbante, usava um mitra (mitsnefet), enrolada como um pano longo. Além dessas, vestia quatro peças adicionais conhecidas como vestes de ouro: o peitoral (choshen), o efod, o manto (me’il) e a lâmina frontal (tsits). Ele usava todas as oito peças para o serviço externo, mas para entrar no Santo dos Santos no Yom Kippur, usava apenas as vestes de linho. Essas vestes brancas, após o uso no Yom Kippur, não podiam ser reutilizadas.
Qualquer sacerdote que realizasse o serviço com menos vestes do que o exigido ou acrescentasse peças não autorizadas invalidava seu serviço e era passível de pena de morte pelos Céus, pois, como ensinado pelos sábios, “quando suas vestes estão sobre eles, seu sacerdócio está sobre eles; se suas vestes não estão sobre eles, seu sacerdócio não está sobre eles”. Isso os tornaria como um estranho (não sacerdote), sujeito à pena de morte.
Esse mandamento era cumprido no período do Templo pelos sacerdotes, e qualquer violação, como servir com vestes incompletas ou erradas, era considerada uma grave transgressão punida pela justiça divina.
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100. Que o peitoral não se mova de cima do avental:
“E juntarão o peitoral de suas argolas às argolas do efod com cordão de tecido de lã azulceleste, para que esteja sobre o cinto de adorno do efod, e não se desprenderá o peitoral de cima do efod.” (Êxodo 28:28)
O mandamento de não remover o peitoral de sobre o efod ordena que o peitoral permaneça fixo sobre o efod sem se deslocar. Isso está escrito em Êxodo 28:28. O peitoral era uma das oito vestimentas do sumo sacerdote, posicionado em frente ao seu coração. O efod ficava atrás, alinhado com o peitoral, e possuía alças feitas do próprio tecido, chamadas de faixa do efod, com as quais o sacerdote se cingia. Após vestir o efod e posicionar o peitoral, a faixa ficava abaixo deste. A Torá ordena que anéis fixos no peitoral sejam amarrados a anéis do efod com um cordão azul (tekhelet), garantindo que o peitoral ficasse fixo e digno. Caso contrário, ele poderia se deslocar e bater contra o peito do sacerdote.
A razão desse mandamento está na preocupação de Deus em manter a grandiosidade e a dignidade do serviço no Templo, garantindo que tudo esteja perfeito e bem posicionado, tanto os utensílios quanto as vestimentas dos sacerdotes. A beleza e a ordem são fundamentais, e por isso o peitoral não pode ficar solto ou se mover sobre o peito do sacerdote, mas sim permanecer fixo, como se estivesse cimentado.
As leis desse mandamento incluem o design do peitoral e do efod, a forma correta de vesti-los e outros detalhes explicados no tratado de Middot. Esse mandamento era observado na época do Templo e aplicava-se tanto a homens quanto a mulheres. Quem desconectasse o peitoral do efod era passível de punição.
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101. Não rasgar o manto sacerdotal:
“E será a abertura para a sua cabeça dobrada por dentro e terá uma orla em redor de sua abertura, obra de tecelão; como abertura de malha será debruada, para que não se rasgue.” (Êxodo 28:32)
O mandamento de não rasgar a abertura do manto do sumo sacerdote ordena que essa vestimenta permaneça intacta, conforme está escrito em Êxodo 28:32.
A razão desse mandamento é que rasgar algo simboliza desonra e destruição. Por isso, a Torá proíbe esse ato, para que quem o veste o faça com respeito, temor e cuidado, evitando qualquer dano à sua integridade. Isso reforça a dignidade e solenidade do serviço sacerdotal.
Esse mandamento era válido no tempo do Templo e se aplicava tanto a homens quanto a mulheres. Quem, de forma intencional, rasgasse ou até mesmo cortasse o manto com tesouras era passível de punição.
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102. O mandamento de comer a carne das ofertas pelo pecado e pela
culpa:
“E comerão das coisas com que for feita a expiação para consagrálos e santificálos, e o estranho não comerá delas pois é santidade.” (Êxodo 29:33)
O mandamento de comer a carne das ofertas pelo pecado e pela culpa ordena que os sacerdotes consumam a carne de certos sacrifícios, como o ofertado pelo pecado e o ofertado pela culpa, conforme está escrito em Êxodo 29:33. Os sábios explicaram que “os sacerdotes comem, e os donos obtêm expiação” (Pesachim 59b). Toda a carne desses sacrifícios deveria ser consumida pelos sacerdotes homens no pátio do Templo, exceto suas entranhas, sem que os ofertantes tivessem qualquer parte. Esse mandamento também inclui a porção que cabe aos sacerdotes dos sacrifícios de menor santidade, assim como o dízimo sacerdotal. No entanto, enquanto a comida das ofertas pelo pecado e pela culpa contribui diretamente para a expiação dos ofertantes, a comida dos sacrifícios de menor santidade e do dízimo sacerdotal não tem esse efeito.
A razão desse mandamento é que todos os atos dos sacrifícios visam direcionar os pensamentos e intenções para o bem, dominando os impulsos e fortalecendo o espírito intelectual para cumprir os mandamentos. Por isso, a Torá ordena que todo o serviço do Templo e dos sacrifícios seja realizado com grandeza e honra, para que a reverência e a humildade sejam despertadas tanto para quem está no Templo quanto para quem se lembra dele. Além disso, o respeito pelo sacrifício exige que ele seja consumido pelos próprios sacerdotes e não entregue a escravos, cães ou vendido. Também deve ser consumido num local sagrado e dentro do tempo estipulado, evitando que estrague e se torne repulsivo.
Esse mandamento era praticado no tempo do Templo pelos sacerdotes homens. Se um sacerdote deixasse de comer sua parte dentro do tempo determinado, violava um mandamento positivo e prejudicava a expiação do ofertante. Ramban, no entanto, não considera essa uma mitzvá separada, pois entende que a definição de quem come e para quem é destinada faz parte das regras gerais dos sacrifícios, sendo essencial para a expiação.
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103. O mandamento de queimar o incenso:
“E Aarão fará queimar sobre ele incenso de especiarias; pela manhã, quando limpar as lâmpadas, o queimará.” (Êxodo 30:7)
O mandamento de queimar o incenso ordena que os sacerdotes queimem incenso de especiarias duas vezes ao dia no altar de ouro, conforme está escrito em Êxodo 30:7. Todos os anos, é um dever preparar essa mistura para a queima diária. A fabricação e a queima do incenso são consideradas um único mandamento, pois o propósito da fabricação é a queima. Embora haja dois trechos distintos sobre a fabricação e a queima, os sábios concordam que se trata de um único mandamento. No entanto, há divergência entre Rambam e Ramban: o primeiro considera a queima da manhã e da tarde como um único preceito, enquanto o segundo os separa em dois.
Esse mandamento tem como objetivo engrandecer a glória do Templo e despertar reverência. Para isso, utiliza-se um aroma agradável, pois o olfato influencia o espírito e desperta alegria. O perfume do incenso era tão intenso que, segundo os sábios, seu cheiro se espalhava de Jericó até Jerusalém.
A composição do incenso incluía onze especiarias, quatro descritas na Torá e sete transmitidas por tradição. Ele podia ser preparado tanto pelo sumo sacerdote quanto por um sacerdote comum. Se não fosse queimado pela manhã, a quantidade total do dia — cem dinar — deveria ser queimada à tarde. A queima ocorria diariamente, metade de manhã e metade à tarde, após o sacrifício da tarde e antes da arrumação das lâmpadas do candelabro. O sacerdote responsável pegava um recipiente cheio de incenso, e todos deixavam o espaço entre o santuário e o altar, como ordenado: “E nenhum homem estará na Tenda da Reunião” (Levítico 16:17). Ele então despejava o incenso suavemente sobre as brasas e saía após uma reverência. Durante a moagem das especiarias, pronunciava-se “esmague bem, bem”, pois, segundo os sábios, o som beneficiava a mistura.
Esse mandamento era praticado no Templo pelos sacerdotes homens. Quem o cumpria conforme a lei realizava um preceito positivo.
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104. Não queimar incenso ou trazer sacrifícios sobre o altar de
ouro:
“Não oferecereis sobre ele incenso estranho, nem oferta de elevação nem oblação, e libação não derramareis sobre ele.” (Êxodo 30:9)
O mandamento proíbe oferecer sacrifícios no altar de ouro, exceto o incenso diário e a aspersão do sangue no Yom Kippur, conforme está escrito em Êxodo 30:9.
Já foi explicado anteriormente por que Deus ordenou a construção do Templo com utensílios sagrados, como a mesa e a menorá. Não há necessidade de buscar razões para cada detalhe específico, assim como não se questiona por que a menorá tem sete lâmpadas e não oito. Os mandamentos divinos são estabelecidos na perfeição e não devem ser alterados. Ainda assim, se alguém insistir em entender essa restrição, pode-se dizer, de forma simples, que Deus escolheu um formato fixo para o serviço, pois qualquer acréscimo ou redução corromperia sua perfeição. Além disso, os místicos possuem explicações profundas sobre cada detalhe.
Esse mandamento era praticado no Templo pelos sacerdotes. Quem o transgredisse, oferecendo algo inadequado sobre o altar, era passível de receber chicotadas.
Ki Tisa
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105. O mandamento da doação do meio shekel durante o ano:
“Isto dará cada um que passa para o número dos que são contados: metade de um siclo [shékel] segundo o siclo da santidade – 20 guerás o siclo – a metade do siclo, oferenda separada será para o Eterno.” (Êxodo 30:13)
O mandamento do meio shekel exige que todo israelita acima de 20 anos, seja rico ou pobre, entregue anualmente meio shekel de prata, equivalente a dez gerás, aos sacerdotes, conforme Êxodo 30:13. Esse valor era armazenado no Templo e usado para a compra dos sacrifícios diários e adicionais, além de outros elementos essenciais para o serviço religioso, como o sal para os sacrifícios, a madeira para o altar e o pão da proposição.
A razão desse mandamento é promover a igualdade entre todos os israelitas no serviço a Deus, garantindo que ricos e pobres tenham uma participação igualitária nos sacrifícios públicos, fortalecendo assim o pensamento coletivo em direção ao bem e à espiritualidade. Todos eram obrigados a contribuir, incluindo sacerdotes, levitas, israelitas, convertidos e escravos libertos, mas mulheres, escravos e menores estavam isentos, embora pudessem contribuir voluntariamente. Estrangeiros não eram aceitos, pois não tinham parte na herança de Israel.
No primeiro dia do mês de Adar, anunciava-se a obrigação do meio shekel, e até o mais pobre deveria dar sua parte, mesmo que precisasse vender sua roupa ou pedir emprestado. A quantia deveria ser entregue de uma vez e em moeda específica, sendo necessário um pequeno acréscimo, chamado kalbon, caso o pagamento fosse feito com moedas menores ou prata em peso. Esse acréscimo cobria os custos de conversão da moeda. Se dois indivíduos pagassem juntos um shekel inteiro, ainda assim precisavam adicionar um kalbon, pois a obrigação era individual.
Se alguém perdesse seu meio shekel no caminho, as leis estabeleciam como proceder. Todos esses detalhes são discutidos no Tratado Shekalim. Esse mandamento era obrigatório na época do Templo, tanto para aqueles que viviam em Israel quanto para os que estavam fora da terra. Sem o Templo, ninguém mais é obrigado a cumpri-lo, mas a tradição mantém sua memória ao se ler essa seção da Torá na sinagoga no Shabat anterior a Rosh Chodesh Adar. Quem não cumpria esse mandamento na época do Templo era considerado excluído da comunidade e do processo de expiação coletiva.
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106. O mandamento de santificar as mãos e os pés no momento do
serviço:
“E Aarão e seus filhos lavarão nele suas mãos e seus pés. Ao entrarem na tenda da reunião, lavarseão com água e não morrerão; ou ao se chegarem ao altar para servir, para oferecer a oferta queimada para o Eterno.” (Êxodo 30:19-20)
O mandamento de santificar as mãos e os pés exige que os sacerdotes lavem essas partes do corpo ao entrar no santuário ou ao realizar o serviço, conforme Êxodo 30:19-20. Esse ato simboliza a santidade do serviço no Templo e a importância da pureza ritual. O sacerdote lava as mãos, que tocam os objetos sagrados, e os pés, que caminham pelo santuário, para reforçar a dignidade do serviço.
Esse ato de purificação ocorre uma única vez pela manhã e se mantém válido para todo o dia e noite, desde que o sacerdote não durma, não urine ou não se distraia do serviço. Isso demonstra que a lavagem não visa apenas à higiene, mas à exaltação do Templo. Se o sacerdote sair do Templo, ele deve lavar-se novamente. Da mesma forma, se já tiver lavado as mãos e os pés no dia anterior, ainda precisará repetir a lavagem na manhã seguinte, pois a noite invalida a purificação.
A lavagem idealmente inclui rosto, mãos e pés e deve ser feita com a água da bacia sagrada. Se for usada água de outros recipientes sagrados, é válida apenas em caráter excepcional, mas não se aceita água de vasos não consagrados. A água deve ser derramada sobre as mãos, não mergulhada, para manter a dignidade do serviço. Isso difere da lavagem para alimentos não sagrados, que exige um recipiente, mas permite que as mãos sejam mergulhadas.
A bacia deve conter água suficiente para quatro pessoas, pois o verso menciona que Arão e seus filhos deviam lavar-se, e Pinchas também era incluído. Qualquer tipo de água pura pode ser usada, desde que não tenha passado a noite armazenada, pois isso a invalida para o serviço. A postura correta para a lavagem é em pé, colocando a mão direita sobre o pé direito e a esquerda sobre o pé esquerdo, pois todas as funções do Templo são realizadas de pé, conforme Deuteronômio 18:5.
Esse mandamento se aplica apenas aos sacerdotes e somente na época do Templo. Quem servir sem lavar mãos e pés, ou voltar ao Templo após se distrair sem repetir a lavagem, é passível de morte pelas mãos do Céu, e seu serviço é considerado inválido.
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107. O mandamento de ungir o sumo sacerdote e os reis da Casa de Davi
com óleo de unção:
“E farás disto óleo de unção sagrada, especiaria misturada, obra de perfumista; isto será óleo de unção de santidade.” (Êxodo 30:25)
O mandamento de ungir o sumo sacerdote e os reis da Casa de Davi com óleo sagrado exige que o óleo de unção seja preparado conforme a instrução da Torá em Êxodo 30:25, para que esteja pronto para ungir cada sumo sacerdote ao ser nomeado, como indicado em Levítico 21:10. Além disso, alguns reis eram ungidos, assim como os utensílios do Templo, embora estes não precisassem ser ungidos novamente no futuro, pois seriam santificados pelo serviço (Êxodo 30:31).
A raiz desse mandamento está no desejo divino de que, no dia da consagração ao serviço sagrado, seja realizado um ato simbólico de grandeza e honra. A unção com óleo simboliza elevação e distinção, como ocorre com reis e grandes ministros. Além disso, o óleo de unção deveria estar sempre disponível no Templo, refletindo a dignidade do local, como um palácio real onde tudo já está preparado para qualquer necessidade, sem atrasos.
As leis desse mandamento incluem a forma específica de preparo do óleo: quinhentos siclos de mirra, canela e cássia cada um — sendo que a canela era medida em duas porções para permitir acréscimos — e duzentos e cinquenta siclos de cálamo aromático. Todos esses ingredientes vinham das ilhas indianas. O óleo de oliva utilizado era um hin, equivalente a doze log, e após o cozimento, o volume final ainda permanecia em doze log, cujo valor numérico em hebraico (zeh - ז"ה) também representa doze.
Esse mandamento se aplicava na época do Templo e era uma obrigação comunitária, assim como a construção do Templo e seus utensílios.
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108. Não ungir um estrangeiro com óleo de unção:
“Sobre carne de homem não será untado, e da mesma composição não fareis outro como ele. Santidade é ele; santidade será para vós. Todo homem que fizer semelhante a ele e que usálo para fim estranho será exterminado de seu povo.” (Êxodo 30:32-33)
O mandamento proíbe ungir qualquer pessoa com o óleo sagrado feito por Moisés, exceto os sacerdotes, conforme Êxodo 30:32. Aquele que o fizer deliberadamente será punido com excisão, conforme Êxodo 30:33. Se a unção for acidental, a pessoa deve trazer um sacrifício fixo pelo pecado, sem distinção entre rico e pobre.
A raiz desse mandamento é engrandecer o Templo e tudo o que nele há. Assim, esse óleo precioso não deve ser usado por qualquer pessoa, mas apenas pelos escolhidos — sacerdotes e reis. Além disso, ao restringir seu uso, ele se tornaria mais valioso e desejado, pois as coisas são mais apreciadas quanto mais raras são.
As leis do mandamento incluem que a punição só ocorre se a pessoa usar pelo menos um kazayit do óleo (Keritot 6b); que apenas o óleo feito por Moisés tem essa proibição, e não qualquer outro óleo feito posteriormente (Keritot 5b); e que ocorreu um milagre com esse óleo, tornando-o suficiente para sempre. Além disso, nem todos os sacerdotes eram ungidos, apenas o sumo sacerdote e o sacerdote ungido para a guerra, assim como os reis da Casa de Davi — os outros reis eram ungidos com óleo de bálsamo. A unção dos reis diferia da dos sacerdotes, e um rei filho de rei só era ungido se houvesse disputa sobre sua sucessão, como aconteceu com Salomão (Keritot 5b).
Esse mandamento se aplica onde quer que o óleo esteja e em todos os tempos, tanto para homens quanto para mulheres. Quem transgredi-lo e aplicar um kazayit do óleo deliberadamente está sujeito à excisão; se for acidental, deve trazer um sacrifício pelo pecado.
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109. Não fabricar óleo de acordo com as especificações do óleo de unção:
“Sobre carne de homem não será untado, e da mesma composição não fareis outro como ele. Santidade é ele; santidade será para vós.” (Êxodo 30:32)
O mandamento proíbe fabricar o óleo da unção conforme sua fórmula original, como declarado em Êxodo 30:32.
A raiz desse mandamento está ligada ao que foi explicado sobre a proibição de ungir-se com ele (Sefer HaChinukh 108). Os sábios ensinaram (Keritot 5b) que nunca se fez outro óleo além do que Moisés preparou no deserto e que ocorreu um milagre, garantindo sua preservação para o futuro, mesmo após ter sido usado para ungir o Tabernáculo e seus utensílios. A proibição só se aplica a quem preparar o óleo com as medidas exatas dos ingredientes especificados na Torá, pois o termo “composição” refere-se à proporção precisa dos seus componentes.
Esse mandamento se aplica em qualquer lugar e tempo, tanto para homens quanto para mulheres. Quem o transgredir deliberadamente é punido com excisão; se for acidental, deve oferecer um sacrifício pelo pecado.
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110. Não fabricar incenso de acordo com as especificações do incenso:
“E o incenso que farás como a sua composição, não fareis para vós; sagrado o considerarás para o Eterno. O homem que fizer igual a este para o cheirar será banido do seu povo.” (Êxodo 30:37-38)
O mandamento proíbe fabricar incenso idêntico ao usado no Templo, ou seja, com as mesmas medidas e a intenção de usá-lo para si próprio, conforme Êxodo 30:37. E ainda, Êxodo 30:38 indica que a proibição se aplica a quem o fabrica com essa intenção.
A raiz desse mandamento é semelhante à proibição de ungir-se com o óleo sagrado (Sefer HaChinukh 108). Os sábios explicaram (Keritot 5a) que quem o fabrica para aprendizado ou para vender ao público está isento, mas quem faz até mesmo uma pequena quantidade, desde que respeite as proporções exatas, é punido. Também disseram (Keritot 6a) que o incenso era produzido anualmente no Templo e que omitir qualquer ingrediente tornava o responsável passível da pena de morte.
Essa proibição se aplica em qualquer lugar e tempo, tanto para homens quanto para mulheres. Quem transgredi-la intencionalmente, fabricando o incenso nas proporções corretas para uso próprio, recebe a pena de excisão; se for acidental, deve trazer um sacrifício pelo pecado. Já quem apenas cheira o incenso sem fabricá-lo não recebe essa pena, mas incorre na proibição de usufruir de algo sagrado.
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111. Não comer e beber uma oferenda para adoração idólatra:
“Guardate para não fazer aliança com o morador da terra [...] ele te chame e tu comerás do seu sacrifício.” (Êxodo 34:12-15)
O mandamento proíbe comer e beber qualquer oferta feita à idolatria, conforme Êxodo 34:12-15. A intenção é afastar completamente a idolatria e tudo o que esteja relacionado a ela.
As leis desse mandamento incluem a proibição de qualquer item oferecido à idolatria, mesmo água e sal, pois, apesar de serem produtos simples, sua consagração os torna proibidos. Para reforçar esse afastamento, os sábios proibiram todo vinho de gentios, mesmo que não tenha sido usado em libação, chamando-o de "stam yeinam". Há uma diferença entre vinho conhecido como libado, que é proibido pela Torá em qualquer quantidade e leva à punição de açoites, e o vinho de gentios em geral, cuja proibição é rabínica, permitindo punição menor e possibilidade de venda para recuperar prejuízos.
Além disso, foram estabelecidas regras rigorosas para evitar o contato com vinho libado. Por exemplo, se um gentio toca o vinho de um judeu, este se torna imediatamente proibido para consumo e benefício. Isso acontece porque, embora um gentio não possa proibir algo que não lhe pertence, qualquer ação física sobre o vinho pode gerar a proibição rabínica. O vinho só se torna proibido pela Torá quando um gentio realiza um ato significativo, como derramá-lo diante de um ídolo.
A idolatria tem um nível de severidade incomparável. Quando um item idolátrico se mistura com outro permitido, mesmo uma gota torna toda a mistura proibida, sem possibilidade de correção. Essa rigidez se estende a outros objetos relacionados à idolatria, como utensílios usados para oferendas. No entanto, para itens que não tiveram envolvimento direto com idolatria, há regras mais flexíveis.
Os sábios foram ainda mais rigorosos com vinho de libação, proibindo inclusive obter qualquer benefício dele, mesmo indireto. Discutiram até se o pagamento pelo serviço de destruir vinho idolátrico deveria ser proibido, pois envolveria desejar sua preservação temporária. A resposta foi que ele pode destruí-lo, e será abençoado por diminuir a idolatria.
Esse mandamento se aplica em todo tempo e lugar, tanto para homens quanto para mulheres. Quem o transgride e consome qualquer quantidade de vinho libado recebe açoites, pois a Torá enfatizou que nada da idolatria deve permanecer entre nós. Embora Rambam e Ramban concordem que há uma proibição formal, discordam sobre sua origem na Torá. Rambam vê a proibição de vinho libado em Deuteronômio 32:38, enquanto Ramban considera que todas as oferendas idólatras são proibidas com base em Êxodo 34:12-15.
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112. O mandamento de que a terra descanse no sétimo ano:
“Seis dias trabalharás e no sétimo dia descansarás; mesmo no tempo de arar e ceifar, descansarás.” (Êxodo 34:21)
O mandamento ordena que a terra descanse no sétimo ano, conforme Êxodo 34:21. A explicação ensina que se trata do ano sabático, no qual é proibido realizar qualquer trabalho na terra. Esse mandamento é reiterado em Levítico 25:5: “será um ano de completo descanso para a terra” e em Levítico 25:2: “a terra guardará um Shabat para o Senhor.” Já foi explicado detalhadamente anteriormente (Sefer HaChinukh 84), no contexto do mandamento “No sétimo ano, deixarás a terra descansar e ficar em repouso” (Êxodo 23:11), ainda que seu lugar mais apropriado seja aqui.
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113. Não comer carne com leite:
“O primeiro das primícias de tua terra trarás à casa do Eterno, teu Deus; não cozinharás cabrito com o leite de sua mãe.” (Êxodo 34:26)
O mandamento proíbe comer carne com leite que tenha sido cozido junto, conforme Êxodo 34:26. Esse versículo proíbe tanto o consumo quanto o benefício dessa mistura. O motivo pelo qual a Torá usa o termo "cozinhar" e não "comer" é porque essa proibição se aplica mesmo sem prazer na ingestão. Assim, se alguém engolir carne com leite quente e se queimar, ainda será punido. No entanto, a punição com chicotadas só ocorre se a carne e o leite forem cozidos juntos.
A Torá menciona essa proibição três vezes, ensinando a proibição de comer, cozinhar e obter benefício. Mesmo assim, apenas duas dessas proibições são contadas separadamente nos mandamentos negativos, pois comer e beneficiar-se são considerados uma só restrição. Além disso, a Torá não diz “não comerás” para reforçar que a punição ocorre mesmo sem prazer no consumo.
Por lei da Torá, a proibição de carne com leite se aplica apenas à carne de animais domésticos puros. Não inclui animais impuros, selvagens ou aves, sejam eles puros ou impuros. Por isso, essas carnes podem ser cozidas com leite e aproveitadas, mas os sábios proibiram seu consumo como precaução para evitar confusão com a proibição principal. No entanto, peixes e gafanhotos não foram incluídos nessa restrição, pois são muito diferentes da carne de animais.
Os sábios foram rigorosos quanto a essa proibição, estabelecendo que se leite e carne forem misturados e não houver sessenta vezes mais de um para anular o outro, toda a mistura é considerada proibida. Isso difere de outras leis alimentares, nas quais apenas a parte proibida é considerada. Além disso, as cinzas da carne cozida com leite são proibidas, assim como as cinzas de qualquer item proibido para benefício, e devem ser enterradas.
A Torá proíbe carne com leite apenas quando o leite é de um animal vivo. Se for de um animal morto, não há proibição, por isso o leite encontrado no estômago de um animal abatido é permitido. Um embrião cozido no leite é proibido, mas a placenta, pele, tendões, ossos, chifres e cascos não geram punição.
Esse mandamento é válido em todos os lugares e tempos, para homens e mulheres. Quem voluntariamente comer um pedaço cozido de carne com leite é chicoteado. Quem apenas obtiver benefício – como vender ou doar – não recebe chicotadas, pois o benefício pode ocorrer sem uma ação direta.
Vayakhel
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114. Que o tribunal não aplique uma sentença de morte no Shabat:
“Não acendereis fogo em todas as vossas habitações no dia do Shabat.” (Êxodo 35:3)
O mandamento proíbe que o tribunal execute sentenças de morte no Shabat, ou seja, que não matem naquele dia quem foi condenado à pena capital. Isso se baseia em Êxodo 35:3. Os sábios explicam (Yevamot 6b) que essa proibição inclui a execução por queima, e o mesmo vale para os outros tipos de pena de morte. O motivo para esse versículo específico é ensinar essa regra, pois a proibição de trabalho no Shabat já está escrita em outro lugar (“não farás trabalho algum” – Êxodo 20:10). Assim, os sábios interpretaram que o versículo foi colocado para indicar que a pena de morte não se aplica no Shabat. Como diz a Mekhilta DeRabbi Yishmael: “‘Não acendereis fogo’— a queima já estava incluída na proibição geral do trabalho, mas foi destacada para ensinar que, assim como a queima é uma das penas de morte e não pode ser aplicada no Shabat, o mesmo vale para todas as outras execuções.”
Além disso, o Talmud Yerushalmi (Sanhedrin 4:6) ensina que a expressão “em todas as vossas habitações” também indica que os tribunais não devem julgar no Shabat. O motivo desse mandamento é honrar esse dia e garantir que todos tenham descanso, até mesmo os criminosos. É como um rei que convida todos para um banquete e só julga depois da festa. Deus, ao ordenar a santificação e honra do Shabat, quis o bem do povo, e suspender as execuções faz parte desse respeito.
Esse mandamento se aplica na época do Templo aos homens, que eram os responsáveis pelos julgamentos. Eles devem garantir que nenhuma sentença de morte seja executada no Shabat. Se violarem essa proibição e ordenarem a execução, cometem uma transgressão, mas não recebem chicotadas, pois não há ação direta envolvida. No entanto, se realizarem a execução com as próprias mãos, são apedrejados se houver testemunhas e advertência prévia; se for feito por engano, precisam trazer uma oferta pelo pecado.
Levítico
Vayikra
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115. O mandamento do procedimento da oferta queimada:
“Se seu sacrifício for oferta de elevação [Olá] do gado, oferecerá um macho sem defeito; à entrada da tenda da reunião o oferecerá por sua vontade, diante do Eterno.” (Levítico 1:3)
O mandamento da oferta queimada exige que ela seja realizada conforme as regras descritas na Torá, como está escrito em Levítico 1:3. Já foi explicado anteriormente (Sefer HaChinukh 95) sobre a importância dos sacrifícios no Templo.
As leis dessa oferta incluem que o animal seja abatido no pátio do Templo, sendo permitido que qualquer pessoa realize o abate. No entanto, a partir da coleta do sangue, o serviço deve ser feito pelos sacerdotes. O sacerdote aspergia o sangue, esfolava o animal e cortava os membros inteiros, conforme a Torá (Levítico 1:6), que diz "em pedaços", e os sábios explicaram que não deve ser subdividido ainda mais. Durante esse processo, o nervo ciático era removido da coxa e todas as partes do animal eram queimadas no altar, incluindo a lã dos carneiros, os pelos da barba dos bodes, os ossos, tendões, chifres e cascos, desde que estivessem ainda presos ao corpo. Caso estivessem soltos, não eram queimados, pois a Torá afirma (Deuteronômio 12:26): "E farás os teus holocaustos, a carne e o sangue", indicando que apenas as partes ligadas ao corpo devem ser oferecidas.
O procedimento incluía a maneira como os animais eram cortados e lavados, e quantas pessoas transportavam os membros ao altar. Os sábios determinaram que um carneiro exigia seis pessoas, enquanto um boi necessitava de vinte e quatro, para os holocaustos comunitários, sendo menos para os individuais. Também há regras específicas para a oferta queimada de aves. Todos esses detalhes estão explicados no tratado de Zevachim.
Esse mandamento se aplica na época do Templo e deve ser realizado pelos sacerdotes. Se um sacerdote não seguir o procedimento correto, ele viola um mandamento positivo.
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116. O mandamento da oferta de farinha:
“E quando uma alma oferecer uma oblação [Minhá] ao Eterno, sua oferta será de flor de farinha de trigo. E deitará sobre ela azeite e porá sobre uma parte incenso.” (Levítico 2:1)
O mandamento da oferta de cereais (minchá) exige que seu procedimento seja seguido conforme descrito na Torá, como está escrito em Levítico 2:1 e também nas menções sobre ofertas assadas em grelha e frigideira. Essa oferta consiste em um sacrifício feito com farinha, em vez de animais.
Já foi explicado anteriormente (Sefer HaChinukh 95) que os sacrifícios de animais possuem um simbolismo forte, pois o fiel vê um ser vivo semelhante a ele sendo queimado, o que ajuda a refrear os impulsos pecaminosos. No caso da oferta de cereais, embora também represente a renúncia de bens materiais, sua força simbólica é menor, razão pela qual é chamada de "minchá" (presente), pois geralmente envolve um valor menor e pode ser feita voluntariamente.
As ofertas de cereais incluem três de caráter comunitário: o ômer de Pessach, os dois pães de Shavuot e os pães da proposição do Shabat. Além disso, há nove ofertas individuais: 1) a oferta do pecador, quando uma pessoa pobre não pode oferecer um animal; 2) a oferta da sotah, referente à mulher suspeita de adultério; 3) a oferta de inauguração dos sacerdotes ao iniciarem o serviço; 4) a oferta diária do sumo sacerdote, chamada de oferta assada na grelha; 5) a oferta de farinha fina, que pode ser voto ou doação voluntária; 6) a oferta de grelha; 7) a oferta de frigideira; 8) a oferta de forno em formato de pães; 9) a oferta de forno embebida em óleo. Algumas dessas ofertas são feitas com trigo, outras com cevada; algumas são consumidas pelos sacerdotes, enquanto outras são totalmente queimadas.
A única oferta que contém fermento (chamets) é a dos dois pães de Shavuot, mas, apesar de ser chamada de "minchá", não era colocada sobre o altar. A Torá especifica que, embora o fermento fosse geralmente proibido, essa era uma exceção (Levítico 2:12). No entanto, mesmo assim, não poderia ser oferecida sobre o altar.
O processo de oferta era o seguinte: a pessoa trazia farinha em um recipiente de metal e entregava ao sacerdote, que levava ao altar, retirava uma porção com as pontas dos dedos e queimava essa porção. O restante podia ser consumido pelos sacerdotes. As regras sobre quais partes eram queimadas ou consumidas, o papel do sacerdote e as variações desse procedimento estão explicadas no tratado de Menachot.
Esse mandamento se aplicava na época do Templo e devia ser realizado pelos sacerdotes. Se um sacerdote alterasse o procedimento descrito, violava um mandamento positivo.
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117. Não oferecer fermento ou mel:
“Nenhuma oblação que oferecerdes ao Eterno será preparada com fermento; porque não fareis queimar fermento algum, ou mel algum, como oferta queimada ao Eterno.” (Levítico 2:11)
O mandamento de não oferecer fermento (chamets) ou mel no altar proíbe colocar esses elementos sobre o fogo, conforme está escrito em Levítico 2:11. A proibição é repetida no início do versículo, enfatizando que nenhuma oferta de cereais deve ser feita com fermento. O termo “mel” inclui tanto o mel de abelhas quanto o mel de tâmaras e outros sucos doces de frutas. Essa proibição também se aplica ao incenso, como ensinam os fabricantes de incenso: “O mel é bom para o incenso, mas a Torá o proibiu.”
A razão desse mandamento é difícil de compreender, mas podemos sugerir que todos os sacrifícios servem para despertar pensamentos e reflexões no ofertante, ajudando-o a desenvolver características espirituais. O fermento, que cresce lentamente, simboliza preguiça e atraso, enquanto a ausência dele representa prontidão e agilidade para cumprir a vontade divina. Por isso, a Torá impôs essa restrição às ofertas individuais, pois os sacrifícios comunitários já contam com um reforço mútuo entre os participantes. Já o pão da proposição, mesmo sendo uma oferta comunitária, era constante a cada Shabat e, portanto, também deveria ser feito sem fermento.
Quanto à proibição do mel, pode-se ensinar que ela visa evitar que a pessoa se acostume a buscar apenas alimentos doces e prazerosos, como fazem os glutões e beberrões. Em vez disso, deve-se focar na alimentação necessária para a saúde e não no prazer sensorial. Alguns sábios consideram o tato, e por extensão o paladar, um sentido degradante, que não deve ser o foco da vida de uma pessoa sensata.
Outra explicação sugere que tanto o fermento, que faz a massa crescer, quanto o mel, que gera espuma, simbolizam arrogância e excesso. Assim, sua exclusão das ofertas ensina que “todo orgulhoso é uma abominação ao Senhor.” Ramban acrescenta que, como os sacrifícios são oferecidos a Deus, não devem conter elementos que alteram sua natureza original, como o fermento e o mel, pois o mundo foi criado pela combinação equilibrada de misericórdia e rigor.
As leis desse mandamento incluem que todas as ofertas de cereais devem ser feitas sem fermento. Mesmo as sobras das ofertas consumidas pelos sacerdotes não podem ser fermentadas, embora possam ser comidas com outros alimentos ou com mel. Se alguém assar a oferta com fermento, será punido com chicotadas para cada ato — seja amassando, cortando ou cozinhando com fermento. Os grãos das ofertas não podem ser umedecidos para evitar fermentação, mas eram amassados em água morna sob vigilância, confiando na diligência dos sacerdotes.
Fermento e mel são proibidos em qualquer quantidade no altar. Quem queima essas substâncias junto com um sacrifício ou para fins do sacrifício recebe punição, mas se as queima apenas como lenha, é isento. As discussões sobre a contagem dessa proibição variam: Rambam considera fermento e mel um único mandamento negativo, punindo apenas uma vez se ambos forem oferecidos juntos, mas separadamente cada um gera uma punição. Ramban, no entanto, argumenta que são dois mandamentos distintos, pois a Torá menciona explicitamente “não assarás com fermento,” indicando que são proibições separadas.
Esse mandamento era cumprido na época do Templo pelos sacerdotes, responsáveis pelo serviço.
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118. Não oferecer um sacrifício sem sal:
“E temperarás com sal toda tua oferta de oblação, e não deixarás faltar o sal da aliança de teu Deus em tua oblação; em todos os teus sacrifícios oferecerás sal.” (Levítico 2:13)
O mandamento de não oferecer um sacrifício sem sal proíbe os sacerdotes de apresentar qualquer sacrifício ou oferta de cereais sem adicionar sal, conforme está escrito em Levítico 2:13.
As leis desse mandamento incluem que a carne deve ser salgada adequadamente, como na preparação para assar, com sal de ambos os lados. No entanto, se for colocado apenas um pouco de sal, ainda é válido, mas não ideal. O sal utilizado nos sacrifícios pertencia à comunidade, assim como a lenha, para manter a dignidade do serviço no Templo, onde não deveria haver sinais de pobreza.
O sal era colocado em três locais: na câmara do sal, no topo da rampa e no alto do altar. Os membros dos sacrifícios eram salgados na câmara do sal, enquanto a porção retirada da oferta de cereais, o incenso e as ofertas queimadas eram salgados no topo do altar.
Esse mandamento era cumprido na época do Templo pelos sacerdotes, responsáveis por completar o ritual dos sacrifícios. Se um sacerdote transgredisse e oferecesse um sacrifício ou uma oferta sem sal, ele violaria tanto um mandamento positivo quanto este mandamento negativo e receberia chicotadas, pois realizou uma ação proibida ao oferecer carne sem sal.
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119. O mandamento de salgar o sacrifício:
“E temperarás com sal toda tua oferta de oblação, e não deixarás faltar o sal da aliança de teu Deus em tua oblação; em todos os teus sacrifícios oferecerás sal.” (Levítico 2:13)
O mandamento de salgar o sacrifício exige que todo sacrifício tenha sal, seja na carne do animal ou na farinha das ofertas de cereais, conforme está escrito em Levítico 2:13.
O propósito do sacrifício é corrigir e elevar a alma daquele que o oferece. Para despertar esse sentimento, o ofertante deve apresentar algo de valor e agrado, como já mencionado anteriormente. O sal faz parte desse processo, pois torna o sacrifício completo e mais aceitável, já que alimentos sem sal são desagradáveis tanto no sabor quanto no aroma. Além disso, o sal simboliza preservação, indicando que, assim como ele impede a deterioração, o sacrifício ajuda o ofertante a se afastar da corrupção e a preservar sua alma.
De acordo com a tradição (Menachot 20a), todos os sacrifícios devem ser salgados antes de serem colocados no altar. A única exceção são as libações, o sangue e a lenha. Caso um sacrifício seja oferecido sem sal, ainda é válido, exceto no caso da oferta de cereais, onde a ausência de sal a invalida, conforme está escrito explicitamente: “Não omitirás o sal da aliança do teu Deus da tua oferta.”
Esse mandamento era cumprido na época do Templo pelos sacerdotes. Quem deixasse de salgar uma oferta ou um sacrifício violava um mandamento positivo e também um mandamento negativo, pois está escrito: “Não omitirás o sal.”
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120. O mandamento do sacrifício do tribunal se errarem na instrução:
“E se a congregação de Israel pecar por engano, e for oculto o caso aos olhos da assembleia, e fizerem um dos preceitos do Eterno daqueles que não se devem fazer, e se tornarem culpados.” (Levítico 4:13)
O mandamento exige que o Grande Sinédrio ofereça um sacrifício caso erre em sua instrução sobre pecados graves que acarretam excisão e a comunidade ou seu líder aja conforme sua orientação equivocada, conforme está escrito em Levítico 4:13.
O sacrifício tem a finalidade de humilhar a alma impulsiva e fortalecer a alma intelectual. Quando os líderes cometem um erro, isso reflete uma fraqueza do intelecto, e o sacrifício serve para reforçar a importância da clareza e retidão no julgamento, ajudando-os a evitar futuros equívocos.
Os detalhes desse mandamento incluem situações em que o tribunal é responsável pelo sacrifício e não aqueles que seguiram sua decisão, bem como casos em que os indivíduos são responsáveis e o tribunal não. Para que o tribunal seja obrigado a trazer um sacrifício, algumas condições devem ser atendidas: os juízes devem ser setenta e um; o chefe da corte deve estar presente no momento da instrução; a maioria dos juízes deve errar na decisão; eles devem ter permitido explicitamente a transgressão; e a maioria da comunidade deve ter seguido a decisão equivocada, acreditando que era correta. Além disso, o erro não pode envolver a anulação total de um mandamento, mas sim uma modificação parcial, conforme está escrito: “e o assunto foi ocultado” – e não o mandamento inteiro. Além disso, o tribunal só é responsável se reconhecer seu erro por si mesmo, e não por ser informado por outros.
Quando o tribunal é responsável, as tribos de Israel trazem o sacrifício por eles. Se o erro foi sobre idolatria, trazem doze novilhos como holocausto e doze bodes como oferta pelo pecado. Se for sobre outros pecados que acarretam excisão, trazem doze novilhos. Se algum dos critérios não for atendido, cada indivíduo que seguiu a decisão errada deve trazer uma oferta pelo pecado.
As diferenças nos sacrifícios incluem o fato de que um indivíduo oferece uma ovelha ou cabra fêmea, um líder traz um bode macho, e um sumo sacerdote ungido ou o tribunal traz um novilho. Esse mandamento era praticado quando havia um Grande Sinédrio e o Templo estava de pé.
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121. O mandamento da oferta pelo pecado para um indivíduo que pecou inadvertidamente em um mandamento pelo qual somos passíveis de excisão:
“E se uma alma do povo da terra pecar por engano, por cometer um dos preceitos do Eterno que não se deve fazer, e se tornar culpado.” (Levítico 4:27)
O mandamento exige que qualquer pessoa que pecar inadvertidamente em transgressões graves, que normalmente acarretam a pena de excisão quando cometidas de forma intencional, ofereça um sacrifício pelo pecado, conforme está escrito em Levítico 4:27. Esse sacrifício é chamado de "oferta fixa pelo pecado", pois sempre envolve um animal e não varia de acordo com a condição financeira do ofertante.
A obrigação desse sacrifício aplica-se apenas a pecados passíveis de excisão quando cometidos intencionalmente, desde que envolvam um ato físico. No entanto, há três exceções: quem amaldiçoa Deus, quem desfaz a circuncisão e quem se abstém de oferecer o sacrifício de Pessach. Além disso, pecadores impuros que consomem alimentos sagrados ou entram no Templo devem trazer um sacrifício variável (pássaros ou farinha) em vez da oferta fixa.
Ao todo, são 43 transgressões na Torá que exigem essa oferta quando cometidas inadvertidamente, sendo a maioria relacionada a relações proibidas. A oferta só é exigida se a pessoa foi totalmente inadvertida do começo ao fim. As variações de consciência sobre o pecado são muitas e estão detalhadas nos tratados de Horayot, Keritot, Shabat e Zevachim.
Esse mandamento era cumprido na época do Templo por homens e mulheres. Quem transgredir e não oferecer o sacrifício devido por seu pecado inadvertido viola um mandamento positivo.
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122. O mandamento do testemunho:
“E quando alguma alma pecar: sob juramento, sendo testemunha de um fato por ter visto ou sabido – se não o denunciar, levará seu pecado.” (Levítico 5:1)
O mandamento exige que a testemunha apresente seu depoimento perante os juízes sempre que souber de algo relevante, seja para condenar ou inocentar alguém, tanto em casos financeiros quanto criminais. Como está escrito em Levítico 5:1.
Em casos monetários, a pessoa só é obrigada a testemunhar se for solicitada por uma das partes ou pelo tribunal. Já em casos criminais ou de proibições da Torá, como assassinato ou agressão, a testemunha deve se apresentar voluntariamente para evitar o mal e impedir transgressões.
O objetivo desse mandamento é garantir justiça e ordem na sociedade. No entanto, há exceções: um grande sábio pode se recusar a testemunhar diante de um tribunal inferior, pois o respeito à Torá se sobrepõe ao dever de testemunho. O sumo sacerdote só testemunha sobre um rei, e os reis de Israel não prestam testemunho nem podem ser testemunhados, exceto os reis da Casa de Davi.
A lei exige que o testemunho seja oral, mas, para facilitar transações financeiras, os rabinos permitiram documentos como prova. Há debate entre Rambam e Ramban sobre se esse princípio é de origem rabínica ou da Torá. Além disso, um testemunho dado perante o tribunal não pode ser revogado por alegações de erro ou esquecimento.
Documentos são validados por testemunhas que reconhecem assinaturas ou por outros meios aceitos pela lei rabínica. Mesmo parentes podem confirmar assinaturas, mas estão proibidos de testemunhar em julgamentos. Algumas pessoas, como ignorantes que não estudam nem trabalham, são desqualificadas para testemunhar, pois são consideradas propensas à desonestidade.
Esse mandamento se aplica em todos os tempos e lugares, mas apenas aos homens, pois as mulheres estão isentas devido à sua posição na sociedade conforme as tradições da Torá. Quem omite um testemunho essencial viola um mandamento positivo e pode causar injustiça. Se negar o testemunho sob juramento, deve trazer um sacrifício específico, conforme descrito no tratado Shevuot.
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123. O mandamento do sacrifício que varia para mais ou para menos:
“E quando alguma alma pecar [...] Como sacrifício [Ashám] ao Eterno, pelo pecado que cometeu [...]” (Levítico 5:1 e 5:6)
O mandamento do sacrifício variável exige que se ofereça um sacrifício proporcional à condição financeira da pessoa, dependendo da gravidade do pecado cometido. Esse sacrifício é exigido para certos pecados específicos, como impureza no Templo, ou seja, quando alguém impuro entra no Templo inadvertidamente; impureza de alimentos consagrados, quando uma pessoa impura consome esses alimentos sem intenção de pecar; um juramento de expressão, quando alguém jura falsamente sobre algo que fará ou deixará de fazer e depois quebra esse juramento de maneira involuntária; e um juramento de testemunho, que ocorre quando alguém jura não ter conhecimento de um testemunho relevante, mesmo sabendo que possui essa informação, seja de forma voluntária ou inadvertida. Nesses casos, a pessoa deve trazer uma oferta variável, conforme sua capacidade econômica, como indicado em Levítico 5:1 e 5:6, onde se estabelece que o culpado deve trazer uma oferta pelo pecado, independentemente de ter cometido o erro de maneira voluntária ou não.
A Torá menciona explicitamente os casos de impureza no Templo e consumo de alimentos consagrados em Levítico 5:2 e 5:6, porém não detalha diretamente a punição para essas situações. No entanto, a tradição rabínica ensina que tais transgressões exigem um sacrifício, pois há passagens que estabelecem a pena de excisão para quem comer alimentos consagrados ou entrar impuro no Templo, como Levítico 7:20 e Números 19:20. Seguindo o princípio de que todo pecado punível com excisão quando cometido deliberadamente exige um sacrifício quando cometido inadvertidamente, conclui-se que esses casos exigem uma oferta variável. O mesmo raciocínio se aplica ao juramento de expressão, conforme Levítico 5:4-6, onde se menciona a necessidade de trazer uma oferta pelo pecado. O fato de que essa oferta pode variar de acordo com a condição financeira da pessoa é indicado em Levítico 5:11, que permite que um pobre traga uma oferenda mais acessível, como farinha, caso não possa oferecer um animal.
O objetivo desse sacrifício é lembrar à pessoa do erro cometido e levá-la a refletir sobre suas ações. Através da prática do sacrifício, ela é incentivada a buscar o perdão e evitar repetir o erro no futuro. Deus, em Sua sabedoria, estabeleceu que a expiação para esses pecados ocorra conforme a capacidade econômica de cada um, pois essas transgressões são frequentes e fáceis de cometer. Os pecados relacionados à fala, como os juramentos, são mais comuns do que aqueles que envolvem ações concretas, pois a impulsividade humana frequentemente leva ao erro de palavras. Além disso, manter a pureza exigida pelo Templo e pelos alimentos consagrados era um grande desafio, pois exigia vigilância constante e extremo cuidado. Dado que essas transgressões eram comuns, a Torá permitiu que a expiação ocorresse independentemente de o erro ter sido cometido de forma voluntária ou não, especialmente no caso do juramento de testemunho. Isso porque as pessoas muitas vezes não percebem a gravidade de ocultar uma informação relevante, pois não veem nisso um roubo ou uma injustiça direta, mesmo que alguém sofra prejuízo por causa disso. Assim, pela frequência dessas falhas e pela tendência humana de minimizá-las, Deus permitiu que a expiação fosse mais acessível, adaptando o sacrifício à condição financeira do pecador.
No entanto, uma pessoa sábia sabe que deve evitar ao máximo qualquer transgressão, mesmo que haja um meio de expiação disponível. Deus nos ensina que algumas ações são proibidas em qualquer circunstância e que quem cometer um erro deve arrepender-se sinceramente, tomar precauções para não repetir o erro e trazer o sacrifício necessário para reforçar em seu coração o compromisso de seguir o caminho correto. Mesmo assim, a pessoa não se isenta de ter transgredido um mandamento divino.
Com relação à aplicação desse mandamento, cada um desses quatro pecados exige que a pessoa traga uma ovelha ou uma cabra como oferta pelo pecado, conforme o padrão estabelecido para o sacrifício fixo. No entanto, se for pobre, poderá trazer um par de rolas ou pombos, ou ainda uma oferenda de farinha, se não tiver condições de oferecer um animal. Caso um pobre traga um animal em vez de uma oferenda mais acessível, não terá cumprido sua obrigação corretamente, pois Deus, em Sua misericórdia, permitiu que ele oferecesse menos. Isso também serve como um ensinamento geral para que as pessoas não façam gastos além de suas possibilidades, pois o excesso de despesas pode levá-las a buscar meios ilícitos para sustentar um padrão de vida incompatível com sua realidade.
Se uma pessoa reservou dinheiro para comprar um animal para o sacrifício, mas ficou pobre antes de adquiri-lo, pode utilizar esse dinheiro para comprar pombos ou farinha e declarar que os fundos restantes perdem seu status consagrado. O mesmo se aplica se alguém reservar dinheiro para um sacrifício menor e depois enriquecer: deverá completar o valor e trazer um sacrifício adequado à sua nova condição financeira. A definição de riqueza e pobreza é relativa à condição da pessoa no momento do sacrifício.
Esse tipo de sacrifício só é exigido quando a transgressão foi involuntária, exceto no caso do juramento de testemunho, que exige sacrifício mesmo quando o erro foi cometido de forma consciente. Já em situações de coação, não há necessidade de sacrifício, pois a Torá isenta de culpa aqueles que pecam sob coerção. Existem diferentes regras para determinar quando uma pessoa é obrigada a trazer um sacrifício por múltiplos juramentos ou quando um único sacrifício basta para expiar várias transgressões. O mesmo ocorre com relação à impureza do Templo e dos alimentos consagrados, onde a obrigação do sacrifício depende de quando e como a pessoa teve consciência do seu erro.
Se a pessoa soube que estava impura antes e depois do ato, mas esqueceu disso no momento da transgressão, deve trazer um sacrifício. Mas se nunca soube que estava impura antes do ato e só descobriu depois, fica isenta, pois essa situação difere de outras transgressões que exigem sacrifício mesmo quando a pessoa só percebe o erro depois de cometê-lo. Isso fica claro em Levítico 5:2, onde a Torá destaca que a falta de conhecimento inicial é um fator que influencia a obrigatoriedade do sacrifício.
Os rabinos ensinam que, quando a pessoa sabia da impureza no início, mas não se lembrou no final, a expiação pode ser adiada até que ela tenha plena consciência do erro e traga seu sacrifício. Já aquele que nunca teve consciência do erro pode contar com a expiação dos bodes sacrificados nos feriados e em Rosh Chodesh, e, no caso de impureza deliberada no Templo ou com alimentos consagrados, o sumo sacerdote deve oferecer um sacrifício expiatório. Além disso, segundo os sábios, reis, sacerdotes e cidadãos comuns estão sujeitos às mesmas regras nesse tipo de sacrifício, sem distinção entre suas posições sociais, ao contrário de outros pecados que exigem diferentes tipos de expiação conforme a posição da pessoa. Os detalhes adicionais desse mandamento estão explicados nos tratados de Keritot e Shevuot.
Esse mandamento se aplicava na época do Templo tanto a homens quanto a mulheres, exceto no caso do sacrifício pelo juramento de testemunho, já que as mulheres não estavam incluídas na obrigação de testemunhar. Quem negligencia esse mandamento e não oferece o sacrifício exigido para expiar seu erro viola uma ordem positiva da Torá.
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124. Não separar a ave da oferta pelo pecado:
“E os trará ao sacerdote, que oferecerá primeiro o que é por sacrifício de pecado, e destroncará sua cabeça pela nuca, porém não o separará.” (Levítico 5:8)
O mandamento de não separar completamente a cabeça da ave oferecida como sacrifício pelo pecado exige que o sacerdote não decapite totalmente a ave ao realizar a melikah, como vemos em Levítico 5:8 o método especial de abate usado para esses sacrifícios. A melikah consiste em o sacerdote usar sua unha para cortar a nuca da ave, rompendo o osso do pescoço até alcançar os órgãos internos e cortar a maioria da traqueia ou do esôfago. Esse processo substitui o abate convencional e é exclusivo para o sacrifício de aves, sendo essencial que a cabeça permaneça ligada ao corpo.
Como mencionado no mandamento sobre a construção do Templo (Sefer HaChinukh 95), não somos capazes de compreender completamente o significado detalhado dos sacrifícios. No entanto, podemos encontrar algumas explicações simbólicas que ajudam a entender o propósito desse procedimento. A melikah, realizada diretamente com as mãos do sacerdote em um sacrifício que geralmente pertence a pessoas pobres, pode simbolizar a necessidade de agir rapidamente em favor dos necessitados. A ausência de um abate tradicional com faca evita qualquer demora na preparação do sacrifício, garantindo que o pobre não fique esperando enquanto a lâmina é procurada e inspecionada. Além disso, o fato de a melikah ser feita na nuca, a parte mais acessível da ave, reforça a ideia de eficiência e agilidade.
Outro aspecto simbólico é que as aves usadas no sacrifício, pombas e rolas, são frequentemente comparadas ao povo de Israel. O corte pela nuca pode ser um lembrete para que o povo não seja teimoso e resistente às correções espirituais. A proibição de separar completamente a cabeça do corpo está ligada à dignidade do sacrifício. Quando a cabeça permanece ligada ao corpo, o sacrifício é mais respeitável e honroso. Como esse é o sacrifício de um pobre, deve ser tratado com o máximo de dignidade, pois sua condição já é difícil, e seu sacrifício não deve ser diminuído em valor ou importância. Isso está alinhado com a ideia central dos sacrifícios: refinar o caráter humano e aprimorar suas ações por meio da experiência e da prática ritual.
Entre as regras desse mandamento, os sábios ensinaram que o sacerdote deve segurar a ave de uma forma específica durante a melikah: segurando suas pernas entre dois dedos e as asas entre outros dois dedos, esticando o pescoço sobre a largura de dois dedos antes de realizar o corte. Essa técnica exige grande habilidade, sendo considerada uma das tarefas mais difíceis no Templo. No entanto, caso o sacerdote segure a ave de maneira diferente, o sacrifício ainda será válido. A melikah pode ser realizada em qualquer lugar do altar, reforçando a ideia de que esse sacrifício deve ser feito sem demora, sem a necessidade de um local específico.
Esse mandamento era praticado na época do Templo pelos sacerdotes, e qualquer pessoa que separasse completamente a cabeça de uma ave oferecida como sacrifício pelo pecado estaria sujeita a punição por descumprir a proibição.
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125. Não colocar azeite na oferta de farinha do pecador:
“E se suas posses não lhe permitirem trazer duas rolas ou dois filhotes de pombo, trará a décima parte de uma efá de flor de farinha de trigo, por oferta de pecado, como sacrifício por aquilo que pecou. Não porá sobre ela azeite nem porá sobre ela incenso, pois ela é oferta de expiação.” (Levítico 5:11)
O mandamento de não colocar azeite na oferta de farinha do pecador pobre exige que o sacerdote não acrescente óleo a esse tipo específico de oferenda, conforme está escrito em Levítico 5:11. Embora o óleo fosse comum em outras ofertas de cereais, essa proibição se aplica exclusivamente à oferta de um pecador pobre. Isso ocorre porque um pecador rico nunca traz uma oferta de farinha, mas sim um sacrifício animal, conforme estabelecido na Torá.
A razão desse mandamento está no simbolismo do azeite, que representa grandeza e importância. O azeite, quando misturado a outros líquidos, sempre flutua acima deles, demonstrando sua preeminência. Além disso, seu valor era amplamente reconhecido, sendo utilizado na unção de reis e sacerdotes. Como a oferta do pecador deve transmitir humildade e arrependimento, não seria apropriado incluir um ingrediente que sugere nobreza e distinção. Outra explicação possível é que essa restrição reflete a compaixão divina pelo pobre, evitando que ele tenha que se esforçar além do necessário para obter óleo, um produto valioso. Por esse mesmo motivo, sua oferta é limitada a uma pequena quantidade de farinha, um item acessível até mesmo ao mais necessitado.
As leis desse mandamento incluem a exigência de que a oferta do pecador seja exatamente um issaron de farinha, nem mais nem menos. Normalmente, as ofertas de cereais exigem azeite e incenso: um log de azeite para cada issaron de farinha e um punhado de incenso, independentemente da quantidade de farinha utilizada, desde que não ultrapasse sessenta issaron. No entanto, a oferta do pecador e a oferta de ciúmes (trazida no caso de uma mulher suspeita de adultério) são exceções, pois nelas não se coloca nem azeite nem incenso, como indicado no mesmo versículo.
Esse mandamento era cumprido na época do Templo pelos sacerdotes, pois a execução dos sacrifícios era de sua responsabilidade. Se um sacerdote desobedecesse e colocasse azeite nessa oferta, estaria sujeito à punição com chicotadas, conforme a penalidade prevista para quem violasse esse preceito.
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